O Estado de São Paulo, n.46306, 29/07/2020. Política, p.A10

 

Câmara vai ao STF para vetar buscas em gabinetes

Rafael Morares Moura

29/07/2020

 

 

Casa contesta ofensiva de policiais federais e quer impedir ações dentro do Congresso

Mandado. Policiais deixam gabinete do deputado Paulinho da Força, alvo de operação

A Câmara dos Deputados acionou o Supremo Tribunal Federal (STF) contra as operações de busca e apreensão nos gabinetes dos deputados federais Rejane Dias (PT-PI) – primeira-dama do Piauí – e Paulinho da Força (Solidariedade-sp), ocorridas neste mês. Ao contestar a ofensiva de policiais federais no Congresso, a Câmara quer, na prática, impedir que juízes da primeira instância sigam determinando operações de busca e apreensão em gabinetes de parlamentares.

A Câmara pede que seja firmado o entendimento de que cabe apenas ao STF determinar medidas cautelares contra parlamentares que possam afetar ou restringir o exercício do mandato. E solicitou que todo o material apreendido pela Polícia Federal nas investigações dos dois parlamentares seja encaminhado ao Supremo.

Líderes do Centrão pressionaram o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a recorrer ao Supremo para impedir buscas e apreensões da PF em dependências da Casa, conforme informou o Estadão na semana passada. A cobrança aumentou depois que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), conseguiu suspender a diligência da PF, na terça-feira retrasada, no gabinete do senador José Serra (PSDB-SP).

No caso de Serra, o presidente do STF, Dias Toffoli, barrou a operação no gabinete do tucano, determinada pela Justiça Eleitoral, apontando o risco de as provas colhidas na investigação, como dados armazenados em computadores, incluírem objetos ligados ao exercício do atual mandato.

O STF já decidiu que o foro só vale para crimes cometidos no exercício do mandato e em função do cargo, o que fez centenas de processos contra políticos serem encaminhados para instâncias inferiores, mas permanecem lacunas deixadas pelo próprio tribunal, como a imposição de medidas cautelares contra os parlamentares nessas investigações.

As defesas dos parlamentares têm apontado que, ainda que muitas apurações envolvam atos cometidos em mandatos anteriores, as operações da PF podem atingir os atuais gabinetes e comprometer o exercício do novo cargo.

Há duas semanas, agentes da PF não encontraram problemas para cumprir mandados no gabinete do deputado Paulinho da Força. Na ocasião, a operação foi determinada pela Justiça Eleitoral de São Paulo, a mesma que ordenou as buscas no gabinete de Serra.

Já a ofensiva contra Rejane Dias, que teve o aval da ministra Rosa Weber, do STF, investiga suspeita de desvios de recursos da Educação no Estado, e a operação foi determinada por um juiz de primeira instância. Consultada em razão do envolvimento da deputada, Rosa entendeu que o juiz deveria tocar o caso, já que os fatos sob apuração se deram quando Rejane era secretária de Educação do Piauí (entre 2015 a 2018), ou seja, antes de exercer o atual mandato.

"As diligências somente demandarão pronunciamento do tribunal naquelas hipóteses em que seja ele o juiz natural para a ação penal que venha a ser aforada para o processamento e julgamento dos mesmos fatos", escreveu Rosa na decisão.

Integrantes do Ministério Público Federal ouvidos pelo Estadão avaliam que as operações no Congresso são importantes para a busca de e-mails e documentos que podem subsidiar investigações em curso.

No ano passado, por exemplo, a PF informou que apreendeu no gabinete do deputado federal Fernando Coelho Filho (DEM-PE) "envelopes bancários e extratos apontando a utilização da técnica de lavagem de dinheiro denominada 'smurfing', que é utilizada para, em tese, realizar a dissimulação dos valores depositados".

Foro. Um dos pontos levantados pela Câmara é que há parlamentares que são conhecidos por denunciar crimes praticados por milícias e grupos de extermínio ou irregularidades praticadas no Judiciário. Esses parlamentares, afirma a Casa, recebem informações e fazem anotações, e uma eventual operação nos gabinetes poderia colocar em risco o exercício do mandato e também a segurança dos autores de denúncias.

"É comum o uso do gabinete parlamentar e da própria residência por parlamentares para a realização de reuniões com finalidade política. A busca e apreensão coloca em potencial perigo o pleno exercício do mandato", frisa a Câmara. Na avaliação da Casa, não se trata de reconhecer a prerrogativa do foro privilegiado em função do local, e sim a "garantia de pleno exercício do mandato popular".

"Cautelares voltadas ao afastamento do cargo ou ao acesso a documentos potencialmente relacionados ao exercício do mandato são capazes de afetar a independência do Poder Legislativo. Tais medidas afetam o desempenho da atividade parlamentar", afirma a Casa.

'Perigo'

"É comum o uso do gabinete para a realização de reuniões com finalidade política. A busca e apreensão, desse modo, coloca em potencial perigo o pleno exercício do mandato."

Câmara dos Deputados

EM AÇÃO ENVIADA AO STF