O Estado de São Paulo, n.46325, 17/08/2020. Política, p.A6

 

PF vê inconsistências em delação de Palocci contra Lula e Mantega

Pepita Ortega

Fausto Macedo

17/08/2020

 

 

Relatório de delegado afirma que informações prestadas por ex-ministro no caso BTG parecem ter sido achadas na internet

Prisão. Antonio Palocci escoltado por policiais em 2016

Relatório da Polícia Federal (PF) sobre delação do ex-ministro Antonio Palocci, concluído na semana passada, questiona a qualidade e a veracidade das informações prestadas por ele a respeito do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O delegado de PF Marcelo Feres Daher concluiu na última terça-feira relatório de um dos inquéritos abertos a partir da delação de Palocci, que foi ministro da Fazenda no governo Lula e da Casa Civil na gestão de Dilma Rousseff, envolvendo suposta ocultação de valores atribuídos ao ex-presidente em contas no Banco BTG Pactual. No documento enviado ao Ministério Público Federal, Daher afirmou que as afirmações feitas pelo delator "foram desmentidas por todas testemunhas, declarantes e por outros colaboradores da Justiça" e "parecem todas terem sido encontradas em pesquisas na internet, porquanto baseadas em dados públicos, sem acréscimo de elementos de corroboração, a não ser notícias de jornais".

O delegado acrescentou: "No presente caso, as notícias jornalísticas, embora suficientes para iniciar o inquérito policial, parece que não foram corroboradas pelas provas produzidas, no sentido de dar continuidade a persecução penal".

As informações sobre o relatório da PF que esvazia o impacto da delação de Palocci foram divulgadas pela revista eletrônica Consultor Jurídico (Conjur). O Estadão também obteve cópia do documento subscrito por Marcelo Feres Daher.

Fundo. A investigação envolvia o anexo 10 da delação de Palocci, na qual o ex-ministro afirma que, a partir de fevereiro de 2011, o banqueiro André Santos Esteves "teria passado a ser o responsável por movimentar e ocultar valores supostamente recebidos por Lula, a título de corrupção e caixa dois, em contas bancárias abertas e mantidas no Banco BTG Pactual, em nome de terceiros".

Palloci alegou ainda que havia suposto esquema de vazamento de informações privilegiadas sobre reuniões do Copom (Conselho de Política Monetária) e alterações da taxa básica de juros, a Selic, envolvendo André Esteves e o ex-ministro Guido Mantega (Fazenda). Segundo o delator, o banqueiro teria realizado "diversas operações no mercado financeiro, obtendo lucros muito acima da média dos outros operadores financeiros". Os lucros viriam Fundo Bintang, administrado pelo BTG Pactual.

No entanto, a PF concluiu que "não foi confirmada a hipótese inicial de existência de relação entre André Esteves e o fundo Bintang – que tinha como gestor Marcelo Lustosa –, ou mesmo de ingerência do BTG na gestão desse fundo de investimento".

O relatório afirma que "as análises técnicas dos documentos e dados apreendidos afastaram a hipótese de uso de informações privilegiadas na gestão do fundo Bintang nas vésperas de decisões do Copom". Segundo o delegado, não se observou relacionamentos entre "as pessoas que detinham a informação (sobre o Copom) e a pessoa de Marcelo Lustosa".

Palocci foi preso em setembro de 2016, na Operação Omertà, desdobramento da Lava Jato. Condenado pelo então juiz federal Sérgio Moro a doze anos e dois meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, e acuado por outras investigações da Lava Jato, Palocci fechou acordo de delação premiada com a Polícia Federal no Paraná – a força tarefa do Ministério Público Federal em Curitiba se opôs ao acordo.

O Estadão não conseguiu contato com a defesa do ex-ministro.

Conclusão

"Quanto aos fatos delatados por Antonio Palocci, foram desmentidos por todas as testemunhas e por outros colaboradores da Justiça."

Marcelo Daher

DELEGADO DA POLÍCIA FEDERAL