O globo, n. 31782, 12/08/2020. Sociedade, p. 17

 

Bolsonaro diz que é “mentira” dizer que Amazônia “arde em fogo”

Daniel Gullino

12/08/2020

 

 

Vice—presidente Hamilton Mourão admite que desmatamento aumentou no ano passado, mas critica 'neocolonialismo' e “desinformação” sobre realidade econômica e social da região

 Em uma cúpula de países amazônicos, o presidente Jair Bolsonaro e o vice-presidente Hamilton Mourão apresentaram discursos contraditórios em relação a omo doco moogoverno federal tem agido sobre aflores ta.Bol sonar o afirmou que é uma “mentira” dizer que a Amazônia “arde em fogo”, enquanto Mourão admitiu que, no ano passado, a devastação do bioma avançou, mantendo a tendência de crescimento verificada desde 2012.

O presidente comemorou a redução de 28% do desmatamento em julho, comparado ao mesmo mês do ano passado. Não comentou, no entanto, que houve um crescimento de 34% no desmate da floresta entre agosto de 2019 e julho, o maior em uma década, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

Os chefes de Estado conversaram ontem, em videoconferência, durante a II Cúpula Presidencial pela Amazônia. Além de Bolsonaro, participaram do encontro os presidentes Ivan Duque (Colômbia), Martín Vizcarra (Peru), Lenin Moreno (Equador), Jeanine Ãnez (Bolívia) e representantes da Guiana e do Suriname.

— Nós bem sabemos da importância dessa região para todos nós, bem como os interesses de muitos outros países nessa região — disse Bolson aro.—Também sabemos o quanto somos criticadosdeforma in justapor parte de outros países do mundo. Nós, com perseverança, com determinação e verdade, devemos resistir.

Bolso na roa tri buiu o interesse econômico como razão das críticas internacionais. E afirmou que tem convidado embaixadores a sobrevoar com ele a Amazônia, enfatizando que, entre Manaus e Boa Vista, em uma distância de “aproximadamente 600 quilômetros”, não encontrarão “nenhum foco de incêndio”.

— O Brasil é uma potência no agronegócio. Ameaças existem sobre nós o tempo todo. E, lamentavelmente, alguns poucos brasileiros trabalham contra nós nessa questão — disse.

—Entre as regiões de Boa Vista e Manaus, eles (os embaixadores) não encontrarão nenhum foco de incêndio, nenhum quarto de hectare desmatado, porque essa floresta é preservada por si só. Até mesmo pela sua pujança, bem como por ser floresta úmida, como em grande parte (da região) dos senhores, não pega fogo. Então essa história de que a Amazônia arde em fogo é uma mentira. E nós devemos combater isso com números verdadeiros. É oque estamos fazendo aqui no Brasil.

FUNDO DO BID

Bolsonaro ainda afirmou que será lançado, junto com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), um fundo para promover a bioeconomia na região.

—Lançaremos em breve, com o BID, o Fundo para Bioeconomia e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia. Trata-se de mecanismo financeiro inovador, voltado para países da região e para os investidores dispostos a promover a bioeconomia com pleno respeito às nossas regras.

A criação de um fundo de investimentos do BID para a Amazônia já havia sido feita em setembro do ano passado pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. À época, porém, o banco afirmou que não havia anúncio a ser feito.

Salles foi criticado por apresentar o projeto ainda não desenvolvido como uma alternativa ao Fundo Amazônia, cujo repasse de verbas foi congelado pelos seus doadores, os governos da Alemanha e da Noruega, que discordaram da ideia do ministro de extinguir o comitê que orientava o financiamento de projetos de sustentabilidade. O vice-presidente, Hamilton Mourão, assumiu o diálogo com as duas nações para que o país volte a receber recursos.

Mourão, que preside o Conselho da Amazônia, admitiu ontem que houve um avanço da devastação do bioma no primeiro ano do governo Bolsonaro. Ao mesmo tempo, também criticou a “desinformação” e citou “interesses protecionistas” e atitudes “neocolonialistas”:

— Verificou-se uma grande desinformação a respeito da realidade social e econômica da região —afirmou.

—Pior ainda foi a postura de alguns que se aproveitaram da crise para avançar em interesses protecionistas e renovar atitudes neocolonialistas.

Em julho, Mourão decretou a “moratória do fogo”, proibindo queimadas no Pantanal e na Amazônia por 120 dias. A iniciativa, porém, não surtiu efeito. Em apenas um dia, 30 de julho, a Amazônia teve 1.007 focos de incêndio.