Correio Braziliense, n. 21090, 20/02/2021. Política, p. 2

 

Deputados mantêm Silveira atrás das grades

Jorge Vasconcellos 

20/02/2021

 

 

O plenário da Câmara decidiu manter a prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), ordenada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). O parlamentar foi detido em flagrante pela Polícia Federal, por crime inafiançável, na terça-feira, após publicar um vídeo em que ataca a Corte, incita o linchamento do ministro Edson Fachin e prega a volta do AI-5, o ato mais repressivo da ditadura militar (1964-1985). A decisão do plenário, ontem, foi tomada com 364 votos a favor da manutenção da prisão, 130 pela soltura e três abstenções.

Na sessão, os deputados posicionaram-se por meio do voto aberto. Apenas os líderes de PSL, PTB, PSC e Novo orientaram as respectivas bancadas a votarem contra a prisão de Silveira.
O resultado da votação, muito acima do previsto, é o desfecho de uma maratona de reuniões e contatos do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), com a Mesa Diretora da Casa, líderes de partidos e ministros do STF. A cúpula do Congresso temia que uma eventual derrubada da ordem de prisão pudesse causar desgaste com o tribunal, que é responsável por processar e julgar parlamentares. Essa preocupação aumentou depois que todos os 11 magistrados do Supremo decidiram manter Daniel Silveira na cadeia.

A votação de ontem foi realizada de acordo com a Constituição, que dá à Câmara a atribuição de analisar a detenção de um deputado. São necessários pelo menos 257 votos — mais da metade dos 513 parlamentares — para manter ou rejeitar a prisão.

A relatoria do caso de Silveira ficou a cargo da deputada Magda Mofatto (PL-GO). Ela apresentou parecer favorável à manutenção da detenção, deixando claro, porém, que o caso em questão era "excepcionalíssimo". Ao criticar o comportamento de Silveira, a parlamentar escreveu que "temos entre nós um deputado que vive a atacar a democracia e as instituições, que transformou o exercício do seu mandato em uma plataforma para a propagação do discurso do ódio, de ataques a minorias e defesas dos golpes de Estado e de incitação à violência contra autoridades públicas".
Mofatto acrescentou que "não há regime democrático, na Europa ou na América Latina, que, a partir do direito à liberdade de expressão, ou de qualquer outro direito fundamental, tolere a defesa de ditaduras, a discriminação de minorias e a apologia explícita à ruptura da ordem constitucional".
A deputada também considerou que o parlamentar do PSL violou o artigo 18 da Lei de Segurança Nacional, que "estabelece como crime a tentativa de impedir, com emprego de violência ou grave, ameaça o livre exercício de qualquer dos Poderes da União e dos estados".

Ela afirmou que as declarações de Silveira sinalizam uma ameaça real aos ministros do STF. "No caso concreto, as circunstâncias, o contexto e o cometimento reiterado de condutas semelhantes pelo parlamentar, amplamente conhecidas e divulgadas pela imprensa do país, e por ele próprio, mostram que as ameaças aos integrantes do tribunal constitucional eram sérias e críveis, revelando a periculosidade do colega e justificando a sua prisão para impedir a continuidade da prática delitiva", emendou.

"Risco concreto"
De acordo com Mofatto, "ao contrário do que quis fazer transparecer, o parlamentar, em seu vídeo, não fazia meras conjecturas, mas dava a entender que existia um risco concreto aos integrantes do Supremo Tribunal Federal, risco que era constantemente reforçado mediante os xingamentos, impropérios e ameaças de cassação por meio de processos ilícitos". Ela considerou que estão "atendidos os requisitos constitucionais para a decretação da medida cautelar".

Além disso, Mofatto pediu que o Supremo reexaminasse a necessidade de manutenção da prisão e analisasse a possibilidade de adoção de medidas cautelares alternativas ao encarceramento do parlamentar, uma vez que a Procuradoria-Geral da República (PGR) já apresentou denúncia no caso. Ela também recomendou que o Congresso se debruce sobre a regulamentação dos pontos da Constituição que tratam do flagrante delito, incluindo condutas praticadas na internet, e do alcance das decisões cautelares monocráticas que determinam a prisão de parlamentares.

Na sessão, houve espaço para manifestação de Silveira e de seu advogado, Maurício Spinelli. Ambos questionaram a legalidade da prisão e defenderam a imunidade parlamentar.

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Depois da valentia, o pedido de desculpas 

20/02/2021

 

 

Preso desde de terça-feira, por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do STF, o deputado Daniel Silveira (PSL-RJ) baixou o tom em relação à Corte. Ele participou da sessão na Câmara por videoconferência e pediu desculpas pelos ataques ao tribunal. Disse que não é criminoso e se esforçou para atrelar a detenção à violação da liberdade de expressão e da imunidade parlamentar.

Silveira disse que assistiu ao vídeo três vezes e que falou em um momento de emoção. "O ser humano vai de zero a 100 muito rapidamente. Gostaria de ressaltar que, em momento algum — já vi o vídeo várias vezes —, não consegui ver o momento da raiva em que me encontrava. E peço desculpas a todo o Brasil. Ouvi de várias pessoas, juristas, senhoras, senhores, ou qualquer tipo de classe social que percebeu que me excedi na fala. Um momento passional", argumentou. "Não cabe explicar que a lei nos emprega seis meses para que possamos oferecer qualquer tipo de registro contra a ocorrência, porque, em um dia ou dois, nós mudamos a mente."

Silveira começou a fala com um texto do próprio Alexandre de Moraes, falando na harmonia entre os Poderes e na importância da inviolabilidade da liberdade de expressão e da imunidade dos legisladores. Por diversas vezes, destacou que, se fosse em outro momento, teria usado palavras menos pesadas. "Reconheço que minhas falas foram duras. As consequências, a partir de hoje, não vão se limitar à minha vida. Serão sentidas pela população brasileira", afirmou.

O parlamentar teve dificuldades de justificar que não fez apologia à reedição do Ato Institucional Número 5. "Nunca defendi o AI-5, e sim que, naquela fase, naquele tempo histórico, ele se fez necessário politicamente. Isso não é defesa para que se volte à ditadura. Tampouco admiro e quero que volte ao regime ditatorial. A arbitrariedade do Estado é equivocada e desnecessária", emendou.
Maurizio Spinelli, advogado de Silveira, afirmou que o caso do cliente deveria ser tratado pela Câmara. Ele criticou a postura do STF e do juiz Aírton Vieira, que manteve a prisão do parlamentar na audiência de custódia.

O defensor destacou, ainda, que nenhum dos deputados foi capaz de validar o mandado de prisão tecnicamente. "As falas demonstram que é necessário que se atenham a critérios políticos, e isso ratifica a total ilegalidade e inconstitucionalidade da prisão do deputado Daniel Silveira. Manter a prisão é um equívoco grave, que a Câmara não tem a necessidade de praticar", frisou. "Há excesso de zelo em apenas mencionar o Supremo. Fica patente. Fica claro que há, inclusive, receio de se utilizar palavras equivocadas ao mencionar o STF, e, com isso, sofrer represália", alfinetou. (LC e JV)