Título: Machado vive! O homem por trás do mito...
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Fonte: Jornal do Brasil, 14/10/2008, Opinião, p. A8

Imortal, de acordo com Aurélio Buarque de Holanda, quer dizer "que não morre; eterno, imorredouro". Ao ser humano, tal hipótese é impossível, mas, às suas facetas, não. Um homem pode morrer e as ações por ele empreendidas permanecerem.

Esse é o caso de Joaquim Maria Machado de Assis: romancista, contista, poeta e teatrólogo, considerado um dos mais importantes nomes da literatura brasileira. Este ano completam-se 100 anos de sua morte.

Apesar da origem humilde e da saúde frágil, epilético e gago, o filho de Francisco José de Assis, pintor de paredes e descendente de escravos alforriados, e de Maria Leopoldina Machado, lavadeira portuguesa da Ilha de São Miguel, Machado de Assis foi responsável por uma das maiores produções literárias brasileiras e se tornou um dos grandes intelectuais do país ainda jovem. Sua extensa bibliografia compreende nove romances, 200 contos, uma dezena de peças de teatro, cinco coletâneas de poemas e milhares de crônicas.

A emoção toma conta daqueles que lembram da vida e detalhes dos romances deste importante escritor brasileiro. Gênio e autodidata, Machado era um daqueles iluminados que fundaram a Academia Brasileira de Letras. Ele conseguiu conciliar a escola com a venda de doces, não tendo acesso a cursos regulares. Superou sua situação social e histórica para criar uma ficção universal. Suas obras apresentam uma rica descrição de detalhes e movimentos, fazendo o leitor se misturar a seus personagens.

Em 1869, casou-se com a portuguesa Carolina Augusta Xavier de Novais, irmã do poeta Faustino Xavier de Novais e quatro anos mais velha. Viveram juntos até 1904, quando Carolina morreu. Machado, então, escreveu um de seus melhores poemas, Carolina, em homenagem à falecida esposa. Muito doente, solitário e triste depois da morte da mulher, Machado de Assis faleceu em 29 de setembro de 1908, em sua velha casa no bairro carioca do Cosme Velho.

Machado, como todos os autores do gênero, escapa aos limites de todas as escolas, criando uma obra única. Um de seus livros mais famosos, Memórias Póstumas de Brás Cubas, marca o início do Realismo no Brasil. O livro, extremamente ousado, é narrado por um defunto e começa com uma dedicatória inusitada: "Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas Memórias Póstumas".

Machado de Assis é considerado um dos 100 maiores gênios da literatura de todos os tempos, ao lado de clássicos como Dante, Shakespeare e Cervantes.

Atualmente, toda a obra de Machado de Assis é de domínio público. O Ministério da Educação (MEC) disponiblizou suas 243 obras na internet, em edições digitais, confiáveis e gratuitas, no endereço www.portal.mec.gov.br/machado.

Por meio de sua obra, Machado de Assis cruzou fronteiras d"além mar e se tornou imortal com seus escritos e exemplo de superação.

Seu poema Bons Amigos é uma amostra de sua saborosa poesia:

"Abençoados os que possuem amigos, os que os têm sem pedir/Porque amigo não se pede, não se compra, nem se vende/Amigo a gente sente!/Benditos os que sofrem por amigos, os que falam com o olhar/Porque amigo não se cala, não questiona, nem se rende/Amigo a gente entende!/Benditos os que guardam amigos, os que entregam o ombro pra chorar/Porque amigo sofre e chora/Amigo não tem hora pra consolar!/Benditos sejam os amigos que acreditam na tua verdade ou te apontam a realidade/Porque amigo é a direção/Amigo é a base quando falta o chão!/Benditos sejam todos os amigos de raízes, verdadeiros/Porque amigos são herdeiros da real sagacidade/Ter amigos é a melhor cumplicidade!/Há pessoas que choram por saber que as rosas têm espinho/Há outras que sorriem por saber que os espinhos têm rosas!"