O Estado de São Paulo, n.46328, 20/08/2020. Metrópole, p.A19

 

Pela 1º vez desde abril, contágio diminui; média diária de mortes cai em agosto

Gonçao Junior

Roberta Jansen

Daniel Bramatti

20/08/2020

 

 

Primeiro registro de queda na contaminação pela covid-lQ, após 18 semanas, foi verificado pelo centro de controle de epidemias do Imperial College, de Londres; registro de vítimas fica abaixo de mil por uma semana, após superar esse patamar durante 1 mês inteiro

Pela primeira vez desde abril, o ritmo de transmissão da covid-19 está em desaceleração no Brasil, de acordo com dados desta semana do centro de controle de epidemias do Imperial College, de Londres, referência internacional no estudo da pandemia. O movimento ocorre no mesmo momento em que a média diária de mortes confirmadas por covid-19 completa sete dias abaixo de mil vítimas – patamar que havia sido superado por 31 dias consecutivos entre 3 de julho e 2 de agosto.

Conforme os dados do consórcio de veículos de imprensa formado por Estadão, G1, O Globo, Extra, Folha e UOL, a média móvel oscilou nos últimos dias entre 963 e 989 (ontem). já são 3.460.413 brasileiros com o novo coronavírus desde o começo da pandemia, 48.541 desses confirmados ontem. A média móvel de casos foi de 41.420 por dia nas últimas duas semanas. O balanço mais recente do Ministério da Saúde mostra ainda que 2.615.254 pessoas já se recuperaram do vírus. No total, 111.189 vidas foram perdidas.

De acordo com dados verificados desde domingo pelo Imperial College, a taxa de contágio (Rt) no País está em 0,98, número que indica para quantas pessoas um paciente infectado consegue transmitir o novo coronavírus. Na prática, o dado significa que 100 pessoas contaminadas contagiam outras 98 que, por sua vez, passam a doença para outras 96 e assim sucessivamente, o que comprova a desaceleração. O Chile é o único outro país da América Latina com taxa abaixo de 1 (0,85).

Em julho, o País apresentou taxas de 1,01, situação definida como "fora de controle". O Brasil deixa a zona vermelha pela primeira vez após 16 semanas. De acordo com o virologista Eduardo Flores, da Universidade Federal de Santa Maria (RS), a nova configuração indica estabilidade da pandemia e pode apontar um decréscimo lento. "O número 0,98 ainda não permite um grande otimismo. Mas existe uma leve tendência de decréscimo. Nas próximas semanas e meses, o número de casos e mortes deve cair."

Paulo Lotufo, epidemiologista da USP, faz uma analogia com uma partida de futebol. "É uma boa notícia. Mas estamos ganhando de 1 a 0 e ainda temos o segundo tempo para jogar", compara. Na mesma linha, Flavio Fonseca, virologista e pesquisador do Centro de Tecnologia em Vacinas (CT Vacinas), prefere aguardar mais algumas semanas. "É certamente uma boa notícia. Mas essa tendência precisa ser sustentada", diz o especialista da Federal de Minas Gerais (UFMG).

Alexandre Naime Barbosa, chefe da infectologia da Unesp, também é cauteloso. "Lógico que é notícia positiva, mas essa desaceleração pode ser apenas a descida de um platô. Precisamos de uma queda sustentada ladeira abaixo", compara.

Naime alerta para a necessidade da continuidade do uso do equipamentos de proteção individual e do isolamento social. "Uma coisa é flexibilizar, usando máscara, mantendo distanciamento social e higiene das mãos; outra coisa é fazer aglomeração, festa, reunião, abolindo completamente o uso de máscara. Na minha equipe de infectologistas da Unesp, que está trabalhando com covid há seis meses, nenhum médico se infectou. Sempre estamos protegidos", observou. "( Charles) Darwin já dizia: vence quem se adapta. Então, fazer reunião em bar, festa, aglomeração em locais em que ninguém está usando máscara não é flexibilização é uma irresponsabilidade que vai levar ao aumento do número de casos", alerta.

  

Mortes. Outros dados reforçam o momento de desaceleração. Esta também é a primeira vez nos últimos quatro meses em que o Brasil deixou a liderança no número de mortes semanais. Agora, o primeiro lugar está com a Índia, com 7,2 mil por semana – os EUA, líderes em casos, adotam uma metodologia diferente de cálculo por semana e não fazem parte do levantamento. Além disso, o Brasil deixou de ser o líder na relação de novos casos com o total população. Com 295 novos casos na quinzena por 100 mil habitantes, a Colômbia está na ponta entre os sul-americanos.

No entanto, cabe a ressalva de que, regionalmente, alguns Estados preocupam. O próprio Ministério da Saúde informou ontem que, por seus registros, 8 Estados (PR, SC, MT, RO, AM, TO, BA e PI), além do Distrito Federal, registraram mais mortes na semana que se encerrou em 15 de agosto sobre a anterior. O mesmo vale para a taxa de contágio, que retrata uma média nacional, sem abordar as particularidades de cada Estado ou região. "Existem regiões com alta de casos, como aqui, no Rio Grande do Sul. Nós temos várias pandemias", complementa Flores.

"Já poderíamos ter chegado a esse patamar ( de queda) em junho, se tivéssemos tido um esforço federal mais concentrado. Por outro lado, também poderíamos estar em situação muito pior, se não fossem esforços de Estados e municípios e o trabalho do SUS", avalia Lotufo. 

O risco internacional

Países como Espanha, Rússia e França já haviam conseguido reduzir os índices, mas registraram nova fase de aceleração. Na América do Sul, o mesmo aconteceu com Bolívia e Equador.