Correio Braziliense, n. 21086, 16/02/2021. Política, p. 4

 

Fachin dispara contra Villas Bôas

Ingrid Soares 

16/02/2021

 

 

O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou ser "intolerável e inaceitável qualquer tipo de pressão injurídica sobre o Poder Judiciário". A manifestação ocorreu ontem, por meio de nota divulgada pela equipe de comunicação do magistrado, e é uma resposta aos posts de abril de 2018 do general Eduardo Villas Bôas, ex-comandante do Exército, feitos no mesmo dia em que a Corte julgaria um pedido de habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Fachin era relator do caso (leia Memória). Ele ainda caracterizou como gravíssima a declaração, caso confirmada.

"Anoto ser intolerável e inaceitável qualquer forma ou modo de pressão injurídica sobre o Poder Judiciário. A declaração de tal intuito, se confirmado, é gravíssima e atenta contra a ordem constitucional. E ao Supremo Tribunal Federal compete a guarda da Constituição", escreveu o ministro.

Em 2018, o general Eduardo Villas Bôas publicou dois tuítes de repúdio à impunidade. "Nessa situação que vive o Brasil, resta perguntar às instituições e ao povo quem realmente está pensando no bem do país e das gerações futuras e quem está preocupado apenas com interesses pessoais?", escreveu. "Asseguro à nação que o Exército Brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais", completou. O assunto voltou à tona após a publicação, na semana passada, do livro General Villas Bôas: conversa com o comandante, escrito por Celso Castro, pesquisador da Fundação Getulio Vargas.

Na obra, o general relatou que os tuítes foram discutidos com a cúpula do Exército e "teve um 'rascunho' elaborado pelo meu staff e pelos integrantes do Alto Comando residentes em Brasília". De acordo com ele, "tratava-se de um alerta, muito antes que uma ameaça". Segundo o jornal Folha de S.Paulo, o texto das mensagens foi atenuado, e ministros do governo Jair Bolsonaro participaram da redação antes da divulgação.

Na nota de ontem, Fachin destacou que "as Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do presidente da República". "E destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem", emendou.

Por fim, o ministro do STF ressaltou que o ataque contra o Capitólio americano, em 6 janeiro, foi frustrado porque as Forças Armadas tiveram "postura exemplar dentro da legalidade constitucional". "Frustrou-se o golpe desferido nos Estados Unidos da América do Norte contra o Capitólio pela postura exemplar das Forças Armadas dentro da legalidade constitucional", enfatizou. "A grandeza da tarefa, o sadio orgulho na preservação da ordem democrática e do respeito à Constituição não toleram violações ao Estado de direito democrático", concluiu.

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Tumultos na longa sessão 

16/02/2021

 

 

Em 4 de abril de 2018, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitaram o habeas corpus impetrado pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O voto da ministra Rosa Weber, considerado decisivo, foi justificado por ela como “respeito à colegialidade”. Dos 11 integrantes da Corte, seis votaram contra o recebimento da peça. O resultado aproximou Lula da cadeia — condenado a 12 anos no caso do triplex do Guarujá (SP) — e eliminou as expectativas dele de participar das eleições daquele ano. Validando o então entendimento do STF, de que os réus condenados em segunda instância podem ser presos, os ministros Cármen Lúcia, Rosa Weber, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Luiz Fux determinaram a rejeição do habeas corpus. A sessão foi tensa e repleta de alfinetadas. Cármen Lúcia, então presidente do tribunal, se envolveu mais de três vezes nas discussões dos colegas, que, a todo momento, interrompiam os votos uns dos outros. A plenária durou mais tempo do que se costuma ver em outros julgamentos — mais de 10 horas.