Título: Sem lei, 57 cidades podem sumir
Autor: Carneiro, Luiz Orlando
Fonte: Jornal do Brasil, 11/09/2008, País, p. A14

Senado entra em recesso de quatro semanas. Mesquita (RJ) é um dos municípios ameaçados.

BRASÍLIA

Os senadores desembarcam a partir de hoje para quatro semanas de recesso branco, mas deixaram suspensa a existência de 57 municípios - inclusive o de Mesquita (RJ), com 125.283 eleitores. Mesmo constando na pauta de votação, o projeto de lei 98/02, que estabelece novas regras para criação, incorporação, fusão ou desmembramento de municípios, não foi analisado. A proposta é importante porque também regulamenta a Emenda Constitucional 15, promulgada em 1996, que suspendeu a prerrogativa dos Estados tratarem da criação de novas cidades.

Pelo texto do projeto, os 57 atos de emancipação ocorridos entre 1996 e 2007 ficarão mantidos, desde que as prefeituras se encontrem no pleno gozo de sua autonomia municipal, com prefeitos, vice-prefeitos e vereadores eleitos e empossados. Mas o Congresso precisa ser rápido. Pela decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), de 9 de maio do ano passado, o Parlamento teria um prazo de 18 meses ¿ que termina em novembro ¿ para aprovar a lei complementar exigida pela EC nº 15, segundo a qual a criação de municípios deve ser feita por lei estadual, mas "dentro do período determinado por lei complementar federal".

A proposta ainda vai precisar do aval da Câmara. E ao que parecer, por lá, também não vai ser nada fácil. O presidente da Casa, Arlindo Chinaglia (PT-SP), reclamou, por meio de ofício, não ter sido formalmente informado do prazo fixado pelo tribunal e ensaiou um novo mal-estar entre Legislativo e Judiciário. O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, negou ontem que haja um "impasse" entre os poderes.

¿ O problema é do Congresso, que foi considerado omisso, no julgamento, pelo pelo plenário do STF, de ações de inconstitucionalidade, entre as quais uma da Assembléia Legislativa de Mato Grosso contra os presidentes da República e do Congresso, em maio do ano passado ¿ acrescentou Gilmar Mendes. ¿ Decidiu-se, então, manter por um prazo de dois anos, a vigência dessas leis estaduais de criação de municípios depois da EC nº15, em nome da segurança jurídica e do excepcional interesse social da questão. Mas até gora, o Legislativo continua em mora.

O presidente do Supremo disse ter explicado, anteontem, a Chinaglia que houve "uma pane burocrática" no tribunal, e que deveria ter enviado uma cópia da decisão do ano passado aos presidentes do Senado e da Câmara. E não apenas, como foi feito, ao presidente do Congresso, Garibaldi Alves, que preside também a Câmara Alta. De acordo com Mendes, o presidente da Câmara não lhe comunicou que ia ignorar a decisão do STF.

Em ofício do último dia 2, conforme reportagem publicada ontem pelo O Estado de S. Paulo, Chinaglia teria avisado ao ministro Gilmar Mendes que não pretende cumprir o prazo para votar a lei complementar. O ministro Gilmar Mendes ¿ que foi relator da ação de inconstitucionalidade da Assembléia de Mato Grosso, julgada em maio do ano passado ¿ ressaltou que o prazo dado pelo STF para que o Congresso aprovasse a lei complementar exigida pela EC nº 15/96 é "indicativo".

Na época, ele havia afirmando: "Não se trata de impor um prazo para a atuação legislativa do Congresso Nacional, mas apenas a fixação de um parâmetro temporal razoável, tendo em vista o prazo de 24 meses, também proposto por mim, para que as leis que criam ou alteram limites territoriais continuem em vigor, até que a lei complementar federal seja promulgada".