O globo, n.31896, 04/12/2020. Economia, p. 26

 

Retomada à espera da vacina

Henrique Gomes Batista 

Ivan Martínez-Vargas

Gabriel Martins 

Raphaela Ribas 

04/12/2020

 

 

A velocidade na aplicação das vacinas contra a Covid-19 ditará o ritmo da recuperação econômica dos países. E, assim como o impacto da pandemia foi diferenciado entre as nações, uma imunização mais acelerada de uma população pode se tornar uma vantagem competitiva, afirmam especialistas. Mas uma segunda onda, como sinaliza o recente aumento de casos, preocupa.

— Vamos ter uma recuperação econômica no ritmo da vacinação. Este será um processo turbulento, reforçando diferenças criadas com a pandemia, que não foi hegemônica entre os países — afirmou Paulo Vicente, professor da Fundação Dom Cabral, que ainda considera cedo para dizer que países melhor conciliaram o combate à pandemia com a proteção da atividade econômica.

Ele ressalta a influência de diferenças na estrutura dos países, como maior peso do setor de serviços, assimilação do isolamento social e do uso de máscaras, situação fiscal, pacotes de socorro e projetos claros de recuperação:

— Acredito que somente em 2022 poderemos ter claramente quem se saiu melhor na pandemia.

LIMITE À PIORA DA CONFIANÇA

Os resultados da atividade no terceiro trimestre divulgados até o momento dão algumas pistas de como diferentes economias estão reagindo às medidas contra a Covid-19.

Adriano Laureno, economista sênior da Prospectiva Consultoria, ressalta que os países que adotaram uma maior proteção social tiveram movimentos menos bruscos na economia:

— O México e o Brasil estão na faixa de 820 mortos por milhão de habitantes. Porém, sem um pacote social, a economia do México, de acordo com os dados do terceiro trimestre, está cerca de nove pontos percentuais abaixo do PIB de antes da pandemia, enquanto o Brasil está cerca de quatro pontos abaixo — explicou, apontando a importância do auxílio emergencial.

O economista lembra ainda que salvar vidas não causou recessão:

— A Alemanha, que adotou fortes medidas restritivas no começo da pandemia, está quatro pontos percentuais abaixo de seu PIB de antes da pandemia, mesmo patamar dos Estados Unidos, que adotou medidas muito mais brandas — disse. —A Alemanha não teve um custo econômico significativo, mas teve um claro ganho humanitário.

Com relação a uma segunda onda, a economista-chefe do Credit Suisse, Solange Srour, destaca que o maior risco é que sejam adotadas restrições fortes de mobilidade:

— A diferença, neste momento, é que a possibilidade de termos uma vacinação ao longo do ano que vem coloca um limite na piora da confiança e no tamanho da possível desaceleração da economia.

Para Fernando Honorato, do Bradesco, o início do processo de vacinação será crítico para o PIB do primeiro trimestre de 2021 e para a retomada definitiva do setor de serviços, o principal da economia brasileira:

— Só com o início de uma campanha de vacinação em massa poderá haver maior absorção de um contingente de trabalhadores hoje desalentados no segmento dos serviços — disse Honorato, que também não vê impacto forte das novas medidas restritivas por causa da segunda onda.

SERVIÇOS, TALVEZ NO 2º TRI

Sobre o cronograma de vacinação, Honorato diz esperar que o início da imunização se dê já no início do ano:

—Parece mais um tema de disponibilidade da vacina do que de logística. As opções na mesa, a Coronavac e a vacina da AstraZeneca, são de armazenagem mais simples. O Brasil já tem um programa universal de vacinação que funciona bem.

Já Anna Reis, economistachefe da GAP, considera que, em comparação aos planos de imunização de países do Hemisfério Norte, como o Reino Unido, o Brasil ainda está atrasado:

— O Brasil apostou quase tudo em uma só vacina, em um só esquema de fabricação (transferência de tecnologia). Diante disso, pelo menos no primeiro momento, o Brasil pode ficar para trás. É difícil, porém, projetar o impacto deste quadro na economia.

Luka Barbosa, economista do Itaú Unibanco, considera que o auxílio emergencial e a vacina serão determinantes para o desempenho da economia nos próximos meses, especialmente do setor de serviços. Ele ressalta, porém, que a manutenção do auxílio, se faz o dinheiro circular, gera preocupação coma dívida pública.

—O setor de serviços só vai normalizar quando o problema passar, e isso só será coma vacinação em larga escala. Há um cenário-base que acredita que o setor será normalizado ano que vem, mas há o risco de ficar para o segundo trimestre de 2021.