Título: À espera do 11º ministro
Autor: Abreu, Diego
Fonte: Correio Braziliense, 18/02/2013, Política, p. 5

Desde a saída de Ayres Britto, em novembro, o STF está com a composição incompleta. Levantamento do Correio aponta que, nos últimos 30 meses, a Corte passou 14 desfalcada de pelo menos um dos titulares

A demora para a indicação do substituto do ministro Carlos Ayres Britto para o Supremo Tribunal Federal (STF) vem incomodando não só integrantes da Corte, mas também entidades representantes da magistratura e advogados. Britto se aposentou compulsoriamente, ao completar 70 anos, em novembro passado. Três meses se passaram e, até agora, a presidente Dilma Rousseff nem sequer esboçou alguma iniciativa de indicar um jurista para o cargo. Interlocutores do Palácio do Planalto falam que a escolha deverá ser feita em março. A avaliação no meio jurídico, porém, é de que a demora é injustificável, pois acarreta prejuízos para os trabalhos do Supremo. Uma das soluções, na avaliação da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), seria estabelecer um prazo para que as nomeações sejam feitas.

Para o ministro do STF Marco Aurélio Mello, Dilma deveria ter repetido a rapidez que teve em relação à nomeação de Teori Zavascki, que, menos de um mês depois da aposentadoria de Cezar Peluso, foi escolhido pela presidente para integrar o tribunal. “A nomeação do Teori foi exemplar em termos de rapidez, mas essa demora em relação à vaga de Ayres Britto é péssima. Primeiro, porque sobrecarga o serviço dos ministros e, segundo, porque o colegiado é composto de 11, e não de 10 integrantes. Com um número par, cada ministro recebe mais processos e há o risco de empates nos julgamentos”, frisou Marco Aurélio.

O presidente da Ajufe, Nino Toldo, concorda que a ausência do 11º ministro prejudica o tribunal. Ele defende uma modificação no sistema, de forma que seja incluído na Constituição um prazo para que o presidente da República faça a indicação a partir do momento em que uma cadeira de ministro fica vazia. “A demora é ruim porque, em se tratando de um cargo público, não pode haver um prazo grande entre a vacância e a posse. O caminho seria que a Constituição estabelecesse um prazo para a indicação e também para que o Senado sabatinasse o escolhido e a posse fosse realizada”, sugeriu Nino Toldo. Segundo ele, um prazo de 30 dias seria razoável. O ministro Marco Aurélio, por sua vez, avalia que a demora não justifica uma reforma imediata. “Penso que a presidente tem realmente noção da problemática e vai indicar logo. Precisamos acreditar nas instituições.”

Ausências O Correio calculou que, nos últimos 30 meses, a Corte ficou 14 sem pelo menos um ministro em plenário. Em agosto de 2010, depois da aposentadoria de Eros Grau, foram sete meses com uma cadeira vazia. O substituto, Luiz Fux, foi indicado somente em fevereiro do ano seguinte, tomando posse um mês depois. Já quando Ellen Gracie se aposentou, em agosto de 2011, a Corte teve de aguardar mais de quatro meses até a chegada de Rosa Weber, em 19 de dezembro daquele ano. Ela foi indicada por Dilma exatos três meses depois da aposentadoria de Ellen.

A indicação mais rápida foi a de Teori Zavascki, escolhido para o STF em 10 de setembro do ano passado, pouco mais de um mês depois da aposentadoria de Cezar Peluso. A posse, porém, ocorreu somente no fim de novembro, pois houve demora na sabatina realizada pelo Senado. Durante esse período de ausências, diante da composição de 10 ministros, houve empates que colocaram a Corte em situações complicadas, como no caso da Lei da Ficha Limpa e no julgamento do mensalão.

O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinicius Furtado Coêlho, lamenta a demora para a chegada do futuro integrante da Suprema Corte. “Esperamos que a presidente da República, o mais rapidamente possível, faça a escolha. Afinal, a falta de um ministro significa quase 10% da Corte”, destacou. Ele, no entanto, não vê com bons olhos a fixação de um prazo. “Em uma democracia, há certas situações em que não há como se impor, porque o ideal é que a escolha seja bem-feita. Ou seja, se tivermos que optar entre uma escolha apressada e uma bem-feita, é preferível a bem-feita”, completou.

“A demora é ruim porque, em se tratando de um cargo público, não pode haver um prazo grande entre a vacância e a posse. O caminho seria que a Constituição estabelecesse um prazo para a indicação e também para que o Senado sabatinasse o escolhido e a posse fosse realizada” Nino Toldo, presidente da Ajufe

Memória Aposentadorias compulsórias Considerado o maior processo da história da Justiça brasileira, o julgamento do mensalão começou em agosto do ano passado com 11 ministros, mas, ao fim, apenas nove magistrados participaram da conclusão dos trabalhos. O primeiro a se aposentar durante o julgamento foi Cezar Peluso, que deixou a Corte no começo de setembro. Na época, houve muita especulação de que ele adiantaria o voto relativo ao processo antes da aposentadoria. Mas, como o regimento prevê que relator e o revisor leiam seus posicionamentos antes dos colegas, Peluso saiu do Supremo julgando apenas parte do processo. Ele condenou, entre outros, o ex-presidente da Câmara e atual deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP) e o empresário Marcos Valério por corrupção.

A presidente Dilma Rousseff indicou o sucessor de Peluso, Teori Zavascki, pouco mais de uma semana depois da aposentadoria de Peluso. A escolha rápida gerou muita expectativa de que Zavascki chegasse à Corte ainda durante o mensalão. Mas, com o atraso da sabatina no Senado, ele só tomou posse quando o julgamento da Ação Penal 470 já estava praticamente no fim. Poucas semanas antes, o então presidente do Supremo, Carlos Ayres Britto, havia se aposentado, por completar 70 anos. Ele deixou o STF antes da conclusão da chamada dosimetria, que é a definição das penas de cada réu. Assim como Peluso, preferiu não adiantar posicionamento sobre o polêmico caso.

Além de presidir a Corte durante todo o processo, Ayres Britto teve um papel importante no mensalão, especialmente para apaziguar as rusgas entre o relator da ação, Joaquim Barbosa, e o revisor, Ricardo Lewandowski. Os bate-bocas entre os dois ministros foram frequentes no plenário do STF durante o julgamento. “O presidente tem que manter a taxa de cordialidade alta para que o processo flua”, explicou Britto, quando se aposentou. Dos 37 réus do processo, 25 foram condenados e 12, absolvidos. A maior pena foi a de Marcos Valério: 40 anos de cadeia.