Valor econômico, v. 21, n. 5113, 23/10/2020. Brasil, p. A4

 

Presidente volta a descartar alta da carga de impostos

Matheus Schuch

Mariana Ribeiro

Rafael Bitencourt

23/10/2020

 

 

Governo anuncia programa de revisão de normas trabalhistas

No dia em que anunciou a revisão de normas trabalhistas, o presidente Jair Bolsonaro voltou a dizer que o país está no rumo certo de realização de reformas e rechaçou a possibilidade de aumentar impostos no pós-pandemia. Apesar de ter no horizonte um aumento de despesas com a criação do Renda Cidadã, o presidente disse que o seu governo está cortando gastos.

“Precisamos que os senhores mostrem ao mundo que o Brasil está fazendo o que é certo. Nós estamos reformando nossa economia, cortando gastos, combatendo a corrupção pelo exemplo”, afirmou ontem durante formatura de novos diplomatas. “O governo federal não aumentou impostos durante a pandemia e não aumentará quando ela nos deixar.”

O ministro da Economia, Paulo Guedes, que acompanhou o discurso da plateia, tem defendido a criação de um novo imposto sobre transações. O argumento do ministro é de que isso não significaria aumento de carga tributária, porque o novo imposto viria acompanhado da desoneração da folha de pagamentos.

Na semana seguinte à apreensão de dinheiro pela Polícia Federal na cueca de seu então vice-líder no Senado Chico Rodrigues (DEM-RR), Bolsonaro também disse que não há “um só ato de corrupção” no governo. “O nosso governo, materializado pelos ministérios, estatais e bancos oficiais, não temos um só ato de corrupção”, afirmou, sem comentar o caso do senador.

Horas depois do evento no Itamaraty, o presidente anunciou em cerimônia no Palácio do Planalto um programa de revisão de normas. Foram revogadas 48 portarias da área do trabalho consideradas obsoletas pelo governo. Também foi assinada a Nova Norma Regulamentadora de Saúde e Segurança relativa ao agronegócio e anunciada uma simplificação do eSocial.

As medidas foram as primeiras anunciadas dentro do programa “Descomplica Trabalhista”. Ao todo, 2 mil documentos do antigo Ministério do Trabalho estão sendo consolidados em menos de dez, diz o Ministério da Economia. Para o secretário especial de Previdência e Trabalho, Bruno Bianco, as portarias revogadas eram “inúteis” e atrapalhavam a vida do empreendedor.

Em relação à nova norma regulamentadora (NR), disse que deve trazer uma economia de R$ 4 bilhões por ano ao agronegócio. O processo de revisão da NR, que contém cerca de 700 itens, começou no ano passado, com consulta pública, e discussões na comissão que reúne empregadores, empregados e governo. Em 2019 a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, disse que estava “ansiosa” pelas mudanças.

Questionado sobre um possível prejuízo ao trabalhador, o secretário de Trabalho, Bruno Dalcolmo, negou. “Pelo contrário”, disse. “As normas trazem custo financeiro ao setor privado e não protegem o trabalhador.” Bianco disse ainda que a pasta revisou 11 normas, com redução de custos estimada em cerca de R$ 20 bilhões por ano. Ainda assim, menos de um terço das normas existentes já foi revisitada.

De acordo com o ministério, a simplificação do eSocial facilita o preenchimento e elimina campos que tomavam tempo desnecessário. O CPF passará a ser o único número de identificação do trabalhador, dispensando a referência a outros números cadastrais, como PIS e Pasep.

Guedes disse que as medidas buscam tirar o governo do “cangote” da população e defendeu o andamento da agenda de reformas. Disse ainda que o período de trabalho legislativo até as eleições municipais “não vai ser perdido”.

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Diplomacia deve mostrar que o Brasil faz hoje o certo’

Matheus Schuch

Rafael Bitencourt

23/10/2020

 

 

Para Bolsonaro, é preciso maior engajamento para divulgar os acertos do governo no exterior

À plateia de novos alunos formados no Instituto Rio Branco, o presidente Jair Bolsonaro defendeu ontem que os jovens que iniciam carreira na diplomacia brasileira devem mostrar ao mundo que o Brasil faz hoje “o que é certo”. O presidente defendeu que é preciso maior engajamento do corpo diplomático para divulgar os acertos do governo na economia, no controle fiscal, no combate à corrupção e na defesa da Amazônia.

“O que mais precisamos é da verdade. Não podemos nos deixar vencer pelas falsas narrativas”, disse Bolsonaro. A cerimônia, no Palácio do Itamaraty, contou com as presenças dos ministros Walter Braga Netto (Casa Civil), Paulo Guedes (Economia) e Augusto Heleno (GSI).

Bolsonaro disse que o mundo “sempre esteve em guerra”, ainda que seja no campo da comunicação. “Não é fácil estar do lado da verdade, mas a verdade me trouxe até aqui e a verdade libertará o nosso país. Os senhores são os instrumentos disso.”

Na guerra contra as “falsas narrativas”, o presidente inclui a defesa da Amazônia. Para ele, é necessário que os diplomatas brasileiros “levem a verdade [sobre a preservação] lá para fora”.

Ele reiterou a promessa de mostrar o resultado da política ambiental do governo para outros países. “Estamos ultimando uma viagem Manaus-Boa Vista em que convidaremos diplomatas de outros países para mostrar. Nessa viagem de uma hora e meia [eles] não verão em nossa floresta amazônica nada queimando ou sequer um hectare de selva devastada.”

Em discurso que antecedeu a fala de Bolsonaro, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, já havia marcado posição em declarações de forte apelo ideológico. O chanceler voltou a criticar o “globalismo” que, segundo ele, dominou a diplomacia brasileira.

Araújo fez uma defesa da liberdade do povo que estaria sendo ameaçada pelos governos com inclinação à esquerda. Aos formandos, disse que a diplomacia pode ajudar a “libertar a grande nação brasileira e o próprio mundo da pobreza material e espiritual”. Em seguida, frisou que, se a defesa da liberdade no Brasil faz o país ser um “pária internacional, então que sejamos um pária”.

Para o chanceler, a diplomacia brasileira ficou muito tempo presa “dentro de si mesma, vivendo conceitos ultrapassados, cantando glórias passadas, lustrando troféus antigos, mas esquecendo de jogar o campeonato deste ano”.

Araújo disse que considera guardar semelhanças com o homenageado da cerimônia de formatura, o poeta e ex-diplomata João Cabral de Melo Neto. “Modestamente também me considero poeta e diplomata”, sublinhou, e ainda rejeitou a referência dirigida ao grupo do governo apontado como ideológico. “Aqueles que nos acusam de ideológicos são aqueles que idealizam toda a vida para concentrar poderes.”

Como resultado do “novo Itamaraty”, Araújo destacou ter concluído acordos comerciais com as maiores economias do mundo, europeia e americana, restaurado as relações com países de alta tecnologia, como Israel e Japão, e feito parcerias com países onde estão grandes centros de capital, como Arábia Saudita e Emirados Árabes.