Valor econômico, v. 21, n. 5085, 14/09/2020. Política, p. A6

 

Governistas divergem sobre estratégia em relação a veto

Renan Truffi

Marcelo Ribeiro

14/09/2020

 

 

Ricardo Barros fala em judicializar a questão se veto for derrubado e Eduardo Gomes quer um acordo

Apesar de negarem confronto, aliados do presidente Jair Bolsonaro têm dado informações desencontradas sobre a estratégia do Palácio do Planalto em relação ao veto à prorrogação da desoneração da folha de pagamento. O bate cabeça pode contaminar a narrativa que vinha sendo vendida de que um acordo estava prestes a ser concretizado. A expectativa é que o dispositivo seja analisado pelo Congresso nas próximas semanas.

O líder do governo no Congresso, senador Eduardo Gomes (MDB-TO), voltou a defender que Executivo e Legislativo cheguem a um acordo. A afirmação contraria as ameaças de judicialização feitas por integrantes do Executivo, o que inclui a equipe econômica e membros do Palácio do Planalto. Ao Valor, Gomes fez questão de afirmar que, se necessário, o governo pode aceitar a derrubada do veto da desoneração para, num segundo momento, encontrar uma "solução”.

“Neste momento de pandemia algumas matérias se constituíram em pautas convergentes [entre Executivo e Legislativo]. Desoneração da folha de pagamento é uma pauta convergente. O governo quer chegar a uma solução com os 17 setores. O Congresso quer chegar a uma solução. Então, o governo vai chegar a uma solução com os 17 setores e os outros [que ficaram de fora do programa]”, disse.

No sentido oposto está o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR). Ele tem dito que a eventual derrubada do veto é inconstitucional e sinalizou que o tema poderia ser judicializado.  O argumento seria que os congressistas estariam aprovando renúncia de receita sem que uma nova fonte fosse indicada. O governo, segundo ele, ainda não decidiu se recorrerá ao Supremo Tribunal Federal (STF). Apesar disso, ele deixa claro que Gomes é o responsável pelas articulações do governo no Congresso.

“Quem conduz a estratégia sobre o veto à desoneração é o Eduardo Gomes. Eu tive uma reunião no Palácio e nos foi dito que há uma inconstitucionalidade insuperável nessa questão”, explicou Barros ao Valor, acrescentando que o governo não pode concordar com a derrubada do veto e que orientará pela manutenção do dispositivo quando o tema for apreciado em plenário. “A LRF não nos permite caminhar nessa direção [de derrubada]”, complementou.

Há alguns dias, Gomes vem defendendo alguma compensação pela derrubada do veto. Na última terça-feira, ele já havia afirmado que o Palácio do Planalto aceitaria a revogação do veto se o Congresso se comprometesse a votar, ainda este ano, as reformas tributária, administrativa e a PEC do Pacto Federativo.

Por esse motivo, o aceno de Barros para a judicialização surpreendeu algumas bancadas do Parlamento. Ainda assim, ele nega qualquer confronto com Gomes e diz saber onde é seu lugar. Sobre a perspectiva de análise dos vetos,  Barros disse acreditar que a votação pode ser adiada novamente já que a próxima quarta-feira será o último dia para que as convenções municipais sejam realizadas.

Nos bastidores, parlamentares apontam que a mudança de rota no discurso do governo seria um aceno ao ministro da Economia, Paulo Guedes, defensor do fim da desoneração.