Correio braziliense, n. 21063, 24/01/2021. Brasil, p. 6

 

Aras pede que STF abra inquérito contra Pazuello

Renato Souza 

24/01/2021

 

 

O procurador-geral da República, Augusto Aras, pediu que o Supremo Tribunal Federal (STF) abra inquérito para apurar a conduta do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, diante do colapso da saúde em Manaus. Na semana passada, a cidade registrou escassez de oxigênio, com pessoas morrendo asfixiadas, e, atualmente, enfrenta dificuldades para alocar pacientes em leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI). No pedido enviado ao Supremo, Aras quer que o ministro Pazuello seja ouvido e que os autos sejam encaminhados à Polícia Federal, que deve investigar o caso. A decisão do procurador atende denúncia enviada à Procuradoria-Geral da República por partidos políticos. As siglas acusam o ministro da Saúde e seus auxiliares de se omitirem frente à crise na capital amazonense.

Os autores do pedido alegam que Pazuello orientou a população a fazer uso de medicamentos sem eficácia científica comprovada contra a covid-19, como a cloroquina, e de não agir para evitar mortes. De acordo com as alegações, o governo federal teria sido avisado com semanas de antecedência, pela empresa White Martins — que fornece o oxigênio para hospitais de Manaus —, que os estoques estavam acabando, diante da demanda crescente em razão do grande número de internações de pessoas infectadas pelo novo coronavírus. Anteriormente, Aras já havia solicitado investigação das ações do governador do Amazonas, Wilson Lima, e incluiu pedido de diligências mirando o atual e o ex-prefeito de Manaus.

O Ministério da Saúde afirma que foi informado sobre a falta de oxigênio em 8 de janeiro, mas que já havia um alerta desde o fim de dezembro. Mas, a entrega do oxigênio pelo governo federal só começou no dia 12 deste mês. Segundo a PGR, "após analisar as informações, apresentadas em ofício de quase 200 páginas, e atento à situação calamitosa de Manaus, o procurador-geral considerou necessária a abertura de inquérito para investigar os fatos". O Ministério da Saúde disse, ontem, que ainda não tinha sido notificado sobre o inquérito.

Augusto Aras foi criticado por colegas e acusado de se omitir por eventuais crimes do ministro da Saúde e do presidente Jair Bolsonaro diante da pandemia do novo coronavírus e da situação de Manaus. Ele é alvo de um pedido de senadores para que responda a um processo administrativo no Conselho Superior do Ministério Público Federal (MPF). No documento, os senadores Randolfe Rodrigues (Rede/AP), Fabiano Contarato (Rede-ES) e Alessandro Vieira (Cidadania) acusam Aras de infração disciplinar em razão de uma nota da PGR que cita que o Estado de Calamidade Pública é uma "antessala do Estado de Defesa".

Além disso, os congressistas também acusam Aras de omissão em razão da publicação do mesmo texto, que em outro trecho cita que "eventuais ilícitos que importem em responsabilidade de agentes políticos da cúpula dos Poderes da República são da competência do Legislativo". No texto, os senadores afirmam que o chefe do Ministério Público tem se omitido em atuar contra falhas e crimes de Bolsonaro relacionados ao cargo.

A investigação solicitada pelo chefe do Ministério Público não envolve o presidente. No relatório enviado ao Supremo, Aras afirma que o governo teria distribuído 120 mil unidades de Hidroxicloroquina como medicamento para tratamento da covid-19 no dia 14 de janeiro, às vésperas do colapso por falta de oxigênio. "Considerando que a possível intempestividade nas ações do representado, o qual tinha dever legal e possibilidade de agir para mitigar os resultados, pode caracterizar omissão passível de responsabilização cível, administrativa e/ou criminal, impõe-se o aprofundamento das investigações a fim de se obter elementos informativos robustos para a deflagração de eventual ação judicial", afirma o procurador-geral.

Ontem, o governador do Amazonas, Wilson Lima, proibiu a circulação de pessoas nas ruas a partir desta segunda-feira. No Pará, em duas cidades, só há oxigênio nos hospitais até hoje. Em Porto Velho (RO), o sistema de saúde entrou em colapso ontem.