Valor econômico, v. 21, n. 5120, 04/11/2020. Brasil, p. A4

 

Governadores vão a Brasília e negociam alívio nas contas

Raphael Di Cunto

Lu Aiko Otta  

Marcelo Ribeiro

04/11/2020

 

 

Projeto de ajuda, compensação por Lei Kandir e verba de fundos setoriais devem ser votados logo

Governadores fizeram uma maratona de reuniões ontem em Brasília e acertaram um calendário para votar os projetos de recuperação fiscal dos Estados e a regulamentação da compensação pelas desonerações da Lei Kandir na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. A expectativa deles é que isso dê fôlego para que a situação dos entes mais endividados não piore.

Nesse cronograma também entrará projeto do deputado Mauro Benevides (PDT-CE) para liberar R$ 177 bilhões parados em fundos setoriais para o governo federal pagar a conta dos programas de combate à pandemia, como o auxílio emergencial e o crédito para empresas. “Em vez de o governo se endividar mais, pode usar esse dinheiro”, disse o pedetista. A intenção é votar o projeto junto com o de recuperação dos Estados, logo após o primeiro turno da eleição municipal (em 15 de novembro).

O projeto dos Estados era conhecido como “Plano Mansueto”, mas foi ampliado em negociações. A mais urgente dessas mudanças é a suspensão da multa para quem descumpriu o teto de gastos, que proibiu o crescimento das despesas acima da inflação entre 2018 e 2019. Dos 20 Estados que aceitaram essa imposição para mudar o indexador de correção das dívidas com a União, 11 não seguiram a regra e serão cobrados em janeiro.

Benevides, que é relator desse projeto, disse que não isentará os governos estaduais do pagamento das multas, mas incluirá o valor no saldo da dívida, a ser pago de forma parcelada. Mas ainda assim haverá a exigência de manter o teto de gastos por mais três anos, de 2021 a 2023. O novo teto terá um “ajuste”: as despesas com saúde e educação ficarão atreladas à Receita Corrente Líquida (RCL) e não estarão mais sujeitas ao teto se a receita total crescer mais do que a inflação.

Os governadores de Goiás, Rio Grande do Sul e Minas Gerais também querem uma votação rápida para entrarem no Regime de Recuperação Fiscal, que permitiu ao Rio de Janeiro não pagar a dívida com a União por três anos em troca de um ajuste fiscal. O prazo do novo programa ainda está em discussão - Benevides quer oito anos e meio, com pagamentos crescente nesse período, enquanto os governadores pedem dez anos.

O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), disse que o Estado está pagando suas contas com base em liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) que suspendeu a dívida, mas que precisa do projeto para não quebrar a partir de 1º de janeiro. “Isso é o mais urgente”, disse.

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), se comprometeu a pautar o projeto assim que a Câmara votar. Os deputados, porém, estão com a pauta trancada por outro projeto, que muda regras de cabotagem.

Além disso, o projeto de recuperação fiscal traz mudanças para todos os Estados. Os com nota de crédito A poderão ampliar sua margem para empréstimos, enquanto os com notas C e D terão acesso a crédito garantido pelo Tesouro, mas em troca precisarão cumprir três de sete contrapartidas de ajuste fiscal, como redução de subsídios e congelamento de salários dos servidores.

Um ponto de impasse com o Ministério da Economia é o pedido para que os Estados suspendem as dívidas com organismos internacionais. A União é avalista desses empréstimos e honraria os pagamentos, a um custo entre R$ 14 bilhões e R$ 16 bilhões. “A maior parte do projeto não contempla o Espírito Santo porque cumprimos o teto de gastos e estamos regulares com nossa dívida. Mas essa suspensão nos interessa. Temos contratos com o Banco Mundial e o Banco Interamericano e estamos conversando com o relator”, disse o governador Renato Casagrande (PSB).

Os governadores também acertaram a aprovação de projeto pelo Senado para regulamentar o acordo para compensar a Lei Kandir, intermediado pelo STF. A expectativa é que isso ocorra neste mês e ainda em 2020 seja feito um repasse de R$ 4 bilhões para Estados e municípios exportadores. Ao longo de 15 anos, o montante será de R$ 62 bilhões. “Há um alinhamento completo entre os governadores e o Ministério da Economia”, disse o secretário de Fazenda do Piauí, Rafael Fonteles.