Valor econômico, v. 21, n. 5069, 20/08/2020. Política, p. A16

 

Senado derrota governo e derruba veto a aumento de servidores

Vandson Lima

 Renan Truffi

Fabio Graner

20/08/2020

 

 

Bolsonaro agora dependerá da Câmara para evitar rombo de até R$ 132 bilhões

Em uma derrota que pode ter consequências catastróficas para o governo, os senadores aprovaram ontem, por 42 votos a 30, a derrubada do veto feito pelo presidente Jair Bolsonaro ao aumento de despesas com carreira, reajustes, concessão de vantagens ou criação de cargos a servidores de saúde e segurança pública cuja atividade esteja relacionada ao combate à pandemia.

O governo, totalmente contrário à medida, esperava economizar de R$ 98 bilhões a R$ 132 bilhões com a manutenção do veto. Agora, afirma que até o auxílio-emergencial estará comprometido se o veto cair. A equipe econômica foi pega de surpresa e demonstrou preocupação “com possíveis consequências às contas públicas, em especial de Estados e municípios”. A assessoria do Ministério da Economia destacou que está atuando junto à Câmara dos Deputados para “manter ponto tão importante para a saúde das contas públicas”.

A iniciativa do Senado jogou o ônus de se indispor com o funcionalismo para a Câmara, que faria sua sessão na noite de ontem e, surpreendida, cancelou.

Por causa da pandemia, Câmara e Senado estão realizando as sessões conjuntas do Congresso de forma remota e separada. Para derrubar um veto, é necessário o apoio da maioria absoluta das duas Casas (41 senadores e 257 deputados). O governo, agora, dependerá dos deputados para evitar a derrota. Uma nova sessão está prevista para hoje.

O revés torna ainda mais visível a cisão entre as duas Casas do Congresso, bem como a diferença na relação do Palácio do Planalto com a Câmara e o Senado. Enquanto o presidente têm se esforçado para formar uma base sólida entre deputados, escorado no Centrão, fica cada vez mais visível a rebelião dos senadores, que reclamam da pouca atenção do governo às suas demandas.

Não é o primeiro recado do Senado. Na votação da medida provisória que liberou um novo saque emergencial do FGTS, os senadores aprovaram emendas para alargar as possibilidades de saque do montante, inclusive para quem pedisse demissão durante a pandemia. A proposta teve de volta à Câmara e o governo articulou para que os deputados deixassem caducar a MP.

No Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, sancionado em 27 de maio, Bolsonaro havia barrado a possibilidade de reajuste salarial para servidores públicos civis e militares diretamente envolvidos no combate à pandemia, incluindo carreiras como peritos, agentes socioeducativos, profissionais de limpeza urbana, serviços funerários e assistência social, trabalhadores da educação pública e profissionais de saúde.

Só que os senadores discordaram. Líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO) apelou aos pares, dizendo que até o auxílio emergencial ficará ameaçado pela medida, sem sucesso. “É possível que estejamos impossibilitando a população do Brasil inteiro de receber a sexta parcela do auxílio emergencial”, avisou.

Os senadores também reverteram ontem outros vetos que podem complicar Bolsonaro, como a liberação para que empresas que se encontrem em situação irregular perante os órgãos do Estado, bem como de insolvência iminente, possam tomar empréstimos no âmbito do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe).

Além disso, a derrubada do veto estabelece a carência de oito meses, período em que as parcelas serão reajustadas apenas pela taxa Selic. Também fica permitido o encaminhamento de informações pela Receita Federal ao Banco Central necessárias ao Pronampe, o que o governo considerava que geraria insegurança jurídica.

Também foram revertidos no Senado vetos de Bolsonaro ao Regime Jurídico Emergencial e Transitório (RJET) no período da pandemia. Com isso, valerão restrições à realização de reuniões e assembleias presenciais e ficará proibida concessão de liminar para desocupação de imóveis urbanos em ações de despejo até 30 de outubro deste ano. Tanto no caso do Pronampe quanto do RJET, tal como no aumento para servidores as medidas precisam do aval da Câmara.