Correio braziliense, n. 21052, 13/01/2021. Economia, p. 6

 

Inflação avança e é a maior em quatro anos

Rosana Hessel 

Jailson Sena 

13/01/2021

 

 

A inflação, que parecia comportada no começo de 2020, e chegou a ficar negativa no auge da pandemia de covid-19, acabou encerrando o ano surpreendendo o mercado e sinalizando que não deve dar trégua em 2021. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), indicador oficial da inflação, acelerou de 0,89%, em novembro, para 1,35%, em dezembro, a maior taxa para o mês desde 2002, puxado pela alta dos preços dos alimentos e da energia elétrica.

No acumulado do ano, o IPCA subiu 4,52%, maior patamar desde 2016, quando marcou 6,29%. A taxa anual ficou acima do centro da meta estipulada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) para o ano, de 4%, mas abaixo do teto, de 5,5%. O dado ainda superou a mediana das estimativas apontadas no boletim Focus, do Banco Central, de 4,3%.

O vilão de 2020 foi o óleo de soja, cujo preço mais do que dobrou no ano passado (103,79%). O arroz, ficou na vice-liderança, com alta de 76,01%. A influência dos alimentos na alta da inflação — o grupo alimentos e bebidas avançou 14,09% no ano passado — penalizou com mais força os mais pobres. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que mede o custo de vida das famílias com renda mensal de até cinco salários mínimos, acumulou alta de 5,45% em 2020, conforme os dados do IBGE.

Com a comida mais cara, consumidores têm mudado os hábitos de consumo para não estourar o orçamento doméstico. Moradora de Luziânia, a camareira Valquíria Moreira, 42 anos, contou que faz pesquisa antes de ir ao supermercado. "Tudo está muito caro e sempre temos que fazer economia, procurando as melhores opções, como buscar lugares e marcas mais baratas", disse. O cozinheiro Gean Souza, 28, que estava desempregado até dezembro, também faz malabarismos para conseguir pagar as contas e a prestação da casa própria. "Tive que economizar no supermercado para conseguir pagar as prioridades, que são água, luz e internet. As demais serão renegociadas para serem quitadas."

Entre as 16 capitais pesquisadas pelo IBGE, Brasília foi a que teve a menor variação do IPCA em 2020, de 3,40%. Campo Grande registrou a maior alta, 6,85%.

Juros
Diante da pressão inflacionária, analistas reforçam as apostas de que o Banco Central poderá começar a elevar a taxa básica de juros (Selic) ainda na primeira metade deste ano. Um dos motivos é o fato de o IPCA ter apresentado aumento na dispersão em dezembro, passando de 68% para 72%, o que significa que a alta de preços foi generalizada. No acumulado do ano, apenas vestuário apresentou queda, de 1,13%.

"O dado de dezembro veio um pouco acima do que esperávamos. Para este ano, mantemos a previsão de alta de 3,8% do IPCA, mas acredito que muitos analistas devem revisar as projeções. O câmbio ainda vai estar elevado e os preços de commodities, também, devido ao crescimento chinês e à desvalorização do dólar lá fora. Há diversos preços represados de 2020 que devem subir neste ano, basta lembrar os planos de saúde", alertou Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. "Acho que o resultado de hoje só reforça o BC ter que subir Selic na metade do ano."

O diretor de Política Monetária do Banco Central, Bruno Serra, admitiu que a Selic deve voltar a subir em 2021, saindo da mínima histórica de 2% ao ano. Porém, disse que esse debate só deve ganhar força depois que o cenário político indicar qual será o rumo da política fiscal brasileira. "A taxa de juros estrutural da economia brasileira não é 2%. Não é a taxa em que o Brasil vai conviver em situações normais. É o nível que o Banco Central precisou colocar para perseguir a meta de inflação em um ambiente bastante atípico", afirmou, em live com o mercado financeiro.

André Braz, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), disse que as pressões inflacionárias persistem em 2021. "A energia pesou bastante no IPCA, mas, como estamos em um ano em que as chuvas devem ser menores, devido ao efeito La Niña, há riscos de novos reajustes ao longo de 2021 e até mesmo queda no nível dos reservatórios", alertou. Pelas contas de Braz, os planos de saúde devem sofrer um reajuste médio de 20% este ano, o que também vai pesar no custo de vida. "Não vejo condições para o IPCA ficar abaixo de 3,75%. Em um cenário pior, com atrasos na vacinação e ruídos na comunicação do governo e com piora na trajetória da dívida pública, é provável que o indicador suba 4,5%", apostou. (Colaborou Marina Barbosa)

*Estagiário sob supervisão de Odail Figueiredo

_________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Mínimo fica sem aumento real 

13/01/2021

 

 

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) acumulou alta de 5,45% em 2020, conforme dados divulgados, ontem, pelo Instituto Brasileiro de Economia e Estatística (IBGE). Com isso, o salário mínimo de 2021, fixado pelo governo em R$ 1.100, teve correção abaixo da inflação. Se o INPC fosse aplicado integralmente, o piso salarial deveria ficar em R$ 1.102.

Este é o segundo ano em que o salário mínimo não tem reajuste real, ou seja, acima do custo de vida. A regra anterior, que corrigia o piso pelo INPC mais a variação do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes, não foi prorrogada e expirou em 2018. Com isso, seguindo a Constituição, o governo precisa, pelo menos, manter o valor de compra do salário mínimo, que significa corrigi-lo pela inflação. Procurado, o Ministério da Economia ainda não confirmou se vai atualizar o valor do mínimo.

Em janeiro de 2020, devido ao fato de o INPC encerrar o ano acima das projeções, a equipe econômica precisou reajustar o piso de R$ 1.039 para R$ 1.045 via medida provisória. No fim do ano passado, corrigiu o mínimo em 5,26% para 2021, "arredondando para cima" a estimativa de 5,22%.

De acordo com dados do Ministério da Economia, a cada real a mais de reajuste no salário mínimo, as despesas do governo federal com a Previdência Social sofrem um impacto de R$ 351,1 milhões no Orçamento de 2021. Logo, a correção de R$ 2 a mais sobre o novo piso implicaria em mais R$ 702,2 milhões de gastos em um Orçamento bastante limitado.

Na avaliação da economista Juliana Damasceno, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), o reajuste do mínimo será mais um problema para o governo administrar na gestão do Orçamento de 2021, que ainda não foi aprovado pelo Congresso. Mesmo com o valor atual de R$ 1.100, já existia um gasto adicional de R$ 4,2 bilhões previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). (RH)