Correio braziliense, n. 20905, 18/08/2020. Política, p. 3

 

Fachin vê escalada autoritária

Renato Souza 

18/08/2020

 

 

O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), criticou a escalada do autoritarismo no país e afirmou que as eleições de 2018 teriam sido mais democráticas se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tivesse participado. Além de compor o plenário do Supremo, o magistrado integra o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Na abertura de um congresso de direito eleitoral on-line, Fachin falou em ameaças de intervenção contra as instituições. “O presente que vivenciamos, além de efeito da pandemia, está tomado de surtos arrogantes e ameaças de intervenção. E, por isso, infelizmente, o futuro está sendo contaminado de despotismo”, frisou.

Fachin afirmou que o Brasil vive um cenário de recessão da democracia. “Os elevados índices de alienação eleitoral e a fragilidade do apoio positivo à forma democrática de governo têm demonstrado que, inequivocamente, vivemos uma recessão democrática”, enfatizou.

Ele colocou em dúvida o pleito de 2022. “As eleições presidenciais de 2022 podem ser comprometidas se não se proteger o consenso em torno das instituições democráticas. A defesa desse consenso em torno das instituições democráticas mostra um elemento imprescindível para a saúde da democracia.”

O magistrado não citou nomes, mas disse que existe um “cavalo de Troia dentro da legalidade constitucional do Brasil”, em referência a autoridades que se opõem a manifestações contrárias ao regime militar. “Esse cavalo de Troia apresenta laços com milícias e organizações envolvidas com atividades ilícitas. Conduta de quem elogia ou se recusa a condenar ato de violência política no passado”, declarou.

A revista Piauí revelou que o presidente Jair Bolsonaro decidiu interferir no STF, em maio deste ano. Ele chegou a fazer as declarações para ministros militares, de acordo com a publicação. Apesar de o general Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), se manifestar contrário à medida, afirmando que “ainda não é o momento”, a decisão do chefe do Executivo foi encarada com ar de normalidade. Nenhuma autoridade do Executivo comentou o caso.

Fontes ouvidas pelo Correio apontam que a informação chegou ao Supremo poucos dias depois. Os ministros receberam com perplexidade, mas apenas o decano da Corte, Celso de Mello, reagiu na época, com uma nota crítica, afirmando que era “preciso reagir à destituição da ordem democrática”.

Petista

Fachin defendeu, ainda, que Lula deveria ter sido autorizado a manter sua candidatura nas eleições de 2018. Na época, o magistrado votou a favor da autorização para que o petista continuasse no pleito. O ex-presidente foi excluído por seis votos a um, em decorrência de condenações em segunda instância, decorrentes da Operação Lava-Jato. Lula foi sentenciado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), por corrupção, o que gerou sua inelegibilidade com base na Lei da Ficha Limpa.

“No julgamento no TSE, em que esteve em pauta a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, fiquei vencido, mas mantenho a convicção de que não há democracia sem ruído, sem direitos políticos de quem quer que seja. Não nos deixemos levar pelos ódios”, destacou. Ele criticou políticos eleitos que desacreditam as instituições, espalham notícias falsas e chamam oponentes de criminosos. “Atentemos para aqueles que consideram os princípios constitucionais um estorvo”, emendou.

Frase

“Os elevados índices de alienação eleitoral e a fragilidade do apoio positivo à forma democrática de governo têm demonstrado que, inequivocamente, vivemos uma recessão democrática”

Edson Fachin, ministro do STF