O globo, n. 31851, 20/10/2020. Sociedade, p. 12

 

Bolsonaro diz que vacina para covid não será obrigatória e ponto final

Daniel Gullino

Silvia Amorim

Victor Farias

20/10/2020

 

 

Presidente reage a fala do governador João Doria. que quer determinação legal favorável a imunização; ministro da Ciência usa gráfico comercial em anúncio sobre suposto novo remédio

 O presidente Jair Bolsonaro reiterou ontem que o governo não obrigará os brasileiros a tomar a vacina contra o novo coronavírus. Bolsonaro disse que esta decisão é do Executivo Federal, e que o ministro da Saúde, Eduardo Paz uel lo ““ já disse que esta vacina não será obrigatória e prazo ”.

—O Programa Nacional de Vacinação, incluindo vacinas obrigatórias, é 1975. Também gostaria de deixar bem claro que a OMS define que este é o Ministério da Saúde, e meu Ministro da Saúde já disse que esta vacina não será obrigatória e que é fim de tudo - disse ele.

A seguir, sem citar o nome, o presidente criticou um governador que, segundo ele, "se autodenomina o médico do Brasil", em referência a João Doria (PSDBSP). Segundo Bolsonaro, uma vacina precisará ter comprovação científica antes de ser validada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e oferecida gratuitamente na rede pública.

Na semana passada, Doria havia anunciado que, quando estiver disponível, a vacina contra a Covid - 19 será obrigatória em todo o estado e que levará “medidas judiciais” para quem não quiser receber o imunizante. A determinação não se aplica apenas a pessoas que apresentam um certificado médico.

O governador aposta na eficácia da vacina chinesa Coronavac, cujos testes clínicos mostrariam que seu índice de segurança é o mais alto de todos os imunizantes estudados no Brasil. De acordo com o Instituto Butantan, que realiza os testes, efeitos colaterais foram observados em 35% dos voluntários - nos demais produtos pesquisados ​​no país, esse valor, segundo ele, ultrapassa 70%.

As provas devem ser concluídas em novembro, e terão o resultado enviado à Anvisa, que deverá ser proferido em até 60 dias. O cronograma abalou os planos do governo paulista, que agora trabalha com a hipótese de que a imunização só estará disponível em janeiro - a expectativa inicial era que o processo fosse concluído ainda este ano.

Sanitarista da UFRJ, Ligia Bahia avalia que, embora a disputa retórica entre Bolsonaro e Doria não passe de um teatro político, há o risco de que afete a adesão aos programas de imunização.

- O debate sobre a obrigatoriedade da vacina acabou. A vacinação se consolidou há décadas com uma tecnologia extremamente eficaz e hoje existe um amplo repertório de vacinas que têm sido fundamentais para elevar a expectativa de vida em todos os países ”, destaca.

A epidemiologista Maria Amélia Veras, da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, afirma que o embate entre os governos federal e estadual é prejudicial.

- Politizar a questão da vacina é um dos maiores serviços que as autoridades podem fazer à saúde da população - afirma o médico. - Quem deve se pronunciar sobre a vacina é quem está testando e produzindo.

Na busca pela cura do coronavírus, o governo federal anunciou ontem que provou que o vermífugo nitazoxanida reduz a carga viral de pacientes infectados se for utilizado nos primeiros dias de sintomas. O ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marcos Pontes, apresentou o remédio em um vídeo ao lado do Bolsonaro, sem dar detalhes dos resultados do teste clínico. O gráfico de barras sem legenda não foi retirado de artigo científico. Era uma ilustração genérica distribuída pelo Shutterstock Image Bank, amplamente utilizada por agências de publicidade. A peça pode ser adquirida para uso em alta resolução por $ 75.