O globo, n. 31978, 24/02/2021. País, p. 10

 

Câmara quer impedir Justiça de afastar parlamentares do mandato

Natália Portinari

Bruno Góes

Paulo Cappelli

24/02/2021

 

 

Medida é uma das propostas do grupo que estuda alterações nos artigos da Constituição que tratam da imunidade de deputados e senadores e de atos durante investigação contra eles

A Câmara dos Deputados estuda alterações na Constituição Federal para impôr uma série de limites sobre a prisão de parlamentares. Um grupo de trabalho constituído nesta semana pelo presidente Arthur Lira (PP-AL) já tem pronta uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) sobre o tema. O texto prevê, entre outros pontos, que ficaria vedado o afastamento temporário de membros do Congresso, somente podendo ser decretada a perda do mandato nos termos do artigo 55 da Constituição. Algumas hipóteses para isso ocorrer envolvem questões eleitorais, criminais ou quebra de decoro.

O afastamento da deputada Flordelis (PSD-RJ) da Câmara, determinado pela Justiça do Rio ontem, não poderia mais ocorrer pelas novas regras em estudo. As modificações são feitas na esteira das discussões sobre a prisão do deputado bolsonarista Daniel Silveira (PSL-RJ), detido por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF) na semana passada. A previsão é que a votação da PEC já seja iniciada hoje, em primeiro turno, na Câmara.

Outra medida proposta é determinar que a busca e apreensão contra parlamentares no Congresso ou nas suas residências sempre deverá ser referendada, após sua realização, pelo plenário do STF. Caso contrário, as provas obtidas podem ser invalidadas. A análise das provas obtidas em busca e apreensão que não seja validada pelo Supremo configurará crime de abuso de autoridade, segundo a proposta. A PEC estabelece ainda que a Polícia Legislativa supervisionaria as buscas e apreensões nas dependências do Congresso.

A proposta define também que o parlamentar preso seja “encaminhado à Casa respectiva logo após a lavratura do auto”. Ou seja, o Senado ou a Câmara devem manter custódia sobre um senador ou deputado preso nas hipóteses previstas por lei: em flagrante e por crime inafiançável. Uma das possibilidades é deixá-lo em prisão domiciliar, por exemplo. Isso vale para o prazo de vinte e quatro horas antes de a prisão ser analisada por uma audiência de custódia.

— O fato de ser custodiado pela Câmara não quer dizer que o parlamentar ficará preso na Câmara. Quer dizer que a responsabilidade sobre ele é da Câmara, que escolherá o local que julgar adequado à situação. Se será prisão domiciliar, se será em alguma superintendência da Polícia Federal, se será em algum presídio — diz o deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), integrante do grupo de trabalho.

O projeto também dá aos deputados estaduais as mesmas prerrogativas dos deputados federais e senadores. Assim, só poderão ser presos por crime em flagrante e inafiançável.

As modificações previstas estão no artigo 53 da Constituição Federal, que trata de imunidade parlamentar sobre “opiniões, palavras e votos”. Outra mudança prevista é a especificação de que, no caso de quebra de decoro, cabe “exclusivamente a responsabilização ético-disciplinar”. Assim, descartase a possibilidade de ação penal.