Correio Braziliense, n. 21107, 09/03/2021. Brasil, p. 5

 

Internações em UTI têm novo perfil

09/03/2021

 

 

Com o descontrole dos casos de covid-19, o Brasil vive uma mudança no perfil de internações: mais jovens (abaixo dos 60 anos) com a infecção estão sendo vistos nos leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTIs). Não há, ainda, uma questão única e certa para justificar essa alteração, mas alguns motivos apontados são a circulação de novas variantes, o aumento de casos e a maior exposição dos mais novos ao vírus.

Para o diretor científico da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, José Davi Urbaez, o vírus está diretamente ligado ao movimento das pessoas. "E a população que mais se movimenta é a mais jovem, que é também a economicamente ativa. Então, somando a uma taxa de transmissibilidade mais alta, você ampliou muito a base dos infectados", afirmou.

Ele observou que o Brasil, além de não ter implementado um verdadeiro 'lockdown', não tem uma vacinação capaz de controlar a pandemia. "Estamos usando as poucas vacinas que temos para proteger os mais velhos, os trabalhadores da saúde. Mas não é uma vacinação para controlar a pandemia", observou.

Junção de fatores
O coordenador do pronto-atendimento e da cardiologia do Hospital Sírio-Libanês em Brasília, Carlos Rassi, que atende pacientes com covid-19 em leitos de enfermaria e UTI, avalia que houve, realmente, um aumento de jovens entre pacientes nas unidades intensivas. "Realmente, é um pouco maior de pacientes jovens do que foi na primeira onda", disse, acrescentando que o fato de os idosos estarem sendo vacinados, a explosão do número de casos e a circulação das novas variantes estariam mudando o perfil do internado.

Médica intensivista do Hospital Santa Marta, em Brasília, Adele Vasconcelos afirma que há uma alta presença de pacientes mais jovens nos últimos 15 dias nas UTIs, demandando o envolvimento de toda a equipe. "Não chegamos a ver isso na primeira onda", diz. Além das variantes, para ela, as festas de fim de ano e o carnaval, além do fato de as pessoas terem voltado a trabalhar presencialmente, estariam por trás da mudança da faixa etária nas UTIs.

"Significa que precisamos insistir na prevenção da doença e explicar para as pessoas que o jovem também pega a doença, também fica grave. Não é uma doença que escolhe quem vai ficar grave, que atinge só os velhos. Qualquer pessoa pode ter. Tem que se educar", observou.

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Infectados ficam mais tempo 

09/03/2021

 

 

Além de um aumento no número de pacientes mais jovens (abaixo dos 60 anos) com covid-19 nas Unidades de Terapia Intensiva, autoridades e especialistas apontam um aumento no tempo de internação –– o que ajuda a explicar, também, a alta taxa de ocupação de UTIs que temos visto em vários estados brasileiros. Na última quarta-feira, o ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde e atual coordenador-executivo do Centro de Contingência da covid-19 em São Paulo, João Gabbardo, sugeriu que o aumento da taxa de ocupação se dá justamente pela maior quantidade de pessoas de uma faixa etária mais baixa.

"Essas pessoas conseguem resistir mais ao enfrentamento do vírus e, por consequência, ficam mais tempo internadas. Os leitos não estão rodando na mesma velocidade, e isso está ocasionando em um acúmulo de pacientes", afirmou.

O diretor científico da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, José Davi Urbaez, afirma que a pessoa com menos de 60 anos têm mais "reserva fisiológica" para combater o vírus. Assim, o organismo consegue contornar os ataques sofridos pelo agente infeccioso, chegando a um esgotamento completo mais tardiamente –– diferentemente dos idosos, que não têm mais essa reserva.

Urbaez ressalta que se tem visto nas UTIs um aumento de cerca de cinco dias no tempo de uma internação. Segundo o médico, essa observação é inicial e pode estar relacionada ao fato de haver poucos leitos disponíveis e à demora para conseguir uma vaga. Com isso, desenvolve um quadro mais grave antes de entrar na unidade e, por isso, permanece mais tempo.

O secretário de Saúde do estado de São Paulo, Jean Gorinchteyn, disse que a pandemia retornou com "uma velocidade e uma característica clínica diferente" da primeira onda. Ele destaca que são pacientes mais jovens, muitos sem qualquer comorbidade, que chegam às unidades com uma gravidade nas condições clínicas. Conforme ressaltou, se antes 40% desses pacientes ocupavam as UTIs, e 60% estavam nas enfermarias, esse cenário se inverteu.

O tempo de permanência nas unidades também preocupa, visto que, conforme Gorinchteyn, essas pessoas mais novas passam mais tempo internadas. "Tínhamos antes média de sete a 10 dias de internação. Agora, está em 14 a 17 dias de internação, no mínimo", explicou.