Valor econômico, v. 21, n. 5159, 04/01/2021. Política, p. A6

 

Paes volta ao cargo com crise fiscal e um Rio de problemas

Cristian Klein

04/01/2021

 

 

No terceiro mandato, prefeito faz cortes para mitigar déficit e impacto econômico da pandemia
Num cenário muito diferente ao dos dois mandatos anteriores (2009-2016), em meio à pandemia e à escassez de recursos para honrar até as folhas de pagamento de dezembro e do 13º salário, Eduardo Paes (DEM) reassume a Prefeitura do Rio com desafios talvez mais espinhosos do que o de sediar uma Olimpíada. Longe da época de euforia e de gastos generosos, sua volta ao cargo foi marcada nos três primeiros dias por anúncios de um duro pacote de ajuste fiscal, um plano de combate à covid-19 com diretrizes para vacinação e propostas para mitigar as consequências socioeconômicas da longa quarentena.
A aprovação das primeiras medidas de Paes não deve encontrar resistência dos vereadores, entre os quais terá maioria e o controle da pauta. A cerimônia de posse na sexta-feira foi antecedida pela votação que pôs fim ao mais longo reinado de um presidente do Legislativo carioca, depois de 12 anos de comando de Jorge Felippe (DEM). O manda-chuva do Palácio Pedro Ernesto emplacou o herdeiro político, e agora deputado estadual licenciado, Jorge Felippe Neto (PSD), de 28 anos, como secretário municipal de Trabalho e Renda, mas cedeu a cadeira para um aliado de Paes e do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM): Carlo Caiado (DEM). Liderando uma chapa única para a Mesa Diretora, o parlamentar costurou uma frente que obteve 44 dos 51 votos.
Apenas o Psol, com sete vereadores (maior bancada, ao lado do DEM e do Republicanos do ex-prefeito Marcelo Crivella), e o PT, com três, devem fazer oposição sistemática a Paes. Nas contas da base aliada do prefeito, o apoio médio na Casa ficará em torno dos 60%.
Líder do governo na Câmara, Thiago Ribeiro (DEM) afirma que entre as prioridades da agenda está a aprovação do pacote que inclui reforma tributária, previdenciária e uma lei de emergência fiscal, com desindexação de contratos e desvinculação de receitas. De acordo com o secretário de Fazenda, Pedro Paulo, Crivella deixou um déficit de R$ 10 bilhões.

Segundo Ribeiro, uma comissão será criada nos próximos dias para debater e dar pontapé inicial ao novo plano diretor da cidade. Um dos objetivos é incentivar zonas de expansão econômica, como o eixo da degradada Avenida Brasil, área onde as obras do BRT Transbrasil - um dos corredores exclusivos para ônibus - deveriam ter sido concluídas em 2017. Em paralelo, há pressa para aprovação de um projeto de remodelação do Centro, para que os prédios comerciais da região sejam transformados em residências. O líder do governo afirma que a percepção é que boa parte das empresas, depois de adotarem o “home office” durante a pandemia, não retorne ao Centro, pelo menos enquanto a área não for revitalizada. “Hoje o Centro está abandonado. É chocante. Não se tem lugar nem para tomar um café. É preciso aprovarmos uma lei de transformação de uso dos grandes prédios comerciais em residenciais, ou pelo menos de uso misto”, defende.
Logo depois de derrotar Crivella, que tinha péssima relação com a Câmara e foi alvo de votação de cinco pedidos de impeachment, Paes afirmou que sua eleição representava a vitória da política. Na montagem do primeiro escalão, há nomes técnicos, como a economista Maína Celidonio (Transportes) e a engenheira e servidora municipal Kátia Souza (Infraestrutura), mas o prefeito prestigiou vereadores (três), deputados estaduais (três) e federais (dois), além de indicações político-partidárias (quatro) que somam metade dos 24 secretários - nove pastas a mais do que o antecessor. Para a presidência da empresa de turismo, a Riotur, epicentro do escândalo de corrupção que levou Crivella à prisão nos últimos dias de mandato, Paes escolheu a irmã gêmea do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), Daniela Maia, por intermédio de quem conheceu o pai deles, Cesar Maia (DEM), ex-prefeito por três mandatos e vereador reeleito que foi seu padrino político.
Como pilares da gestão estão o antigo braço-direito Pedro Paulo (DEM), derrotado na eleição de 2016, e o também deputado federal licenciado Marcelo Calero (Cidadania), que surge como uma espécie de “braço-esquerdo” de Paes. Calero é egresso do movimento RenovaBR, apoiado pelo presidenciável Luciano Huck e está à frente da Secretaria de Governo e Integridade Pública.

No plano político, Paes exerce seu tradicional equilibrismo ao buscar alinhamento com o governador em exercício Cláudio Castro (PSC) e aproximação com o presidente Jair Bolsonaro. Nos dois primeiros mandatos foi aliado do PT.. No dia 19, assinou termo de cooperação com o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), desafeto de Bolsonaro, para aquisição da vacina do Instituto Butantan, mas ontem reafirmou que a vacinação na cidade seguirá o Plano Nacional de Imunização, do Ministério da Saúde. “Queremos vacinar os cariocas, não importa de onde venha [o imunizante], se federal ou estadual", afirmou Calero ao Valor.