Correio Braziliense, n. 21087, 17/02/2021. Cidades, p. 17

 

Reinvenção para sobreviver à crise

Ana Clara Avendaño 

17/02/2021

 

 

Com um dom capaz de encantar adultos e dar asas à imaginação de crianças, Sebastião Divino Trindade, 60 anos, redescobriu-se na marcenaria, ao projetar e construir brinquedos de madeira. No início da pandemia, Zito — como é conhecido — estava desempregado. Ele trabalhava como radialista, mas, fora da função, passou a depender do auxílio emergencial para se sustentar. Sebastião entrou para o grupo de quase 794 mil brasilienses aptos a receber o benefício no ano passado.

A assistência permaneceu como principal fonte de renda. No entanto, a necessidade de fechar o orçamento do mês veio atrelada ao início do atendimento de encomendas. "Fiz alguns bicos depois de ser demitido, mas não estava muito satisfeito. Descobri que sabia fazer brinquedos infantis para jardins e não parei mais. Com a covid-19, as coisas pararam, porém as pessoas começaram a passar mais tempo em casa, o que contribuiu para a continuidade dos pedidos", conta Zito.

As vendas cresceram, de fato, quando um cliente divulgou o trabalho do ex-radialista nas redes sociais. "Foi inacreditável. Vários números entraram em contato ao mesmo tempo naquele dia. Tenho encomendas até o fim de março. Agora, estou me reinventando com o comércio pela internet, porque, antes, era só presencialmente. Em alguns momentos, o auxílio (emergencial) foi apenas o que eu tinha", relata Sebastião.

No ano passado, o benefício injetou R$ 2,7 bilhões na economia da capital federal. Mas a renovação do programa ainda está em discussão no Ministério da Economia. Para o consultor em economia Carlos Eduardo Freitas, o auxílio deveria ser prorrogado por mais três meses. "Como o nome prevê, o pagamento é para urgências. Esperava-se que, neste mês, a emergência tivesse passado, mas isso não ocorreu. A pandemia continua, e a vacinação começou há pouco tempo", opina Carlos Eduardo.

Opção
Ao ser demitida e enfrentar problemas para receber o seguro-desemprego, Janaina Garcia, 45, recuperou as habilidades de manicure, cabeleireira e depiladora. "Tentei voltar a trabalhar em salões, como há 20 anos, mas não tive sucesso. Às vezes, eu terminava o expediente e não conseguia nem o dinheiro do transporte. Depois, veio a luz do fim do túnel: oferecer esses serviços em forma de delivery e com um preço mais acessível, sem taxa de deslocamento", conta Janaina.

Apesar dos esforços e de atender clientes em todo o Distrito Federal, a atividade ainda não gera renda suficiente para Janaina. Enquanto isso, ela recebeu duas parcelas do auxílio emergencial: "Consegui passar por uma nova triagem do programa. E foi muito bom para mim, porque pude comprar comida", diz a moradora de Taguatinga Norte.

Entre abril de 2019 e julho passado, Janaina trabalhou no setor de hotelaria de um hospital particular da Asa Sul. Porém, acabou demitida. "Eu tinha estabilidade, vale-alimentação e auxílio para transporte. Estava cheia de sonhos, mas, agora, estou com dificuldade até para custear minha faculdade de recursos humanos, no valor de R$ 50. Passo o dia inteiro mandando currículo. Aconteceu de empresas me ligarem para fazer estágio, porque gostaram do meu currículo, mas, depois, desistiam, por causa da minha idade", lamenta Janaina.

Novo desenho
Moradora do Guará 1, Margarida Soares, 39, estava desempregada desde o início da pandemia. Ela recebeu cinco parcelas do auxílio emergencial, mas, com o fim do benefício, tentou apostar em novas funções: intensificou as vendas de produtos de beleza por catálogo e passou a comercializar inseticidas de porta em porta. "Estou tentando levar a vida. Arranjar emprego no momento não é viável. Meu marido trabalha no comércio e houve aquela queda de salário e de clientes. Com minhas vendas, estou conseguindo me manter. Não é como antes da pandemia, mas as contas estão em dia", afirma Margarida.

A última Pesquisa de Emprego e Desemprego no Distrito Federal (PED-DF), divulgada em dezembro pela Companhia de Planejamento do DF (Codeplan), mostrou que, naquele mês, o total de desempregados na capital do país chegou a 291 mil — 3 mil a mais que em novembro.

Para o economista César Bergo, o país vive um momento letárgico. Portanto, não tem condições de absorver mão de obra. "Vimos que a economia tomou um novo rumo com esse auxílio, mas o problema são as fontes de recurso. Vejo que a ampliação do programa (de auxílio emergencial) vai ser aprovada, e é necessário, mas em outro desenho. Não deve ser como o do ano passado", avalia o presidente do Conselho Regional de Economia (Corecon-DF). "O governo trabalha com R$ 200, mas creio que será metade do que foi o de 2020 (R$ 300) e por três meses", completa.

* Estagiária sob supervisão de Jéssica Eufrásio

Serviço

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