Valor econômico, v. 21, n. 5123, 09/11/2020. Política, p. A13

 

Ministros mergulham nas campanhas

Andrea Jubé

09/11/2020

 

 

Tereza Cristina, Onyx, Damares e Tarcísio participam do processo eleitoral, incentivados por Bolsonaro

O presidente Jair Bolsonaro recomendou aos ministros que não se envolvessem nas eleições municipais, mas, na reta final da campanha, vários auxiliares descumpriram essa orientação para divulgar manifestações de apoio aos seus candidatos. O próprio Bolsonaro recuou de sua posição inicial e anunciou que tranformará suas “lives” semanais em “horário eleitoral”.

Os ministros de perfil político são os mais requisitados para participações nas campanhas, como as ministras da Agricultura, Tereza Cristina (DEM), da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, e o ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni (DEM). O ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, gravou uma participação discreta para a campanha ao Senado em Mato Grosso.

A Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência confirmou ao Valor que a orientação inicial de Bolsonaro era para que os ministros não participassem da campanha municipal. Essa determinação seguia o objetivo inicial de Bolsonaro de se manter afastado do pleito municipal. No dia 28 de agosto, ele publicou em suas redes sociais: “Decidi não participar, no 1º turno, nas eleições para prefeitos em todo o Brasil. Tenho muito trabalho na presidência e, tal atividade, tomaria todo meu tempo num momento de pandemia e retomada da nossa economia”.

Mas dois meses depois, num gesto explícito de recuo, o presidente transformou suas transmissões ao vivo pela internet em palanques eletrônicos, reservando minutos para declarar apoio e pedir votos em seus candidatos. No sábado, avisou que fará transmissões diárias, a partir de hoje, para pedir votos até a eleição.

Num episódio pitoresco, no dia 29, depois de pedir votos para quatro vereadores, ele voltou-se para a ministra Tereza Cristina, que participava como convidada da transmissão, e ofereceu o espaço para que ela declarasse apoio a algum postulante à Câmara Municipal de Campo Grande, sua base eleitoral. Surpreendida, a ministra citou “Edilaine, cabra da peste, mulher”, e sua correligionária.

O próprio presidente, portanto, deu a deixa para a violação da diretriz inicial. Cerca de uma semana antes da “live” com Bolsonaro, Tereza Cristina já aparecia nas redes sociais em vídeo pedindo votos para o prefeito de Campo Grande, Marcos Trad, que busca a reeleição.

Da sede do DEM, seu partido, a ministra fez uma sessão de gravação de vídeos respaldando vários candidatos a prefeitos em Mato Grosso do Sul, sua base eleitoral. Pré-candidata ao governo do Estado em 2022, as manifestações de apoio não se restringem a postulantes do DEM.

Trad é do PSD, e o DEM integra a coligação. Ela também endossou a campanha de Enelvo Felini, do PSDB, que disputa a prefeitura de Sidrolândia. Em outro vídeo, pede votos para José Paulo Paleari, que tenta se eleger prefeito de Nova Alvorada do Sul. Paleari é filiado ao DEM.

Por meio de sua assessoria, a ministra afirmou que o seu apoio à campanha de Marcos Trad “representa um movimento de fortalecimento ao partido ao qual ela é filiada, o Democratas (DEM), nas eleições municipais”. O DEM integra a coligação de apoio a Trad.

A ministra acrescenta que, sendo deputada federal licenciada, “é natural o apoio a candidaturas em seu Estado natal, relacionadas à sua sigla de filiação”.

Também deputado federal licenciado, correligionário de Tereza Cristina, o ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, gravou vídeos de apoio para candidatos no Rio Grande do Sul, sua base eleitoral. Assim como Tereza, Onyx é pré-candidato ao governo do Estado em 2022.

Onyx apareceu no horário eleitoral do candidato a prefeito de Caxias do Sul, Vinícius Ribeiro, que é filiado ao DEM. O ministro afirma que se Ribeiro for eleito, terá as “portas abertas” no governo Bolsonaro.

Onyx também pediu votos para postulantes do DEM fora de seu reduto eleitoral. O titular da Cidadania manifestou apoio à candidatura de Raoni Mendes, do Democratas, à prefeitura de João Pessoa, na Paraíba.

No dia 29 de setembro, em uma agenda na capital paraibana, Onyx afirmou que, se for eleito, Raoni aplicará em João Pessoa as mesmas premissas do governo Bolsonaro que é “servir à população”.

A ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, que acompanhava Onyx na agenda em João Pessoa, também declarou seu apoio à candidatura de Raoni Mendes.

As manifestações de Onyx e Damares ao postulante do DEM em João Pessoa ocorreram antes do recuo de Bolsonaro na regra de distanciamento da eleição municipal. Procurados por meio de suas assessorias, Onyx e Damares não quiseram se manifestar.

Um dos mais concorridos do governo, o ministro Tarcísio de Freitas fez uma declaração de apoio velada ao senador interino Carlos Fávaro (PSD), que busca um mandato efetivo na eleição ao Senado em Mato Grosso. O pleito elegerá o substituto da senadora cassada Selma Arruda.

“Desejo muitas vitórias e que a sua trajetória de homem público continue abençoada, você que sempre nos ajudou, que continue fazendo a diferença para o Mato Grosso e para o país”, diz Tarcísio ao cumprimentar Fávaro pelo aniversário, no último dia 19. O vídeo está circulando amplamente nas redes de Fávaro.

Antes adversários locais, os ministros do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, e das Comunicações, Fábio Faria (PSD), estão juntos no apoio à reeleição do prefeito de Natal (RN), Álvaro Dias (PSDB).

Faria, que se recupera da covid-19, está afastado da campanha. Marinho mantém uma postura discreta, mas tem feito incursões a Natal no período eleitoral. Ele cumpriu agendas em setembro e no dia 30 de outubro na capital potiguar, onde se reuniu com lideranças políticas e empresários.

O Valor mostrou há duas semanas que o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, abriu espaço em sua agenda para prestar consultoria à campanha de Celso Russomanno (Republicanos) à Prefeitura de São Paulo. Russomano tem o apoio declarado de Bolsonaro na disputa. Salles explicou que discutiu com o candidato a “despoluição do Rio Pinheiros”, que é uma questão ambiental relevante, também de interesse do governo federal.