O Estado de São Paulo, n.46304, 27/07/2020. Política, p.A8

 

Rede pede apuração sobre dossiê contra 'antifascistas'

Paulo Roberto Netto

27/07/2020

 

 

Elaborado por secretaria do Ministério da Justiça, relatório lista nome de 579 servidores, entre policiais e professores

A Rede Sustentabilidade pediu ao Supremo Tribunal Federal que determine a abertura de inquérito na Polícia Federal para investigar dossiê elaborado pela Secretaria de Operações Integradas (Seopi), do Ministério da Justiça e Segurança Pública, contra 579 servidores federais e estaduais identificados como "antifascistas". A pasta é comandada por André Mendonça, que deixou a Advocacia-geral da União para substituir o ex-ministro Sérgio Moro.

"O que se vê é um aparelhamento estatal em prol de perseguições políticas e ideológicas a partir de uma bússola cujo norte é o governante de plantão: quem dele discorda merece ser secretamente investigado e ter sua imagem exposta em dossiês 'da vergonha' perante suas instituições laborais", diz a Rede.

"O Ministério da Justiça não parece ter a mesma vontade de produzir atividades de inteligência contra servidores do Palácio do Planalto, que, ao que tudo indica – inclusive com investigações em curso neste STF – integram organização criminosa de disseminação de fake news que atacam os poderes Legislativo e Judiciário", continuou o partido. "O Brasil, infelizmente, ainda não superou por completo o traço autoritário e ditatorial de limitações indevidas à ampla liberdade de expressão".

O relatório de inteligência sigiloso foi revelado pelo colunista Rubens Valente, do UOL, e confirmado pelo Estadão. Na lista de investigados estão servidores da área da segurança, como policiais, e professores.

A Seopi foi criada durante a gestão de Moro na Justiça para integrar operações policiais contra o crime organizado e redes de pedofilia, tendo coordenado a transferência de líderes do PCC para presídios federais no ano passado e atuado em fases da Operação Luz na Infância, contra a pedofilia.

As atribuições da secretaria, no entanto, mudaram após Mendonça assumir a pasta, em abril. O ministro nomeou um delegado da Polícia Civil do Distrito Federal para comandar a Seopi e, um mês depois, solicitou investigação completa de movimentos que poderiam colocar em risco a "estabilidade política" do governo.

OEA. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão da Organização dos Estados Americanos (OEA), também criticou ontem a investigação de servidores "antifascistas". Em nota, a comissão pede ao Brasil que "siga respeitando o direito à liberdade de expressão de servidores públicos e acadêmicos; além de revisar essas denúncias e investigar se houve vigilância ilegal pelas agências de inteligência do Estado".

O Ministério da Justiça e Segurança Pública não quis comentar o caso específico do dossiê. Em nota ao Estadão, a pasta informou apenas que as atividades de inteligência visam "identificar, avaliar e acompanhar ameaças potenciais ou reais".