Correio braziliense, n. 20912, 25/08/2020. Cidades, p. 16

 

Entrevista - Eduardo Hage

Alexandre de Paula 

Ana Maria da Silva 

25/08/2020

 

 

Em entrevista ao CB.Poder — uma parceria do Correio Braziliense e da TV Brasília —, o subsecretário de Vigilância à Saúde do Distrito Federal, Eduardo Hage, explicou, ontem, as mudanças adotadas pela Secretaria de Saúde no método de divulgação de óbitos pela covid-19. “Nós vamos manter os gráficos, ou seja, não haverá supressão de nenhum dado no painel, e vamos introduzir outras informações que já existiam no boletim. Não é uma mudança de metodologia, mas sim qualificação dos dados e das informações”, afirma.

Nós estamos chegando hoje, perto de 150 mil casos de covid-19 no DF, mais de duas mil pessoas morreram pela doença. Na sua avaliação, esse é o momento mais grave da pandemia?

Estamos atravessando um momento que teve início em meados de julho. Nós estamos em um platô, tanto de ocorrências de casos quanto de óbitos. A próxima tendência é de redução, especialmente do número de óbitos, considerando o número de pessoas que temos observado em casos graves, que ocupam leitos de Unidade de Tratamento Intensiva (UTI). Apresentam uma redução.

Dá para ter uma estimativa de quando que começaremos a ver, de fato, a pandemia arrefecer aqui no DF?

Não é possível afirmar com exatidão quando haverá redução acentuada do número de casos e de óbitos. Mas é possível estimar uma redução, especialmente da ocorrência de casos e também do número de óbitos, uma vez que observamos essa tendência mais recente.

Se falou muito sobre o percentual da população que deveria estar sendo imunizada. Houve pessoas que defenderam a imunização de rebanho. Mas essa é uma estratégia eficaz? O sistema de saúde resistiria a um método assim?

Nenhum sistema de saúde, não só no Brasil como em outros países, resistiria a isso. O volume de casos em um curto período de tempo seria muito grande. Nós exercemos isso no Brasil em alguns estados. Por exemplo, em Manaus e Fortaleza ocorreu um pouco disso. Um grande número de pessoas foram infectadas, muitas dessas evoluíram para formas graves e necessitaram de leitos de UTI, que não tinham disponíveis. Nos demais estados, especialmente no DF, foi possível alcançar o que se chamava de achatamento do curso. Ou seja, esse pico não foi tão acentuado. Isso permitiu que o sistema se preparasse. Tanto que em nenhum momento houve uma sobrecarga de pessoas para o número de atendimentos.

Existe a possibilidade, caso os números venham a apresentar uma piora, de se rever essa situação e voltar ao isolamento de forma mais rígida?

A qualquer momento, todas as medidas podem ser revistas. O próprio governador e a Secretaria de Saúde têm colocado que, para a abertura das atividades, era necessário haver uma análise contínua e diária dos dados e da evolução da pandemia. O mesmo vale para uma intensificação na transmissão.

Podemos ter algumas mudanças a partir de agora, no cenário futuro, se houver necessidade?

Nós temos mais de um mês de entrada nesse período e platô, e não há nenhum indicador que sugira um aumento do número de casos e óbitos a partir de agora. Pelo contrário. Nós analisamos os casos graves de ontem, em que haviam 713 pessoas internadas em leitos de UTI. Mas esse número é exatamente igual ao de um mês atrás. Chegamos a ter 800 pacientes em leitos de UTI. Ou seja, houve uma queda. Isso indica uma redução muito provável na ocorrência de óbitos.

A secretaria anunciou, na semana passada, algumas mudanças na metodologia de divulgação dos dados. Não ficou muito claro, para muita gente, o que muda e por que muda. Quais alterações estão sendo feitas na prática?

Pela secretaria, há duas formas principais de divulgação dos dados das informações diárias. Uma é o boletim. Dentro de seis meses, nós fizemos todos os dias a produção e a divulgação diária de todas as informações. Até hoje, nada mudou e não vai mudar. Outra opção é o painel interativo, feito em parceria com a Secretaria de Estado de Segurança Pública (SSP-DF). Esse painel permite que as pessoas olhem os dados não só de hoje, como também selecionem o período de tempo para observação.

Nesse painel, o que estamos fazendo é a mesma forma de análise do número de óbitos como são registrados no boletim. Por exemplo, o registro dos óbitos, de acordo com a data de ocorrência, que é a forma mais adequada de se fazer análise epidemiológica, e já estava no boletim desde sempre, também estará presente no painel. Nele, a forma existente de apresentação da curva de óbitos atualmente é somente para o acúmulo de óbitos. Não haverá nenhuma supressão, nenhum dado vai deixar de estar presente no painel. Nós estamos introduzindo outras informações que já existiam no boletim. Então, não é uma mudança de metodologia, mas sim qualificação dos dados e das informações.

Quando essa mudança foi anunciada, a principal preocupação que causou foi o entendimento de que não seriam mais divulgados esses dados consolidados de mortes, mas somente o do dia, ação que poderia mascarar de certa forma a situação uma vez que perderíamos a noção do que aconteceu anteriormente. Isso então não acontecerá?

De maneira nenhuma. Do ponto de vista da Secretaria de Saúde e da Vigilância de Saúde epidemiológica com a qual eu trabalho, nós temos pleno conhecimento de que isso não é ético e que para nós daria uma forma equivocada de acompanhar a evolução dos óbitos. O que nós estamos fazendo é qualificando a divulgação da ocorrência de óbitos com a data do registro, agregando-se a informação da ocorrência de óbitos com a data da sua ocorrência. Então nós estamos incluindo informações. É bom pensarmos no histórico. Óbito você não esconde, não tem como. No Brasil, nós já passamos uma experiência na década de 1970, a grande epidemia de meningite, em que se tentou esconder óbitos e depois tudo veio a tona, todos os dados foram revelados. Então longe de a Secretaria de Saúde omitir qualquer informação.