O globo, n. 31745, 06/07/2020. Sociedade, p. 6
Ministério da educação segue a deriva
Paula Ferreira
Naira Trindade
06/07/2020
Rejeitado por aliados do governo, Renato Feder recusa chefia da pasta
Sem ministro titular há mais de duas semanas e com diversas ações que afetam milhões de estudantes paralisadas, o Ministério da Educação (MEC) teve ontem mais um candidato ao cargo excluído antes de assumir.
O secretário de Educação do Paraná, Renato Feder, anunciou ter desistido do convite feito por Jair Bolsonaro para comandar a pasta. Em suas redes sociais, disse ter recebido ligação do presidente na quinta-feira e afirmou que, apesar de “muito honrado com o convite”, continuará conduzindo os trabalhos na secretaria estadual.
Fontes próximas a Feder revelam que a postura do presidente após o vazamento do convite para o MEC contrariou o secretário do governo de Ratinho Júnior (PSD). Depois do telefonema de quinta-feira, Feder já havia trocado mensagens com Bolsonaro e combinado ficar em silêncio até a nomeação.
Mas o fato de o presidente não ter se posicionado quando evangélicos e olavistas começaram a atacá-lo irritou o secretário, que considerou a atitude “desrespeitosa”.
O GLOBO apurou que Bolsonaro já tinha avisado a alguns parlamentares que o nome de Feder “estava fora” por pressão das alas ideológicas. Em um movimento político, o secretário se antecipou ao que seria sua segunda não nomeação ao cargo — ele havia sido considerado pelo presidente antes da escolha de Carlos Alberto Decotelli, que acabou defenestrado após revelações de falhas em seu currículo acadêmico —e anunciou que recusara o convite.
Interlocutores de Feder dizem que ficou a impressão de que Bolsonaro o deixou “cozinhando em banho maria” enquanto ele “apanhava” de aliados do próprio presidente. Antes de divulgar a nota declinando do convite, Feder já havia se pronunciado no Twitter sobre acusações que vinha recebendo desde que seu nome veio a público como o escolhido pelo presidente.
O convite provocou reação negativa em vários núcleos do governo, principalmente na ala evangélica, que reivindicou diretamente ao presidente que ele voltasse atrás.
Na sexta-feira, O GLOBO revelou que o pastor Silas Malafaia foi um dos que conversaram com Bolsonaro se opondo à indicação de Feder. Na ocasião, embora já tivesse convidado o secretário, o presidente afirmou a Malafaia que a decisão ainda não estava tomada. Desde então, a incerteza em torno da nomeação aumentou.
Além dos evangélicos e da ala olavista do governo, parte dos militares também se opôs a Feder. Os motivos eram variados: desde sua ligação com o governador paulista João Doria (PSDB) no passado até sua suposta proximidade com o grupo Lemann, por conta de parcerias firmadas na secretaria de Educação do Paraná. O fato de ser um nome ligado à classe política, no que se traduzia como um possível aceno de Bolsonaro ao Centrão, também incomodou.
CENÁRIO DE CRISE
Ontem, antes da recusa, Renato Feder postou no Twitter que gostaria de ser avaliado pelo que “pensa e faz hoje, como gestor público, ao invés de um livro escrito há quinze anos”.
Ele se referia a “Carregando o Elefante – Como transformar o Brasil no país mais rico do mundo”, que escreveu em 2007 com Alexandre Ostrowiecki. Nele, defendeu a proposta de utilizar “vouchers” para parte da educação pública. Na obra, também questionou se o Estado era de fato o ente ideal para conduzir a administração das redes escolares.
Em um ano determinante para a área, com o fim da vigência do Fundeb, principal fundo de financiamento da educação básica, o MEC enfrenta uma crise de grande proporção sem comando e projetos claros. Além da PEC do novo Fundeb, que aguarda votação na Câmara dos Deputados, o ministério precisa conduzir o processo de retorno às aulas após a pandemia e decidira datado E nem, adiado devido ao novo coronavírus (veja abaixo mais detalhes dos desafios que o novo ministro terá que enfrentar). Desde a saída de Abraham Weintraub, anunciada em 18 de junho, o governo tenta encontrar um substituto para a pasta, sem sucesso.
Bolsonaro chegou a nomear o professor Carlos Alberto Decotelli, cuja permanência no cargo durou apenas cinco dias. Ele pediu demissão após a divulgação de que seu currículo continha informações falsas e também enfrentou acusações de plágio em sua dissertação de mestrado.
A decisão sobre quem deve finalmente assumir o MEC é esperada para esta semana. Até atarde de ontem, dois nomes despontavam como favoritos: Anderson Correia, ex presidente da Cape serei tordo Instituto Tecnológico de Aeronáutica; e Ilona Becskeházy, atual secretária de Educação Básica do MEC. Uma parte do grupo militar no governo com interface com os evangélicos tenta emplacar Correia. Ilona conta como apoio de ola vistas.
Com a indecisão em relação à sucessão, o MEC se soma ao Ministério da Saúde na falta de um titular no comando. Em meio à maior pandemia do século, a pasta está há quase dois meses soba direção interina do general Eduardo Pazuello.