Correio Braziliense, n. 21078, 08/02/2021. Mundo, p. 10

 

A esquerda e a direita no segundo turno

Rodrigo Craveiro 

08/02/2021

 

 

Menos de 10 minutos depois do fechamento das urnas, às 17h de ontem (19h em Brasília), o esquerdista Andrés Arauz, 36 anos, clamou vitória nas eleições presidenciais do Equador. "Ganhamos! Triunfo contundente em todas as regiões de nosso belo país. Nossa vitória é de 2 a 1 frente ao banqueiro. Felicitações ao povo equatoriano pela festa democrática. Esperaremos os resultados oficiais para festejar", escreveu Arauz no Twitter. Mas, o economista e afilhado político do ex-presidente Rafael Correa precisará aguardar até 11 de abril.

Segundo as principais pesquisas de boca de urna, Arauz e o banqueiro conservador Guillermo Lasso, 65, disputarão o segundo turno. Segundo a sondagem do instituto Cedatos, Arauz teve 34,94% dos votos, contra 20,99% para Lasso. Por sua vez, o instituto Clima Social aponta 36,2% para Arauz e 21,7% do adversário. O terceiro colocado nas duas pesquisas, o indígena Yaku Pérez — também de esquerda, mas opositor do correísmo — teve, respectivamente, 17,99% e 16,7%. Também pelas redes sociais, Lasso afirmou que o povo equatoriano enviou um recado "claro e contundente" de que "o espírito da mudança triunfará".

Rafael Correa adotou a mesma linha de discurso de seu pupilo. "Obrigado, Equador querido! A Revolução Cidadã ganhou de forma esmagadora, apesar de uma campanha suja e de quatro anos de perseguição brutal e de infâmias. (...) Tomara possamos vencer em um único turno, pelo bem do país. Até vitória sempre!", reagiu o ex-presidente. O temor de um alto índice de abstenção, devido ao medo de contrair a covid-19, não se confirmou. Segundo o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), a 25 minutos do encerramento da votação, 76% dos 13.099.150 equatorianos escolheram seu candidato.

"Será um enfrentamento muito forte, mas creio que Arauz tem mais possibilidades de vitória", disse ao Correio Simón Pachano, professor de ciência política da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), em Quito. Ele explica que Arauz deverá receber alta porcentagem de votos de Yaku Pérez, algo em torno de dois terços. "Lasso, por suavez, poderia capturar os votos dos demais candidatos, mas seriam insuficientes. Ele teria que fazer uma campanha direcionada à esquerda anticorreísta", comentou.

De acordo com Pachano, o triunfo de Arauz no segundo turno se explicaria por dois motivos:a diferência de dez ou mais pontos em relação a Lasso no primeiro turno; a votação de setores da esquerda que votaram em Pérez e não avalizariam um banqueiro. "A votação de Arauz se explica pela forte liderança de Correa. Os votos foram mais pelo ex-presidente, e não necessariamente pelo candidato. Além disso, pesou a memória dos tempos de 'boom econômico', durante os primeiros oito anos de governo de Correa (2007-2015), beneficiados pela alta do petróleo no mercado mundial."

Vice

Em entrevista ao Correio, Carlos Rabascall (leia o Duas perguntas para), candidato a vice-presidente de Arauz, disse que, se eleitos em abril, ambos terão que enfrentar dois desafios imediatos. "O primeiro deles é resolver a crise sanitária, produto da covid-19, que nos impulsionou a uma crise humanitária. O segundo envolve a reativação do setor produtivo, a fim de recuperar o emprego e a renda das famílias equatorianas", declarou.
Ao ser questionado sobre a relação com o Brasil de Jair Bolsonaro, caso Arauz vença, Rabascall disse que as relações internacionais serão "muito boas" com todas as nações. "Nós respeitaremos a autodeterminação dos povos. Mas, quero lhes dizer que a América Latina e o Caribe devem retomar o projeto de integração regional para além das ideologias. A pandemia da covid-19 ensinou-nos que não teremos êxito sozinhos."
As eleições ocorrem de forma tranquila. Sem poder votar, por estar registrado no México, Arauz acompanhou a avó materna, Flor Celina Galarza, de 106 anos, na seção eleitoral, no Colegio Nacional Santiago de Guayaquil, em Quito. Guillermo Lasso votou na cidade de Cuenca, acompanhado da mulher, María de Lourdes Alcivar.