Valor econômico, v. 21, n. 5188, 12/02/2021. Brasil, p. A2

 

Resposta do MEC à pandemia falhou, diz Mozart

Leila Souza Lima

12/02/2021

 

 

Para educador, segunda onda de covid-19 vai exigir sistema híbrido de ensino também em 2021

O Ministério da Educação falhou em seu papel de coordenar a resposta ao impacto da pandemia no ensino público, principalmente até a gestão de Abraham Weintraub. A avaliação é de Mozart Neves Ramos, cátedra da USP-Ribeirão Preto e membro do Conselho Nacional de Educação (CNE), entrevistado de ontem na Live do Valor. Para ele, a pasta precisa assumir a coordenação no combate à crise, para que 2021 não repita os prejuízos sofridos. A volta ao presencial, disse, deverá ser gradual.

“Tem que se reconhecer que, infelizmente, em 2020, principalmente até momento do Weintraub como ministro, a articulação foi zero com as redes de ensino, sejam municipais, sejam estaduais. Faltou uma coordenação nacional”, apontou.

O CNE formulou pareceres claros sobre medidas que deveriam ser tomadas e investimentos necessários, disse. É o caso do currículo on-line, atividades remotas que deveriam ser oferecidas e condições para aula presencial.

O educador discorda da posição do atual ministro Milton Ribeiro sobre o papel do MEC na gestão do impacto da pandemia. Ribeiro reconheceu que a crise de saúde acentuou a desigualdade educacional no país, mas se eximiu da responsabilidade de coordenar o retorno às aulas e o ensino remoto. “Não é um problema do MEC, mas um problema do Brasil”, afirmou Ribeiro, ano passado, em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”.

Para Mozart, o papel do MEC nesse âmbito está previsto na Lei de Diretrizes e Bases (LDB) da educação nacional e na Constituição. “Repassar dinheiro é apenas ponto de partida. O papel do MEC é central na coordenação das políticas.”

Ele observou que a tarefa ficou na mão de secretários municipais e estaduais e do Conselho Nacional de Educação. “Ele está confundindo execução com coordenação. A coordenação, sim, está prevista na LDB, em todos os documentos legais da educação brasileira.”

Mozart sugeriu que o ministro se debruce mais sobre o tema e abrace a coordenação. “É só ler um pouco a própria LDB, a própria Constituição Federal, que ele vai encontrar que é relevante que o Ministério da Educação trabalhe essa coordenação nacional. Até para que os entes federativos, Estados e municípios, trabalhando de maneira articulada, possam exercer, sim, no que ele está certo, a parte executiva.”

A volta às aulas no sistema público ainda é um grande desafio no segundo ano da pandemia, avaliou. Isso se deve, segundo ele, tanto à desigualdade na educação, quanto às falhas na resposta nacional à crise sanitária em 2020 e às incertezas em face da segunda onda. “Vamos ter dois anos em um. Teremos que trabalhar aquelas atividades planejadas para 2021, mas vamos ter que integrar as aprendizagens que não foram desenvolvidas em 2020”, disse.

Mozart contou que, em conversas com secretários de Educação, percebe que os resultados das atividades escolares ano passado ficaram aquém do esperado, mesmo para quem teve acesso ao ensino remoto. Para ele, o retorno às aulas é solução ainda mais complexa nas redes municipais de ensino, devido às limitações físicas das escolas. O sistema educacional como um todo não conseguiu se estruturar para a retomada.

Em sua visão, ninguém imaginava uma segunda onda da covid-19 na intensidade com que chega ao país. “Então isso coloca muitas dúvidas com relação ao retorno às atividades presenciais.”

Ele fez ressalva para unidades federativas que, em sua avaliação, se organizaram, citando Estado e município de São Paulo, além do Paraná. Para ele, no primeiro semestre, a educação deve seguir num plano híbrido, com predomínio do ensino remoto sobre o presencial.