Correio braziliense, n. 20962, 14/10/2020. Política, p. 4

 

Vírus e a polarização política

Natália Bosco 

14/10/2020

 

 

A pesquisa A comunicação no enfrentamento à covid-19, liderada pelo Centro de Pesquisa em Comunicação Política e Saúde Pública da Universidade de Brasília (CPS/UnB), analisou como a polarização política no Brasil explica as diferenças de comportamento dos brasileiros em meio à pandemia. O estudo entrevistou 2.771 pessoas — entre 23 de setembro e 2 de outubro — de diferentes gêneros, idades, regiões geográficas e classes sociais.

De acordo com a publicação, opositores do governo “estão mais preocupados com a pandemia, sabem mais sobre a doença e têm maior intenção de se vacinar quando uma droga estiver disponível para a população”, diz trecho. Em contrapartida, os apoiadores da gestão do presidente Jair Bolsonaro estão menos preocupados, sabem menos e também têm menor intenção de se imunizar.

Wladimir Gramacho, coordenador do CPS, disse que os dados obtidos mostram que renda e escolaridade afetam a forma como as pessoas consomem informação, mas explicitam, também, a participação da política na desinformação. “A gente descobriu, a partir dos dados, que, no Brasil, esses grupos menos informados, por um lado, reproduzem, sim, a desigualdade brasileira com relação, sobretudo, à educação e à renda. Mas também que a posição política ou a avaliação do governo é um fator muito associado ou à informação, de um lado, ou à desinformação, de outro.”

No processo de entrevistas, os participantes foram divididos em três grupos: os que consideram o desempenho do governo como “ótimo” ou “bom”, um total de 35,2%; os que consideram como “regular”, 21,6%; e os que consideram como “ruim” ou “péssimo”, formando 43,2%.

Os três grupos apresentaram diferentes comportamentos em relação à pandemia. Do segmento mais crítico ao governo, apenas 1,4% não estava nada preocupado com a doença. Já entre aqueles que estão satisfeitos com a atual administração, 8,7% não estavam preparados para o combate à doença.

Entre os muito preocupados com a pandemia, 44,8% faziam parte do grupo insatisfeito com o governo, e apenas 21% eram de simpatizantes.

O estudo mostra, ainda, que, em relação a três recomendações básicas de prevenção e contenção da doença (distanciamento social, uso de máscara e higiene das mãos), os apoiadores do governo não se incomodam em ir a lugares onde há muita gente, têm evitado o uso de máscaras e não mudaram tanto a frequência com que lavam as mãos, em relação aos brasileiros que avaliam mal o governo.

“O que a gente vê aqui no Brasil, como nos Estados Unidos, é que a política e a polarização política se reproduziram de forma muito semelhante e muito perigosa no caso do enfrentamento à pandemia”, disse Gramacho. Ele contou que uma segunda etapa da pesquisa será realizada após as campanhas para as eleições municipais, que ocorrem em novembro deste ano.

Quando questionados sobre a intenção de vacinação contra o novo coronavírus, a pesquisa aponta como “estatisticamente significativos” os níveis de diferença das respostas entre os apoiadores e não apoiadores do governo: 8,1% daqueles que simpatizam com o Executivo disseram que não têm nenhuma chance de se vacinarem, e 54,5% desse grupo disseram que vão buscar a vacina.

Já no segmento que avalia negativamente a atuação do governo, 1,7% disse que não tem nenhuma chance de se vacinar, e 79,2% têm muita chance de se imunizar.

A pesquisa é realizada em parceria com pesquisadores da Universidade Federal de Goiás (UFG), da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e da Western University (Canadá).

*Estagiária sob a supervisão e Cida Barbosa