Correio Braziliense, n. 21079, 09/02/2021. Política, p. 2

 

Por mercado, Câmara vota independência do BC

Marina Barbosa 

09/02/2021

 

 

A Câmara pretende se debruçar sobre o projeto de lei que confere autonomia ao Banco Central (BC), hoje, na retomada das votações em plenário. A escolha da matéria, que blinda a autoridade monetária de interferências políticas e está, há décadas, no Congresso, visa sinalizar ao mercado comprometimento com a agenda econômica e foi acertada com o governo ontem.

Relator do projeto, o deputado Silvio Costa Filho (Republicanos-PE) discutiu, ontem, com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e com o ministro da Economia, Paulo Guedes, os detalhes do parecer que será levado ao plenário. Ele disse que teve "apoio de ambos" para o texto. Por isso, vai apresentá-lo a líderes partidários hoje, para que o plenário da Câmara vote a urgência e comece a se debruçar sobre o mérito da proposta. A ideia é ter a autonomia do BC aprovada até amanhã.

Presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) explicou que, além do aval da equipe econômica, há "sinalização positiva da maioria dos líderes" em relação ao projeto. Ele argumentou que essa é "uma grande sinalização de destravamento da pauta do Congresso, um grande sinal de previsibilidade para o futuro da economia brasileira e um grande sinal de credibilidade para o Brasil perante o mundo".

Na reunião com os deputados, Campos Neto reforçou que essa é uma indicação importante para os investidores internacionais, já que a autonomia blinda o BC de interferências políticas, garantindo a condução independente da política monetária e a estabilidade de preços no país. Isso porque o projeto fixa mandatos de quatro anos para a diretoria do BC, independentemente do mandato do presidente da República, e determina que o comando do banco não pode ser nomeado ou demitido pelo chefe do Executivo sem o aval do Senado.

Guedes concluiu que é um "importante avanço institucional", capaz, ainda, de ajudar a controlar a inflação no país. Ele lembrou que a questão é debatida há décadas pelo Congresso. O avanço começou apenas no ano passado, quando o Senado aprovou o projeto, de maneira virtual, em meio à pandemia da covid-19. O texto da Casa, contudo, traz uma inovação à proposta do governo, que foi mantida no parecer da Câmara: a atribuição de uma nova meta ao BC, de fomento ao pleno emprego.

Hoje, o BC tem como missão apenas a estabilidade de preços e a eficiência do sistema financeiro nacional. Silvio Costa Filho disse, porém, que a questão do emprego não foi questionada pela equipe econômica e, por isso, segue no parecer. "Discutimos ponto a ponto, artigo por artigo e, por concordância de ambos, tivemos a validação do nosso parecer", afirmou o relator.

Como mostrou o Correio, Campos Neto aceitou tratar desse assunto do emprego, desde que não haja comprometimento das demais atribuições do BC, para garantir a aprovação da autonomia neste momento de incertezas no mercado. Analistas dizem, no entanto, que, apesar de positiva, a sinalização não tranquiliza os investidores em relação ao andamento das demais pautas econômicas, que podem endereçar a situação fiscal do país.

"A autonomia do BC é muito importante, porque dá segurança ao presidente e aos diretores do banco. Porém, há coisas mais importantes para serem votadas agora, como as medidas de corte de despesas", lembrou Carlos Thadeu de Freitas Gomes, que foi diretor do Banco Central e hoje é economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC).

"Na prática, o BC já tem autonomia. Então, é mais urgente avançar em pautas com impacto fiscal. Avançar com o Orçamento e com a PEC Emergencial, que pode ajudar com a volta do auxílio emergencial, por exemplo. Seria uma sinalização mais forte de comprometimento com a agenda fiscal", reforçou Alejandro Ortíz, analista da Guide Investimentos.

Ele acrescentou que não há grandes resistências à autonomia do BC no Congresso. Por isso, disse que uma votação expressiva do projeto não garante o bom andamento das pautas econômicas. "A autonomia do BC é uma discussão que está madura. Já as pautas fiscais mais importantes, como a PEC Emergencial e a reforma administrativa, são mais difíceis de serem aprovadas", lembrou Ortíz.