O globo, n.31900, 08/12/2020. Sociedade, p. 12

 

Em 20 dias, fila por um leito no estado do Rio cresceu 254%

Diego Amorim 

Arthur Leal 

08/12/2020

 

 

A fila de pacientes com suspeita ou confirmação de Covid-19 no Rio deu um salto de 254% desde o último dia 19 de novembro. Ontem, havia 472 pessoas à espera de uma vaga de enfermaria (220) ou de UTI (252), segundo a Secretaria estadual de Saúde. Há três semanas, eram 133. Ao mesmo tempo, a demanda por atendimento médico nas UP As não para decrescer, aumentando a pressão sobre o sistema de saúde já que alguns pacientes são graves e necessitam de terapia intensiva.

—Está bem cheio lá dentro. Eu trouxe o me upai, que acordou com muita falta de ar, cansaço e dor no corpo. Foi atendido, colocado em isolamento e aguarda para fazer os exames. Assim como ele, há vários outros casos suspeitos na UPA. Tem gente que há dois ou três dias tenta uma vaga, mas ainda não conseguiu — conta a dona de casa Verônica Assis, de 42 anos, que estava ontem na UPA de Realengo, na Zona Oeste.

O diretor de comunicação do Sindicato de Médicos do Rio (SinMed-Rio), Carlos Vasconcelos, afirma que a superlotação das UPAs no Rio — que são portas de entrada da rede do SUS — é um termômetro do que está acontecendo na cidade.

—A taxa de ocupação de leitos mais alta sobrecarrega a fila porque são vagas sem muita rotatividade —diz, referindo se ao fato de pacientes graves de coronavírus permanecerem mais tempo em UTIs.

MENINO ESTÁ GRAVE

Transferido de Itaperuna, no Noroeste Fluminense, para o Rio, no domingo, um menino, de 8 anos, continua grave no Hospital Menino Jesus, em Vila Isabel.

A Secretaria estadual de Saúde estimou ontem que a taxa de ocupação de leitos de enfermaria era de 63% e de 82% em camas de UTI. No município, em toda a rede SUS (que inclui leitos de unidades municipais, estaduais e federais), a taxa de ocupação para Covid-19 é de 92% em leitos de UTI e de 88%, em enfermarias.

Os números ainda estão longe do que se viu no ápice pandemia. Em 9 de maio, 1.283 pacientes aguardavam por leito, sendo 510 para UTI. Mas as estatísticas já apontam para um claro agravamento do avanço da doença.

—Essa situação tende a piorar ainda mais com as aglomerações nas festas de fim de ano — avalia Vasconcelos, acrescentando que o quadro ficou mais dramático com o fechamento dos hospitais de campanha.

A aposentada Lia Pereira, de 90 anos, está há quase uma semana tentando uma internação. No fim de novembro, a idosa começou a apresentar sintomas de Covid-19. Com febre alta, dor no corpo e falta de ar, ela e afilha, a recepcionista Léa Paiva, de 60 anos, foram até a UPA de Campo Grande, Zona Oeste. Sem vagas, as duas voltaram para casa.

— Disseram que não tinha leito. No Hospital Rocha Faria, a situação é a mesma. Estamos entregues à sorte e à vontade de Deus —desabafou Léa.

Uma funcionária da unidade, sem se identificar, contou que estão atendendo cerca de 400 pessoas por dia:

— A maioria com suspeita de Covid-19 e com síndrome respiratória.

Na última sexta-feira, o governador em exercício Cláudio Castro e o prefeito Marcelo Crivella prometeram abrir novos leitos e intensificar a fiscalização para exigir da população o cumprimento das regras de ouro, como uso de máscaras e distanciamento social.

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Fiocruz alerta para "sincronização" da pandemia 

Felipe Grinberg 

08/12/2020

 

 

O grupo de estudos Observatório Covid-19 da Fiocruz publicou uma nota técnica alertando para um possível cenário de “sincronização da epidemia” do coronavírus no Brasil como fim do ciclo de interiorização. Ou seja, com casos confirmados na maior parte do país, não há mais um movimento geográfico da doença, e o avanço do vírus acontece simultaneamente.

Na avaliação do corpo técnico, o aumento da circulação das pessoas entre municípios, sobretudo com a proximidade das festas de fim de ano, pode levar a um aumento de casos em diversas regiões ao mesmo tempo, inclusive no interior. Nesse cenário, o grupo aponta que alguns estados poderão experimentar um “novo colapso no sistema de saúde” porque a transmissão vai aumentar e, ao mesmo tempo, a busca por atendimento médico.

“Se no início da pandemia existia essa diferenciação espacial e temporal, agora que a doença já atinge todos os municípios do país provavelmente ocorrerá um aumento concomitante de casos e óbitos no mesmo espaço de tempo, o que conflagra a grave dependência da população aos leitos disponíveis simultaneamente para Regiões Metropolitanas e interior”, diz trecho da nota.

O fenômeno, segundo os especialistas, ocorreu na Europa, que atravessa uma segunda ondada doença. Umadas principais hipóteses é que a grande circulação de pessoas nas férias deverão tenham aumentado a transmissão do vírus nos países europeus.

No Brasil, uma das principais preocupações do Observatório é que um aumento de casos no interior deixe a população de municípios menores e afastados dos grande centros desassistida.

“O volume de óbitos ocorridos fora da UTI nos municípios do interior é mais elevado que nas regiões metropolitanas. A falta de UTI ainda foi mais expressiva nos municípios do interior, sobretudo pela dificuldade de acesso e pelas longas distâncias que devem ser percorridas em busca de atendimento”, diz outro trecho da nota.