O globo, n.31900, 08/12/2020. País, p. 4

 

Passos da sucessão

Paulo Cappelli 

Isabella Macedo 

08/12/2020

 

 

 Recorte capturado

Com o veto do Supremo Tribunal Federal (STF) à reeleição para o comando do Congresso em uma mesma legislatura, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), corre para manter unido o grupo que sustentou seus mandatos no cargo e evitar dissidências. Aproveitando o momento, o líder do PP, Arthur Lira (AL), candidato ao posto com o apoio do presidente Jair Bolsonaro, intensificou a busca por apoios entre aliados de Maia, incluindo partidos de esquerda.

Enquanto o grupo do atual presidente da Câmara busca colar em Lira a pecha de governista, o deputado vem tentando se distanciar da pauta de costumes do governo. Ontem, o parlamentar esteve no Recife, onde se reuniu com o governador Paulo Câmara, vice-presidente do PSB, e deputados pernambucanos. À noite, retornou a Brasília e, acompanhado pelo presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), foi recebido por Bolsonaro no Palácio do Planalto (leia sobre a sucessão no Senado na página 6). Hoje, Lira voltará ao giro pela esquerda — tem reunião marcada com a bancada do PCdoB.

O líder do PP calcula que, se conseguir o voto de 30% dos deputados de esquerda, sairia vitorioso. O discurso aos parlamentares deste campo político é o de que apoia as pautas econômicas do governo — votou a favor da reforma da Previdência, por exemplo —, mas que nunca se posicionou a favor de pautas de costumes associadas ao conservadorismo. Segundo um aliado, Lira diz nas conversas que não será “capacho de Bolsonaro”.

Em entrevista à GloboNews, ontem, Maia, sem citar o nome do líder do PP, disse que um presidente da Câmara alinhado ao presidente poderia, por exemplo, levar à votação a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que institui o voto impresso — Bolsonaro e apoiadores costumam citar, sem provas, riscos de fraudes nas urnas eletrônicas.

Com cerca de 130 deputados dos 513 da Câmara, a esquerda é considerada fiel da balança na disputa. Não há por ora, no entanto, garantia de que as legendas do campo caminharão juntas na eleição para a presidência da Casa. O PT, que tem a maior bancada entre todos os partidos, já se mostrou disposto a ouvir as propostas de Lira. Já o PDT não vê com bons olhos a candidatura do líder do PP e, mesmo mais próximo a Maia, também não se entusiasma por nomes do grupo do presidente da Câmara, casos de Baleia Rossi (MDB-SP) e Luciano Bivar (PSL-PE). O presidente do PSB, Carlos Siqueira, diz que não enxerga “viabilidade” em um nome de esquerda e deve seguir ao lado de um dos blocos com partidos de centro. O PSOL, que tem apenas dez deputados, já anunciou que vai lançar candidato na disputa.

Impedido pelo STF de tentar mais um mandato — seria o quarto, incluindo um “tampão” em 2016 —, Maia tem o desafio de encontrar em seu grupo um candidato a sucessor que consiga manter unida a heterodoxa base que lhe dá sustentação. O próprio presidente da Câmara citou ontem cinco deputados como possíveis candidatos de seu grupo: Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), Baleia Rossi (MDB-SP), Luciano Bivar (PSL-PE), Marcos Pereira (RepublicanosSP) e Elmar Nascimento (DEM-BA). Disse ainda que pode haver um “nome do PDT”, em um gesto para tentar manter os partidos de esquerda mais perto.

Maia argumentou que a maioria da Casa hoje tem alinhamento com a pauta econômica do governo, mas defendeu que é necessário que o próximo presidente tenha independência para evitar a imposição de temas que geram rejeição em parcelas expressivas da sociedade:

— Eu acho que, ao longo das próximas semanas, nós precisamos cuidar da pauta da Câmara e, sem dúvida nenhuma, na minha sucessão, nós precisamos fazer um candidato que garanta esse movimento firme, um movimento que garanta a Câmara dos Deputados livre de qualquer interferência de outro Poder — afirmou à GloboNews.

MESMO ADVOGADO DE JUIZ

Ontem, O GLOBO mostrou que o juiz do Tribunal de Justiça de Alagoas que absolveu Lira, na semana passada, da acusação de “rachadinha” no período em que foi deputado estadual em Alagoas já foi defendido pelo advogado do parlamentar no caso. Tanto Lira quanto o defensor negaram que tenham exercido influência sobre o magistrado. O deputado disse ainda que vai acionar o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) contra os promotores que atuam no processo, por considerar que eles vazaram informações.