Valor econômico, v. 21, n. 5104, 09/10/2020. Política, p. A8

 

Bolsonaro defende Kassio e reclama de ‘direita burra’

Fabio Murakawa

09/10/2020

 

 

Presidente diz que “tem que compor”

O presidente Jair Bolsonaro justificou ontem a indicação de Kassio Marques ao Supremo Tribunal Federal (STF) dizendo que “tem que compor” e se queixou da “direita burra” que vem criticando a opção pelo desembargador.

“Tínhamos aproximadamente dez nomes que chegaram para mim indicados ao Supremo. Bons nomes, mas eu tenho que compor”, disse Bolsonaro. “O nome ideal para ir para lá é o meu. E todo mundo tem o seu candidato dos sonhos. Mas, por vezes, esse candidato dos sonhos vai ter dificuldade para ser aprovado. Vai ter um atrito aqui, um acolá. E quem bota dentro do Supremo não sou eu, é o Senado Federal.”

A fala do presidente, em sua live semanal nas redes sociais, ocorreu em meio a fortes críticas de membros mais ideológicos de sua base à indicação do desembargador. Os apoiadores veem o perfil de Kassio como pouco conservador, desarmamentista e ligado ao PT - pelo fato de ter sido alçado ao posto de desembargador durante os governos petistas.

Bolsonaro rechaçou essas afirmações, exemplificando que o ministro Tarcísio de Freitas (Infraestrutura), um de seus auxiliares mais elogiados, também trabalhou no governo durante a gestão Dilma Rousseff. E que Fernando Azevedo, antes de ser nomeado ministro da Defesa, era assessor do ministro do STF Dias Toffoli, um dos mais odiados pelo chamado bolsonarismo radical.

Bolsonaro lembrou que muitos dos militantes que o criticam hoje não eram nascidos quando ele já lutava contra a esquerda durante sua juventude no Vale do Ribeira. A guerrilha na região acabou quando o presidente tinha 16 anos.

“Não é infiltrado da esquerda [que critica], como o pessoal diz aqui nas mídias sociais, não. Não é petista. É gente da direita mesmo, essa direita burra”, disse. “É moleque fedelho, cheirando ainda a fralda, tem fralda ainda, que quando eu participei da luta armada no Vale do Ribeira, do lado do Exército brasileiro, o pai de vocês nem tinha nascido ainda. E o pessoal agora se vê no direito de criticar com baixaria.”

Bolsonaro disse ainda que “as pessoas mudam” e admitiu ter apoiado Hugo Chávez quando o então coronel do Exército chegou ao poder na Venezuela, em 1999.

“Quando o Chávez foi eleito em 99, eu achei uma coisa maravilhosa. Um colega, coronel do Exército, paraquedista, fez lá sua campanha”, afirmou. “Eu achei que estava bem, mas depois fez besteira. Virei opositor dele, como sou opositor do [Nicolás] Maduro”, disse, referindo-se ao sucessor de Chávez.

Ao criticar a linha adotada pelo chavismo, Bolsonaro acabou dizendo que “países poderosos” que “não têm democracia” agora estão “tomando conta” do país vizinho. A China e a Rússia, parceiros do Brasil nos Brics, estão entre os maiores investidores da Venezuela e fiadores do governo Maduro.

“Eu não sabia que ele ia entrar naquela linha que inclusive levou um dos países mais ricos em ouro e petróleo e ouro à miséria”, afirmou. “E lá dentro agora tem países poderosos, onde não tem democracia, tomando conta do país.”

Na live, Bolsonaro tentou ainda explicar a declaração dada por ele na véspera de que acabou com a Lava-Jato “porque não tem mais corrupção no governo”.

Segundo Bolsonaro, a frase significa não que ele esteja tentando sabotar a operação, que teve como um dos principais ícones o ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, que se tornou seu desafeto.

“É impressionante a hipocrisia de muita gente, né, e de grande parte da imprensa. Pro meu governo não tem mais Lava-Jato. Não temos uma notícia de corrupção. Então, para nós, a Lava-Jato não tem finalidade, graças a Deus”, disse. “Agora, para os demais órgãos do Brasil, alguns Estados, alguns municípios, vai continuar funcionando normalmente. Ontem mesmo, tivemos Operação Lava-Jato. Quase que diariamente temos operação Lava-Jato. O ‘covidão’ nem começou ainda”, afirmou o presidente.