O globo, n. 31829, 28/09/2020. Sociedade, p. 13

 

9 estados e 2.517 cidades devem planos para seu lixo

Johanns Eller

Renata Mariz

28/09/2020

 

 

Desde 2010 governo federal aguarda projetos de gestão dos resíduos sólidos; fim dos lixões, previsto para 2024, é considerado inviável por especialistas

 Dez anos após a instituição da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), nove estados e 2.517 municípios ainda não submeteram ao governo federal seus planos de gestão para a área. Os dados são do Plano Nacional de Resíduos Sólidos (Planares), submetido pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) a uma consulta pública que se encerra quarta-feira. Para especialistas ouvidos pelo GLOBO, a década perdida representa um grande prejuízo, principalmente no caso do fim dos lixões, marcado para 2024 e considerado inexequível.

O prazo está no Marco Legal do Saneamento, aprovado em julho. Há um longo caminho: segundo um levantamento da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Recursos Especiais (Abrelpe), há 2.976 lixões a céu aberto no país.

O secretário de Qualidade Ambiental do Ministério do Meio Ambiente, André França, espera que o texto final fique pronto até dezembro, para ser submetido ao presidente Jair Bolsonaro, que deverá publicá-lo por meio de decreto.

—O Planares não diz apenas onde chegar, mas também aponta o caminho. O “como fazer” é o pulo do gato do plano —diz França.

O secretário considera que a situação “mais crítica” hoje é a dos lixões e quer atrair a iniciativa privada para a área. Segundo ele, já foram repassados cerca de R $100 milhões em 2020 a dezenas de município spa rapara a gestão dos resíduos sólidos. O prazo de 2024, no entanto, é desacreditado por especialistas.

—É um prazo inexequível. O que vai acontecer? Quem não tiver um aterro sanitário será multado? —afirma Monica Pertel, professora do Departamento de Recursos Hídricos e Meio Ambiente da Politécnica/UFRJ.

Para Claudia Lins, geógrafa e analista técnica da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), a PNRS trouxe várias obrigações sem fonte orçamentária federal, tudo com um prazo inviável:

—Alguns municípios pequenos não têm recursos nem para a redação de um plano, que exige consultoria. Nenhum país do mundo cumpriria a política do Brasil.

O Planares faz parte da “agenda ambiental urbana” defendida pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. O documento divide opiniões. Servidores da pasta relataram ao GLOBO, sob condição de anonimato, que o texto final não passou pelos técnicos do ministério que assinam o plano. Também veem quebra de isonomia no envolvimento da Abrelpe, um ente privado, na consolidação do plano.

Kátia Campos, ex-diretora do Serviço de Limpeza Urbana do Distrito Federal, diz:

— Quem elaborou o plano foi a Abrelpe. Não me parece uma boa estratégia a empresa privada elabora rum plano para o poder público cumprir.

A associação confirmou ao GLOBO que colaborou com o MMA através de uma cooperação técnica. Seu presidente, Carlos Silva Filho, afirma:

—Por dez anos o país ficou sem planejamento para resíduos sólidos. Juntando a PNRS com o Planares conseguiremos avançar na direção prevista em 2010.