Valor econômico, v. 21, n. 5120, 04/11/2020. Brasil, p. A8

 

Beneficiários do Bolsa Família aparecem como doadores

Luísa Martins

Isadora Peron

04/11/2020

 

 

Indícios de ilegalidades já ultrapassam R$ 35 milhões

Em conjunto com o Ministério da Cidadania, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) identificou 863 beneficiários do Bolsa Família que fizeram doações em dinheiro a candidatos que disputam as eleições municipais deste ano. Somados, os repasses somam aproximadamente R$ 370 mil e levantam “indícios de irregularidades”.

O levantamento detectou também 827 empresas que prestaram serviços a campanhas eleitorais e cujos sócios ou representantes recebem o auxílio, o que também sugere fraude, de acordo com o tribunal.

As informações podem servir de base para que juízes eleitorais de instâncias inferiores determinem diligências (incluindo quebras de sigilos fiscais e bancários) com o objetivo de investigar os supostos ilícitos. Além disso, os dados foram encaminhados ao procurador-geral da República, Augusto Aras, que deve avaliar a necessidade de compartilhamento do material com as promotorias estaduais.

Segundo o balanço divulgado ontem pelo Núcleo de Inteligência da Justiça Eleitoral, os indícios de ilegalidades em doações já ultrapassam R$ 35 milhões. Outros órgãos atuam junto do TSE nesse monitoramento, como a Receita Federal, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), a Defensoria Pública da União (DPU) e o Tribunal de Contas da União (TCU).

De acordo com os números atualizados, os doadores sem emprego formal são 5,3 mil. Juntos, eles repassaram R$ 21 milhões aos candidatos que apoiam. Há, ainda, outras 1.145 pessoas cujas rendas declaradas foram consideradas incompatíveis com os valores doados, que chegam a R$ 10 milhões.

O escrutínio nas contas de campanha também apontou mais de 1,1 mil fornecedores que não têm registro ativo na Junta Comercial ou na Receita Federal, mas foram contratados pelos candidatos para prestar R$ 1,9 milhão em serviços.

Por fim, foram localizadas 416 empresas ligadas a parentes dos candidatos que as contrataram, além de oito pessoas que constam no Sistema de Controle de Óbitos (Sisobi) - ou seja, mesmo “mortas”, elas doaram R$ 8,6 mil.

O levantamento das possíveis irregularidades nas contas de campanhas políticas está previsto em instrução normativa editada pelo TSE em 2016.