Correio braziliense, n. 20910, 23/08/2020. Saúde, p. 12

 

Atividade imune até 50 vezes maior

23/08/2020

 

 

Além da utilização de células de defesa humanas para o desenvolvimento de medicamentos para a covid-19, especialistas têm testado o poder dos anticorpos provenientes de animais. Os cientistas buscam nas cobaias uma reação imune ainda mais forte do que a humana. A primeira pesquisa sobre o tema foi feita por cientistas da Universidade do Texas, nos Estados Unidos. Em um artigo publicado, em maio, na revista especializada Cell, eles revelaram que anticorpos produzidos por lhamas foram capazes de combater com eficácia o Sars-CoV-2.

“Os anticorpos humanos ligam-se a uma proteína-chave, responsável pela proliferação do vírus. Observamos que algumas das células de defesa das lhamas também se ligam a essa peça-chave, mas tinham um efeito maior, pois reconheciam outras partes do patógeno. Isso faz com que elas lutem contra o vírus com ainda mais força”, detalha ao Correio Jason McLellan, professor de biociência molecular na Universidade do Texas e um dos autores do artigo.

Os pesquisadores realizaram testes laboratoriais com os anticorpos das lhamas e observaram resultados positivos em ratos infectados com covid-19. Eles pretendem dar continuidade ao estudo. “Queremos analisar, agora, em macacos e, depois, seguiremos para testes clínicos (em humanos), com esperança de repetir o sucesso que tivemos até agora, mesmo que demore um pouco mais. Obtivemos esses resultados iniciais rápidos porque já estávamos buscando anticorpos para tratar outros coronavírus”, conta McLellan.

Uma empresa de biotecnologia americana também encontrou anticorpos mais potentes para tratar a covid-19 em animais. Os pesquisadores do grupo SAb Biotherapeutics usaram vacas como cobaias. Na análise do sangue de animais infectados pelo Sars-CoV-2, os cientistas encontraram anticorpos com reações expressivas contra o coronavírus. Com base neles, desenvolveram o soro SAB-185. Em testes com ratos, o soro mostrou-se quatro vezes mais efetivo no combate à enfermidade, quando comparado aos anticorpos humanos. Os cientistas acreditam que poderão desenvolver medicamentos com base no soro de anticorpos das vacas.

Aposta nacional

Uma pesquisa brasileira é a mais recente a mostrar anticorpos de origem animal como uma esperança de tratamento para a covid-19. Cientistas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em parceria com outros grupos de pesquisa, infectaram cinco cavalos com uma proteína produzida em laboratório. A molécula foi desenvolvida para ter semelhanças ao vírus da covid-19 e, assim, provocar a produção das células de defesa ao vírus.

Os pesquisadores encontraram uma atividade imune 50 vezes mais potente no plasma retirado de equinos que receberam a proteína. “A proteína que produzimos mostrou-se muito efetiva para estimular a produção de anticorpos em cavalos, tendo-se obtido uma quantidade muito maior do que a de anticorpos encontrados em humanos que já contraíram covid-19”, relata, em comunicado emitido pela UFRJ, Leda Castilho, coordenadora do projeto e pesquisadora do Laboratório de Engenharia de Cultivos Celulares (Lecc) da instituição de ensino.

O grupo brasileiro pediu a patente da técnica. Enquanto espera o resultado, vai se concentrar no desenvolvimento de terapias com base no soro dos superanticorpos. Presidente do Instituto Vital Brazil, que participa do projeto, Adilson Stolet explica que o volume de plasma produzido é outro atrativo da abordagem. “Nós temos 300 animais, mas podemos comprar mais 500. Em dois meses, teríamos uma quantidade enorme de anticorpos.” (VS)