O globo, n. 31769, 30/07/2020. Economia, p. 24

 

Guedes condiciona isenção de IR a novo tributo

Daniel Gullino

Marcello Corrêa

Manoel Ventura

30/07/2020

 

 

Ministro da Economia diz que aprovação do imposto sobre pagamentos criaria “base ampla' de contribuintes, que permitiria elevar a faixa de salário livre de IR, além de reduzir as alíquotas de outras dez encargos

 O ministro da Economia, Paulo Guedes, sinalizou ontem que o aumento do limite de isenção do Imposto de Renda (IR) só será possível se o Congresso aprovar a criação do novo tributo sobre pagamentos, um dos pontos da reforma tributária em elaboração pelo Executivo. Segundo Guedes, o uso de uma “base ampla” de contribuintes permitirá reduzir alíquotas de até dez outros impostos.

— Podemos redistribuir, criar uma base ampla, nova, e aí você, se criar uma base ampla nova e tributar um pouco ali, pode reduzir o Imposto de Renda, eliminar alguns IPIs (Imposto sobre Produtos Industrializados), pode até reduzir, cinco, seis, sete, oito, dez impostos — afirmou Guedes.

O ministro participou de uma reunião sobre a reforma tributária no Palácio do Planalto e deu a declaração ao lado do relator da proposta, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). Está marcada para hoje a primeira reunião da comissão mista da reforma, formada por deputados e senadores.

O cenário traçado por Guedes é mais abrangente do que as propostas mencionadas até agora pela equipe econômica. Nelas, o novo imposto seria usado apenas para compensar a perda de arrecadação decorrente da desoneração da folha de pagamento — medida defendida pela equipe econômica desde o ano passado.

 ARRECADAÇÃO DE R$ 120 BI

Os estudos iniciais sobre o novo imposto indicam uma alíquota de 0,2% sobre transações eletrônicas — como transferências e pagamentos digitais — que renderia R$ 120 bilhões por ano. Esse valor seria suficiente, nos cálculos do governo, para permitir acabar com a contribuição previdenciária que incide sobre salários, nos contratos de até 1,5 salário mínimo.

Guedes não especificou qual seria o cenário em que o novo tributo seria suficiente para gerar uma arrecadação ainda maior, mas afirmou que “muita coisa pode ser feita” se contribuintes que não pagavam passarem a recolher pelo novo sistema.

—Se houver uma base ampla nova, ela permite extinguir vários impostos, fogão, geladeira, máquina de lavar roupa, aumentar a faixa de isenção, muita coisa pode ser feitas,e nós conseguimos uma base ampla que tribute quem não pagava antes e permita cobrar menos daqueles que já pagavam. Quando todos pagam, todos pagam menos. É isso que nós queremos fazer nessa reforma —afirmou Guedes.

Ampliar o limite de isenção do IR para até R$ 5 mil é uma promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro. Hoje, escapa da mordida do Leão quem recebe até R$ 1.903,98. A tabela de faixas salariais do imposto não é corrigida desde 2015. Na prática, essa defasagem faz com que, a cada ano, mais brasileiros passem a pagar IR.

A correção, no entanto, significa reduzir arrecadação, num momento em que os cofres públicos estão combalidos. Por isso, o governo busca uma fonte de receita para compensar a perda.

Segundo o ministro, o novo modelo é o mais adequado para isso, por tributar a chamada economia digital. Hoje, os projetos de reforma tributária na Câmara se concentram na criação de um imposto sobre valor agregado (IVA).

— Tem uma enorme economia em crescimento, uma economia digital, nova, surgindo. E o IVA era um imposto que pegava antes a indústria. Foi desenvolvido em meados do século passado para atingir a indústria. Ele também serve, porque estamos botando uma alíquota única para serviços, mas ele foi melhor desenhado para a indústria — argumentou o ministro.

SEM AUMENTO DE CARGA

O relator da reforma tributária afirmou que existe convergência sobre a necessidade de simplificar o pagamento de impostos, aumentar a transparência e distribuir a carga.

— Eu diria que o primeiro capítulo do relatório seria: não haverá aumento de carga tributária. Isso seria fundamental para que nós possamos ter uma reforma que vá impactar positivamente o nosso país. Todos desejamos ter um sistema que possibilite melhorar o ambiente de negócios, confiança no nosso país, que traga segurança jurídica, estabilidade, e que isso gere um impacto no nosso PIB, que é o que todos nós desejamos —disse.