Título: 50 mil caem no golpe do concurso
Autor: Domingues, Larissa; Pacheco, Lorena
Fonte: Correio Braziliense, 23/03/2013, Economia, p. 10

O suspeito concurso do Instituto Científico Educacional de Assistência aos Municípios (Iceam.gov) pode ter feito mais de 50 mil vítimas. Esse é número de pessoas que já se inscreveram para participar da seleção, segundo Evilásio Rosa, funcionário da área técnica da Fundação da Solidariedade (Fundaso), a empresa que se apresenta como organizadora do certame. Os incautos pagaram entre R$ 60 e R$ 100, o que resultou em faturamento de até R$ 5 milhões aos possíveis golpistas. Como o Correio antecipou ontem, o Ministério Público Federal no Distrito Federal (MPF-DF) está investigando o concurso criminal e civilmente por suposto estelionato. A Polícia Federal já foi acionada para identificar os responsáveis pelas irregularidades. O clima é de tensão entre os concurseiros. A estagiária do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Kate Hellen Valentim da Costa, 25 anos, contou que, na semana passada, procurou a Fundaso para saber melhor o que era o Iceam.gov . Ela ouviu que se tratava de “um órgão ligado diretamente ao governo federal, mas não mantinha vínculos com nenhum ministério” . Anteontem, quando as inscrições para o certame foram reabertas, Hellen garantiu a sua participação , mas foi surpreendida com a notícia de que o emprego dos sonhos poderia ser um engodo. A jovem disse que entrará em contato com a operadora do sistema de pagamento para tentar o ressarcimento.

“Quando fiquei sabendo que o órgão pode não existir, tive muita raiva por ter sido enganada. Mas v ou buscar meu dinheiro de volta” , afirmou. Por sorte, ela não expôs seus dados bancários e pessoais, nem forneceu o número de cartão de crédito, pois fez o pagamento por meio de boleto do PagSeguro. Da mesma for ma que o concurso é suspeito de ser uma fraude, há o r isco de os responsáveis pelo certame fantasma avançarem sobre as finanças dos inscritos. A estudante Gabriela Lopes Coelho, 24, também quer o dinheiro da inscrição de volta. Ela se candidatou para um cargo de nível médio e pagou por meio de cartão de crédito. Agora, terá de lidar com uma dor de cabeça com a qual não contava. “ A gente já se preocupa em estudar e cumprir o edital. Da noite para o dia, estou sendo obrigada a tomar providências para não pagar pelo que não existe” , reclamou. Preocupada com o acesso de possíveis golpistas a seus dados, ela cogita fazer ocorrência policial caso seja confirmada a fraude do certame.

Defesa

Apesar das suspeitas do Ministério Público de que o concurso para o Iceam.gov seja um estelionato, Evilásio Rosa, da Fundaso, disse que tudo está dentro da lei. Ele ressaltou que, nos últimos dias, 15 candidatos pediram o reembolso da taxa de inscrição , alegando falta de credibilidade e ausência de clareza nas informações das duas instituições. Ao ser questionado sobre a ação do MPF-DF , defendeu a idoneidade da banca e do Iceam.gov . “ A Fundaso existe há 21 anos. Começou a atuar na área de concursos públicos em 2010. Nunca existiu e não existe nada que venha a macular o nome da organizadora em se tratando de fraudes, calotes. O Iceam.gov não é um órgão público e, sim, uma instituição de parceria público-privada. Esse é o primeiro concurso para expansão do instituto em todas as capitais” , disse Rosa. Ele assinalou ainda que o Iceam.gov deve se instalar no Distrito Federal na próxima terça-feira. A sede, explicou, será no Edifício Rádio Center, na Asa Norte, o que a administração do local nega. O celular do presidente da Fundaso, Samuel Pereira está fora de área desde ontem. Na opinião de Luciana Mamede, funcionária comissionada no Poder Executivo, ousadia é a palavra que define a ação dos possíveis envolvidos na fraude.

Mas, por sorte, escapou do possível golpe. Ela contou que quase pleiteou uma das vagas no concurso do Iceam.gov, mas mudou de ideia ao não encontrar informações consistentes no edital e na internet. “ Acho que eles acreditaram que passariam despercebidos pelos concurseiros e pelo Ministério Público. Confiaram na impunidade ” , assinalou. Diante de casos como o do Iceam.gov , a dica da diretora executiva da Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos (Anpac), Mar ia Thereza Sombra, é verificar a origem dos órgãos que abrem seleção pública. “É muito importante confirmar se o órgão que está anunciando processo seletivo é realmente um ente governamental” , aconselhou. Em caso de dúvida, o candidato deve procurar o Ministério Público. “Recebo pelo menos 50 denúncias por dia de possíveis irregularidades, e a recomendação é buscar os órgãos competentes para o registro das suspeitas” , frisou.