O globo, n. 31970, 16/02/2021. País, p. 4

 

Primeiro teste

Jussara Soares

Paulo Cappelli

16/02/2021 

 

 

Dividido, Centrão pode ajudar a derrubar decretos das armas
Deputados influentes de partidos como PL e PSD defendem que o Congresso derrube os atos editados por Bolsonaro sobre controle de armas, por avançarem sobre poderes do Legislativo. Tema será primeiro teste da nova base aliada do governo após vitória de Arthur Lira na Câmara.

Duas semanas após ajudar a eleger Arthur Lira (PPAL) o novo presidente da Câmara negociando emendas e cargos com partidos políticos, o presidente Jair Bolsonaro enfrenta o primeiro teste de fogo de sua aliança com o Centrão para sua agenda pessoal. Os quatro decretos editados na última sexta-feira para flexibilizar regras para compra e uso de armas no país sem passar pelo Congresso são questionados tanto por parlamentares de oposição quanto por deputados de siglas que compõem a nova base do governo.

A reação aos decretos das armas, segundo parlamentares ouvidos pelo GLOBO, vai dar a dimensão ao presidente de que, apesar de ter saído vitorioso na eleição no Congresso, não terá apoio irrestrito, mesmo do Centrão, em suas pautas. E sinaliza ao governo que a cada nova pauta a negociação deverá ser retomada do zero, principalmente nos projetos que tratam de costumes.

Deputados de siglas como PL e PSD, duas das maiores do Centrão, e do MDB, já se manifestaram de forma contrária aos decretos. O Cidadania apresentou ontem um decreto legislativo para derrubar as novas normas, sob alegação de que o ato do presidente usurpa poderes do Congresso de legislar. Em sua primeira manifestação, Lira afirmou discordar dessa avaliação.

O vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), eleito na chapa de Lira com o apoio do Planalto, criticou o conteúdo dos decretos e afirmou que Bolsonaro exacerbou sua competência.

"Mais grave que o conteúdo dos decretos (...) é o fato de ele exacerbar do seu poder regulamentar e adentrar numa competência que é exclusiva do Poder Legislativo. O presidente pode discutir sua pretensão, mas encaminhando um PL (projeto de lei) à Câmara", escreveu.

Vice-líder do Cidadania, o deputado Daniel Coelho (PE) ingressou, ontem, com uma proposta de decreto legislativo (PDC) para derrubar o decreto 10.630, que julga ser o mais "amplo" dos quatro. Se aprovada, a medida poderá suspender boa parte dos atos de Bolsonaro que tratam de cadastro, registro, porte e compra de armas e munição, além do Sistema de Gerenciamento Militar de Armas. Para isso, Coelho precisará do apoio de três quintos dos votos.

O líder do PSDB na Câmara, deputado de Castro (MG), disse que o partido apoia a iniciativa do Cidadania e também estuda apresentar uma PDC para derrubar os decretos.

— É um ato revestido de ilegalidade, um ato extemporâneo e é uma falta de noção muito grande por parte do governo, que não está olhando os pressupostos legais —disse o líder tucano.

O deputado Fábio Trad (PSD-MS) se posicionou contra os decretos e diz que no seu partido, embora tenha parlamentares armamentistas, não tem ampla maioria apoiando a medida.

— O governo enfrentará resistência no Centrão. Eu, individualmente, sou contrário tanto por vício de iniciativa quanto pelo conteúdo, que me parece fora da prioridade do que o Brasil precisa. Não vejo coesão no Centrão hoje em relação a essas medidas —disse Trad.

BARROSO LIBERA AÇÃO

Líder do MDB, Isnaldo Bulhões (AL) disse ser "totalmente inoportuno" o governo publicar decretos que ampliemo acessoa armas e mm ei oà pandemia. Abancada do partidos e reunirá na próxima terça-feira para tratar do assunto. A expectativa é que, salvo exceções, a maioria do MDB se manifeste contra os decretos publicados por Bolsonaro. O D EM também reunirá abancada para debater o tema.

Abancada evangélica, grupo majoritariamente contra ampliação da posse de armas, ainda não se manifestou.

O presidente da Câmara, em entrevista ao G1, defendeu as medidas de Bolsonaro e disse que o Executivo não ultrapassou sua competência.

— Ele não invadiu competência, não extrapolou limites já que, na minha visão, modificou decretos já existentes. É prerrogativa do presidente. Pode ter superlativado na questão das duas armas para porte, mas isso pode ser corrigido —disse Lira.

Ontem, o ministro Luís Roberto Barroso liberou a continuidade do julgamento que analisará uma resolução do presidente Jair Bolsonaro que busca zerar a alíquota deim portação de revólveres e pistolas. A medida entraria em vigorem janeiro, mas foi suspensa por liminar do ministro Edson Fachin após ação movida pelo PSB. O processo havia sido suspenso após Barroso pedir vista do processo. A expectativa é que, agora, o tema entre na pauta do plenário virtual até a semana que vem.