O globo, n. 31769, 30/07/2020. País, p. 11

 

Toffoli suspende operações contra Serra

Aguirre Talento

Guilherme Caetano

30/07/2020

 

 

Decisão acontece no mesmo dia em que senador virou réu por lavagem de dinheiro em processo na Justiça Federal de São Paulo

 O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias T off o li, determinou a suspensão de duas investigações contra o senador José Serra (PSDB-SP), uma na primeira instância e outra na Justiça Eleitoral, que realizaram operações de busca e apreensão contra o tucano. A decisão de Toffoli acontece no mesmo dia em que Serra virou réu em processo na 6ª Vara Criminal da Justiça Federal de São Paulo, por lavagem de dinheiro.

Toffoli acolheu pedido da defesa de Serra em duas reclamações protocoladas diretamente ao STF. Os processos estão soba relatoriado ministro Gilmar Mendes, mas Toffoli concedeu as decisões no plantão judicial. No inquérito da 1ª Zona Eleitoral de São Paulo, Toffoli havia suspendido na semana passada a realização de busca e apreensão no gabinete de Serra, na Operação Paralelo 23, da Lava-Jato Eleitoral.

Na outra investigação, Serra já havia sido denunciado por lavagem de dinheiro pelaf orça-tarefada Lava Jato de São Paulo evirou réu ontem — ação penal que também foi suspensa pela decisão. Como o recebimento da denúncia aconteceu uma hora depois da decisão de Toffoli, é possível que ela também seja anulada. A investigação rastreou pagamentos da Odebrecht para uma conta da filha do senador, Verônica Serra, na Suíça. Ela também foi denunciada. Em 3 de julho, ele foi alvo de busca e apreensão, no mesmo dia em que a denúncia foi divulgada.

Os inquéritos f oram env ia dosà primeira instância eà Justiça Eleitoral por decisões anteriores do STF, que reconheceu a inexistência de foro privilegiado porque se tratavam de fatos anteriores ao atual mandato. Toffoli, entretanto, acolheu o pedido da defesa, que apontou a usurpação da competência do Supremo. A defesa argumentou que as duas operações de busca e apreensão determinadas contra o senador apresentavam risco de que fossem colhidos documentos relacionados ao atual exercício do seu mandato, o que seria atribuição do STF.

A operação da 6ª Vara Criminal, entretanto, nem solicitou buscas no gabinete do senador. Apesar disso, a defesa apontou que Serra foi alvo de buscas em sua residência e que, neste local, ele guardaria documentos sobre sua atividade parlamentar.

“Zeloso quanto ao desempenho das altas funções institucionais do Supremo Tribunal Federal e por reconhecer, na espécie, o caráter de urgência dope dido,qu enarra a existência defa tosques u geremo desrespeitoà competência constitucional da Corte e enunciado dasúmul avinculante, passoàanálise da medida cautelar pleiteada, reconhecendo, desde logo, aplausibilidade jurídica do direito vindicado neste juízo de cognição sumária”, escreveu na decisão.

Pela decisão de Toffoli, os inquéritos ficarão paralisados até que o relator dessas reclamações no STF, ministro Gilmar Mendes, analise o mérito do assunto e decida se as investigações podem tramitar na primeira instância ou se serão enviadas ao Supremo.

DECISÃO PODE SER ANULADA

Ontem, a Justiça Federal de São Paulo proferiu decisão aceitando a denúncia e tornando Serra e a filha Verônica Serra réus por lavagem de dinheiro. Esta ação penal também foi suspensa pela decisão de Toffoli. Como a decisão de recebimento da denúncia foi tomada uma hora depois da decisão de Toffoli, é possível que também seja anulada. O juiz Diego Paes Moreira, da 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo, ainda não havia sido intimado sobre a ordem do STF quando proferiu sua decisão. Ainda não houve ordem específica de Toffoli a respeito da suspensão da decisão que tornou Serra réu.

Serra foi denunciado por lavagem de dinheiro pela força-tarefa da Lava-Jato de São Paulo. Segundo a denúncia, os dois estariam envolvidos em esquema de lavagem de dinheiro por conta de obras do Rodoanel sul, entre 2006 e 2014. Após a denúncia, foram bloqueados R$ 40 milhões em uma conta em nome de Serra.

Segundo o MPF, o tucano se valeu do cargo e da influência política para receber da Odebrecht pagamentos indevidos em troca de benefícios relacionados às obras do Rodoanel Sul. Segundo a denúncia, a empresa pagou R$ 4,5 milhões entre 2006 e 2007 para a campanha de Serra ao governo de São Paulo.

Serra teria indicado que queria receber esse montante no exterior, por meio de uma offshore do empresário José Amaro Pinto Ramos, que é seu amigo. Os valores teriam sido movimentados em diferentes contas no exterior até 2014.

Ainda de acordo com as investigações, José Amaro Pinto Ramos e Verônica Serra constituíram empresas no exterior, ocultando seus nomes, e por meio dessas empresas receberam os pagamentos que a Odebrecht destinou ao então governador de São Paulo.

Serra não foi denunciado por corrupção, porque em 2018 o STF decidiu que crimes eventuais praticados por ele até 2010 estavam prescritos em razão da idade. Serra tem 78 anos. Aforça-tarefada Lava-Jato encontrou, porém, movimentações do valor recebido ilicitamente, pelo menos, até 2014, ou seja, a lavagem de dinheiro continuou acontecendo.

Serra não comentou sobre a decisão da Justiça. Ao saber da operação da Polícia Federal em seus endereços, o senador disseque a ação causou“estranheza e indignação ”.

Em nota, a defesa de Serra afirmou que “era evidente o excesso e ilegalidade das medidas determinadas contra o senador da República, em clara violação à competência do Supremo Tribunal Federal e em inegável tentativa de criar fantasias relacionadas a seu mandato parlamentar ”.“O recebimento da denúncia pela Justiça Federal, ocorrido após a decisão emanada da Suprema Corte, só confirma, outra vez mais, o desapego à Lei e à Constituição Federal por quem haveria de protegê-las”, diz a defesa. Ação penal que tornou Serra e a filha réus também foi suspensa e pode ser anulada