Valor econômico, v. 21, n. 5128, 16/11/2020. Internacional, p. A23

 

Presidente do Peru renuncia e acirra crise política e econômica

Marsílea Gombata

16/11/2020

 

 

Merino havia tomado posse na terça-feira, após o Congresso votar a favor do impeachment do então presidente Martín Vizcarra, acusado de ter recebido propina

O presidente interino do Peru, Manuel Merino, renunciou ao cargo ontem, cinco dias depois de tomar posse. Merino deixou a Presidência depois de uma madrugada de intensos protestos contra seu governo, nos quais dois morreram. Sua saída acirra a crise política na qual o Peru está mergulhado e traz incerteza à recuperação da economia no curto prazo e ao investimento no médio prazo.

Em discurso televisionado ontem, Merino anunciou sua renúncia e disse que seu gabinete permanecerá no cargo até que um novo líder assuma, para evitar um vácuo de poder.

Até o fechamento desta edição, o Congresso estava reunido para escolher um dos 130 parlamentares para liderar um novo governo interino. Este ficaria no poder até julho de 2021, quando um presidente eleito deve tomar posse.

Merino havia assumido na terça-feira, após o Congresso votar a favor do impeachment do então presidente Martín Vizcarra, acusado de ter recebido US$ 630 mil em propina quando era governador.

O afastamento de Vizcarra desencadeou a maior onda de manifestações no Peru em duas décadas. Na madrugada de sábado para domingo, duas pessoas morreram e 100 ficaram feridas em protestos contra o governo de Merino.

A renúncia de ontem agrava a crise política do Peru a cinco meses das eleições presidenciais e joga ainda mais incerteza ao processo de recuperação da economia no curto prazo. O país foi um dos mais atingidos pela pandemia na América do Sul e teve contração de 30% no segundo trimestre.

"A saída de Merino mostra que o Peru atravessa um dos piores períodos de instabilidade de sua história", afirma Fernando Rospigliosi, diretor da FRC Consultores, em Lima. "Neste momento, a única certeza que temos é que haverá eleições gerais em abril."

Na semana passada, o afastamento de Vizcarra e a posse de Merino levaram pessimismo aos mercados. A moeda peruana, o sol, atingiu seu patamar mais baixo em relação ao dólar em 18 anos. Bônus peruanos caíram para o menor nível em cinco meses.

Um dos gestos que trouxe relativo otimismo dias depois foi a nomeação de José Arista, que trabalhava no Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF) e havia sido vice-ministro no governo do ex-presidente Alan García, para o Ministério de Economia. "Mas, ao sair Merino, sai também o seu ministro e isso volta a trazer grande incerteza", afirma Nicolás Urrutia, da consultoria Control Risks.

Para Rospigliosi, a turbulência política deve pesar negativamente para a economia no médio prazo. "Ninguém vai voltar a investir no Peru, pelo menos até que haja um novo governo que mostre que pode governar e não está sujeito à pressão popular", diz.

Em nota a clientes, a economista Pamela Ramos, da consultoria Oxford Economics, alertou que a incerteza política pode retardar a aprovação de mais estímulos fiscais, o que dificultaria ainda mais a retomada econômica do Peru.