Valor econômico, v. 21, n. 5127, 13/11/2020. Política, p. A17

 

Apagão em Macapá prejudica plano político da família Alcolumbre no AP

Vandson Lima

Renan Truffi

13/11/2020

 

 

Protestos da população aumentam caos na cidade

De uma eleição que parecia relativamente fácil e que iniciaria o domínio dos Alcolumbre no Amapá, a disputa na capital Macapá se tornou um problema gigantesco para o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM) e seu grupo político.

O apagão que já dura dez dias criou uma situação caótica no Estado. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) adiou a eleição na capital - que ainda não tem nova data para ocorrer. Outros 12 dos 16 municípios também permanecem com problemas de abastecimento de energia, mas mantém a previsão de eleições domingo.

Josiel Alcolumbre (DEM), irmão do presidente do Senado e apoiado pelas principais forças políticas locais - do atual prefeito de Macapá, Clécio Luis (sem partido) ao governador Waldez Goes (PDT) -, não teve como se desvincular do episódio e viu seus índices de intenção de voto derreterem: caiu de 31% para 22% das intenções de voto entre o antes e o depois do apagão, enquanto os adversários Patrícia Ferraz (Podemos) e Doutor Furlan (Cidadania) subiram, ambos de 11% para 15% cada. O ex-governador João Capiberibe (PSB) também perdeu apoiadores, de 15% para 11%.

Principal articulador da campanha do irmão, Davi Alcolumbre tenta usar seu poder de influência junto ao governo do presidente Jair Bolsonaro, seu aliado, para reverter a situação. Ele cobrou que alguma autoridade seja responsabilizada pelo blecaute e que o auxílio-emergencial seja estendido no Estado - tentando replicar a estratégia que o próprio Bolsonaro usou para reconquistar popularidade em pandemia.

“A população está sofrendo e precisa de ajuda e de respostas efetivas. Solicitei ao presidente Bolsonaro e ao ministro da Economia Paulo Guedes que o auxílio emergencial seja prorrogado no Amapá. A situação aqui é dramática. Os amapaenses perderam a comida de um mês, tudo estragou nas geladeiras. As pessoas estão sofrendo. É dever do Estado socorrê-las”, escreveu Alcolumbre em uma rede social. Em entrevista à rádio Diário FM, o senador chegou a dizer que “o maior prejudicado com o apagão” foi Josiel, “que ia ganhar a eleição no primeiro turno”, previu.

A vida da população, contudo, parece mais complicada que a situação do irmão do senador. Os relatos, que se espalharam em vídeos publicados pelos poucos ainda com acesso à internet, dão conta da falta de produtos básicos no comércio, garrafas de 1 litro de água mineral sendo vendidas a R$ 35 e pessoas coletando água nos mesmos rios onde o esgoto é despejado. A assessoria do presidente do Senado divulgou que Alcolumbre solicitou investigação à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal sobre as causas do incêndio na subestação de energia que provocou o apagão, já que um laudo preliminar da Polícia Civil informa que aparentemente não foi um raio que causou o acidente, contrariando todas as informações anteriores. Pessoas ligadas a Alcolumbre levantam até a hipótese de sabotagem com fins eleitorais.

A Bolsonaro e ao ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, Alcolumbre disse que o episódio “não será esquecido” e que algum agente precisa ser “exemplarmente punido”. Na avaliação do entorno dele, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) tem responsabilidade no episódio assim como a empresa que detém as linhas de transmissão do Amapá, a Gemini Energy. “Alguém precisa pagar por isso, precisa ser afastado do seu cargo, seja da diretoria da Aneel ou da diretoria da empresa envolvida. Não vai ser esquecido o que aconteceu com o Amapá”, disse um aliado próximo. Apesar das cobranças por uma responsabilização, toda a diretoria da Aneel tem mandato e não pode ser demitida do cargo.

Os opositores conseguiram se aproveitar do momento para emplacar a tese de que foi um “apagão do DEM” ou da família Alcolumbre, que teriam colocado seus cabos eleitorais nas ruas para incentivar os motins e protestos - na versão do senador e seus aliados. O adiamento da eleição não foi algo ruim para a família Alcolumbre. Dentro da campanha de Josiel há a avaliação de que as equipes dos candidatos adversários vinham estimulando seus militantes a puxarem um movimento pelo voto nulo.

Alcolumbre conta com a eleição de Josiel em sua estratégia para tomar conta da política no Amapá. Ele conseguiu trazer para o seu lado o bem avaliado prefeito Clécio Luis, que era um aliado do senador Randolfe Rodrigues (Rede), sob a promessa de apoiá-lo como candidato ao governo em 2022.

Em troca, Clécio ajudaria a eleger à sua sucessão Josiel, um empresário e jornalista sem experiência nas urnas. O Valor tentou, durante dois dias, falar com o candidato, mas ele não respondeu aos pedidos de entrevista. Em seus canais, ele pouco se pronuncia sobre a crise, preferindo replicar mensagens que mostram a atuação do irmão.