Valor econômico, v. 21, n. 5171, 20/01/2021. Mundo, p. A10

 

O 46º presidente dos EUA

20/01/2021

 

 

O democrata Joe Biden assume hoje como 46º presidente dos EUA. Aos 78 anos de idade, Biden é o mais velho presidente a tomar posse nos EUA. A posse está prevista para meio-dia em Washington (14h de Brasília). Donald Trump deve pousar no Aeroporto Internacional de Palm Beach, na Flórida, às 11h e será o primeiro presidente a se ausentar da posse de seu sucessor desde Andrew Johnson, em 1869. O presidente da Suprema Corte, John Roberts, conduzirá o juramento de Biden às 12h. Membros do Congresso e ex-presidentes como Barack Obama, Bill Clinton e George W. Bush devem estar presentes. Depois, o novo presidente fará discurso inaugural, no qual pedirá união aos americanos, depositará uma coroa de flores no Monumento ao Soldado Desconhecido, e então seguirá para a Casa Branca. O grand finale será o evento Celebrating America, que começará 20h30 e terá artistas como Bruce Springsteen, Foo Fighters e Justin Timberlake.

______________________________________________________________________________________________________________________

Biden assume com plano ambicioso para os cem primeiros dias

Catherine Lucely

Alex Learly

20/01/2021

 

 

Os cem primeiros dias de um novo governo são normalmente monitorados de perto, na tentativa de captar sinais do estilo de governo e das prioridades do presidente
O presidente eleito dos EUA, Joe Biden, assume o cargo hoje com um ambicioso conjunto de planos para seus 100 primeiros dias de governo. Mas ele terá o desafio de maiorias democratas muito estreitas no Congresso e um país perturbado, enquanto busca reverter algumas das políticas de seu antecessor e conter a pandemia.

A agenda de Biden inclui algumas medidas que ele poderá tomar rapidamente, como ordens executivas destinadas a reverter alguns atos do presidente Donald Trump e reintegrar os EUA a acordos internacionais. Ele também tem metas que exigem cooperação dos dois partidos no Congresso, como um pacote de alívio de US$ 1,9 trilhão, e a confirmação de seus indicados para o seu Gabinete num Senado dividido, 50-50, que ainda terá de fazer o julgamento de impeachment de Trump - acusado de incitar a invasão do Congresso para continuar no poder.
Os 100 primeiros dias de um novo governo são normalmente monitorados de perto, na tentativa de captar sinais do estilo de governo e das prioridades do presidente. No passado, presidentes anunciaram solenemente grandes iniciativas, como fez Barack Obama com a aprovação de um projeto de lei de estímulo econômico, ou começaram a trabalhar em um acordo relevante, como fez George W. Bush com seu pacote de corte de impostos. Mas eles também sofrem tropeços, como a incapacidade de Trump de acabar com o Obamacare. E Biden terá no Congresso margens mais estreitas do que Trump teve ao assumir o governo.

“Serão 100 dias difíceis. Sempre são. Embora os democratas estejam no controle do Congresso, não se trata de uma maioria esmagadora. Está claro que o presidente que encerra hoje o mandato conserva muito apoio, que estamos no meio de uma pandemia”, disse Julian Zelizer, professor de história da Universidade Princeton.

Biden planeja uma enxurrada de ordens executivas em seus 10 primeiros dias. No dia da posse, essa agenda inclui reintegrar os EUA ao Acordo de Paris sobre o clima; reverter uma proibição a viagens originárias de vários países africanos e de maioria muçulmana; exigir o uso de máscaras em órgãos federais e durante viagens interestaduais por avião, trem e qualquer forma de transporte público; e a prorrogação das restrições a despejos e a arrestos de imóveis residenciais por falta de pagamento.
“O presidente eleito Biden tomará medidas - não só para reverter os danos mais graves causados pelo governo Trump - como também para fazer nosso país avançar”, disse o futuro secretário de Governo, Ron Klain, em memorando a funcionários da Casa Branca.

O porta-voz do governo Trump, Judd Deere descreveu ontem os planos de Biden de reverter as políticas de Trump como “um erro grave que tornará os EUA menos seguros, desacelerará nossa recuperação econômica e prejudicará o trabalhador americano”.

Mas os decretos de Biden podem não ir tão longe quanto alguns da ala de esquerda de seu partido gostariam, sinalizando um conflito que pode acompanhar todo o seu governo. Por exemplo, embora ele planeje prorrogar a suspensão dos pagamentos de crédito estudantil isento de juros, alguns democratas pressionaram pelo perdão total ou da maior parte do US$ 1,6 trilhão da dívida estudantil federal.

Em dezembro, em conversa com jornalistas, Biden questionou se ele detinha esse poder executivo. Advogados do governo Trump argumentaram que uma medida desse gênero seria ilegal.

Para os próximo dias Biden também planeja uma série de iniciativas referentes à crise da covid-19 e ao alívio econômico. E, na semana seguinte, prevê-se que adotará medidas relativas à Justiça penal, mudança climática e imigração, inclusive esforços para reunir famílias que foram separadas na fronteira pelo governo Trump.
Os democratas há muito criticam as medidas executivas de Trump como uma extrapolação indevida de sua autoridade. Obama foi atacado por motivos semelhantes por usar decretos para instaurar iniciativas como uma proteção contra a deportação a jovens imigrantes que viviam sem autorização no país. Biden poderá enfrentar críticas semelhantes de conservadores. Em seu memorando, Klain argumentou que a sustentação jurídica para as iniciativas pretendidas é sólida, dizendo que elas “representam um restabelecimento de um papel adequado, constitucional para o presidente”.

Klain disse ainda que Biden enviará um projeto de lei sobre imigração ao Congresso em seu primeiro dia de governo. O presidente eleito prometeu promover amplas mudanças na imigração, incluindo um caminho para que 11 milhões de pessoas que já moram nos EUA sem status legal possam obter a cidadania. Um graduado membro da equipe de transição disse nesta semana que o plano incluirá uma trajetória de oito anos para a cidadania.
Os últimos três presidentes não conseguiram promover uma reforma abrangente da legislação sobre imigração, e é pouco provável que essa iniciativa seja aprovada por um Senado dividido.

Com relação à pandemia, Biden prometeu 100 milhões de doses de vacina em seus 100 primeiros dias e a reabertura da maioria das escolas de ensino fundamental. Ele se comprometeu a atuar ao lado do Congresso em torno do pacote de alívio de US$ 1,9 trilhão, que expandirá a vacinação, melhorará a testagem e o tratamento, oferecerá mais ajuda econômica e mais recursos para cidades e escolas.

Para acelerar a vacinação, ele planeja ampliar o papel do governo na distribuição, inclusive por meio da abertura de centros de centros comunitários federais e de clínicas móveis de vacinação. Pretende expandir o uso da lei de mobilização de segurança nacional para expandir a fabricação de vacinas e de suprimentos para vacinação.

Se as projeções anteriores das empresas se concretizarem, a meta de doses para os 100 primeiros dias de Biden deverá ser factível, segundo esforços para aumentar significativamente o ritmo das vacinações e desacelerar a propagação do vírus também dependerão das parcerias estaduais e de apoio da população a algumas medidas de saúde pública.

O plano de Biden, de US$ 1,9 trilhão, inclui a expansão das testagens nas escolas, bem como US$ 130 bilhões para contribuir para o retorno às aulas. Pelo fato de as decisões de reabertura serem tomadas em nível municipal, esse financiamento é descrito como flexível e pode ser canalizado para reduzir os tamanhos das classes, modificar as instalações, compra de equipamento de proteção ou investimento em esforços de mitigação.

Embora a maioria dos projetos de lei exijam 60 votos para avançar no Senado, os democratas poderão aprovar algumas das políticas propostas por Biden por meio de um recurso, chamado de reconciliação, que permite maioria simples para determinada legislação. Mas esse recurso tem restrições, entre as quais um limite sobre o número de vezes que pode ser usado e regras que restringem seu uso a matérias fiscais e tributárias.
Aliados argumentam que seus 36 anos de Senado ajudarão Biden a negociar com o Congresso. “Ele está conversando com líderes republicanos no Senado mais do que vocês percebem”, disse o senador democrata Chris Coons amigo de longa data do presidente eleito.

Muitos republicanos já disseram que o pacote de combate à covid-19 de Biden é caro demais, sugerindo um prenúncio de um novo foco em gastos e na dívida nacional que foi abrandado durante o mandato de Trump. O senador republicano Pat Toomey disse que a proposta de Biden, se aprovada, “será um desperdício gigantesco e economicamente prejudicial”.

Biden também enfrentará uma trajetória difícil no âmbito de seu próprio partido, em vista da escala de suas propostas e da necessidade de manter unidos os democratas de esquerda e os moderados nas duas casas do Congresso.

Em política externa, Biden deverá dar continuidade a muitas das políticas de Trump voltadas para a China. Ele já declarou que não adotará qualquer medida imediata para eliminar as tarifas instituídas por Trump sobre alguns produtos importados da China ou para alterar o acordo comercial “de fase um” com a China firmado pelo governo republicano.

Biden planeja retornar os EUA ao acordo nuclear de 2015 com o Irã - que Trump usou um decreto para tirar o país -, embora não se saiba em que momento essa providência será tomada. O presidente eleito condicionou qualquer iniciativa à reversão, pelo Irã, de todas as suas infrações ao acordo, que limita suas atividades nucleares.

Governos anteriores também tentaram agir rapidamente em seus 100 primeiros dias. Rahm Emanuel, que foi o primeiro secretário de Governo de Obama, disse que eles assumiram com planos diferentes para um mês, 100 dias e um ano. Ari Fleischer, que trabalhou como porta-voz de George W. Bush, recordou os avanços iniciais nos cortes de impostos e na área de educação, mas também observou que eles tentaram evitar avaliações de seus 100 primeiros dias.
“Inicialmente queríamos minimizar tudo o que se referisse a 100 dias porque sentíamos que era uma medida enganosa que ocorre rápido demais”, disse ele. “Mas a vida real não é assim. A mídia fará os artigos de qualquer maneira.”

Joe Biden, 46º presidente dos EUA