O globo, n. 31974, 20/02/2021. Editorial, p. 2

 

O fim da autonomia da Petrobras

20/02/2021

 

 

Por não entender a regra tão candidamente expressa pelo general-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello — “um manda, o outro obedece” —, o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, foi demitido ontem pelo presidente Jair Bolsonaro, irritado com mais um aumento de preço nos combustíveis. Foi substituído pelo general da reserva Joaquim Silva e Luna. Bolsonaro cumpriu a ameaça feita na véspera, de que “algo” aconteceria na Petrobras depois dos reajustes.

De uma só vez, acabou com qualquer confiança que ainda pudesse existir no modo como o governo conduz a empresa. Mandou às favas o compromisso com uma linha liberal de política econômica. Não era mesmo confiável o discurso de que não interferiria na empresa para defender sua base eleitoral de caminhoneiros. Bolsonaro já anunciara que todos os impostos federais (PIS-Cofins e Cide) serão retirados do diesel por dois meses e do gás de cozinha sem prazo definido.

Só faltou, naturalmente, indicar a fonte de compensação para a perda de receitas, como determina a Lei de Responsabilidade Fiscal. A questão deverá ser acompanhada de perto pelo Tribunal de Contas da União e pelo Congresso.

Na prática, Bolsonaro repete exatamente o que fez a presidente Dilma Rousseff, do PT, quando interveio de forma demagógica no preço dos combustíveis e tecnicamente quebrou a Petrobras. Bolsonaro transfere o ônus aos contribuintes, enquanto Dilma esvaziou o caixa da empresa, que se viu forçada a acumular um volumoso endividamento. Bolsonaro age de forma atabalhoada para atender a interesses políticos pessoais. Dilma acreditava num projeto econômico nacional-desenvolvimentista. Os motivos podem ser distintos, mas ambos se equivalem nas políticas desastrosas.

Os reajustes aplicados pela Petrobras — 15,1% no diesel (27,7% no acumulado do ano) e 10,2% na gasolina (34,7% desde janeiro) — têm dois motivos evidentes. O primeiro é o aumento no preço do petróleo no exterior, referência para toda empresa do setor. O segundo motivo é a desvalorização do real, uma das moedas que mais perdem valor no mundo. Trata-se de reflexo evidente da degradação da imagem do país no exterior, devido à falta de capacidade do governo Bolsonaro em dar a velocidade necessária às reformas e em transmitir confiança.

Depois do aumento anterior, o Planalto decidiu enviar ao Congresso um projeto de Lei Complementar que altera a incidência do ICMS, principal imposto estadual sobre os combustíveis. Seria um tema adequado para tratar na reforma tributária. Virou instrumento da intervenção demagógica na estatal.

Os danos da interferência de Bolsonaro na Petrobras vão muito além do caso específico dos combustíveis. As repercussões negativas da queda de uma gestão profissional, guiada pelo mercado, serão intensas e causarão mais estragos. O Brasil vai se tornando a passos largos um pária mundial também na economia. Atos como a ingerência do Executivo na política de preços de uma estatal causam fuga de investidores e desestimulam a vinda de outros. 

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Bolsonaro intervém na Petrobras e indica general para presidente

20/02/2021

 

 

Insatisfação com política de preços de combustíveis derruba Castello Branco

Após passar o dia sustentando que não mudaria a política de preços de combustíveis, o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, teve sua destituição anunciada pelo presidente Jair Bolsonaro, que indicou o general Joaquim Silva e Luna para o cargo. Diretor-geral de Itaipu, ele será o primeiro militar no comando da  petrolífera desde o fim dos anos 8 0. A diretoria avalia a decisão de entregar cargos. O ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, negou que se trate de interferência política, já que o mandato de Castello Branco terminaria em 20 de março. A Petrobras perdeu ontem R$ 28 bilhões em valor de mercado.