O globo, n. 31750, 11/07/2020. País, p. 5
Do Planalto ao STF
11/07/2020
Perfil de assessor de Bolsonaro, excluído pelo Facebook, fez ataques ao Supremo
Entre as contas excluídas pelo Facebook por “comportamento inautêntico” está perfil utilizado por assessor de Bolsonaro que atacou STF. Rede hostilizou adversários políticos já no mandato do presidente.
Páginas e contas de usuários derrubadas pelo Facebook na última quarta-feira, por apresentarem comportamento considerado inautêntico e coordenado, foram utilizadas por assessores do presidente Jair Bolsonaro e de aliados para atacar adversários durante a campanha eleitoral de 2018 e após a chegada dele ao governo, no início do ano passado. Entre os alvos das publicações feitas pela rede, estavam também menções hostis ao Supremo Tribunal Federal (STF). Conteúdos removidos pela rede incluíam ataques ao STF que partiram do assessor especial da Presidência Tércio Arnaud Thomaz, que trabalha no terceiro andar do Palácio do Planalto. Além disso, uma publicação feita por Tércio foi utilizada pelo próprio Bolsonaro no ano passado para rebater apoiadores durante o debate sobre a indicação do novo procurador-geral da República.
Os registros constam em material obtido pelo GLOBO junto à pesquisadora Luiza Bandeira, do Digital Forensic Research Lab (DFRLab), ligado ao Atlantic Council, parceiro do Facebook nas investigações que desmontaram a rede de desinformação formada por 88 páginas. Há mensagens publicadas do segundo semestre de 2018 até o mês passado, quando o ânimo dos bolsonaristas se acirrou em relação ao STF, após a deflagração de operações contra militantes e empresários que apoiam o presidente.
Em 25 de abril deste ano, um dia após Sergio Moro apresentar seu pedido de demissão do Ministério da Justiça e Segurança Pública, a página do Instagram “Bolsonaro Newsss”, comandada por Tércio, publicou uma imagem na qual o ex-juiz federal aparece apunhalando Bolsonaro pelas costas, enquanto o presidente, vestido com uniforme militar, oferece proteção a ele diante de facas e de uma granada. Associados aos armamentos, no papel de algozes dos dois, estão o STF, o Grupo Globo e o site “The Intercept Brasil”. A mensagem, que incluía a frase “O traidor silencioso”, recebeu 16,4 mil reações positivas entre 492 mil seguidores da conta.
Outras menções à Corte foram feitas por Paulo Eduardo Lopes (conhecido como Paulo Chuchu), assessor do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), e Vanessa Navarro, assessora do deputado estadual Anderson Moraes (PSL-RJ). Lopes disponibilizou uma ilustração de Bolsonaro portando um fuzil diante do
Congresso Nacional e debochou do ministro do STF Celso de Mello, sugerindo que a atuação dele o teria transformado em cabo eleitoral da reeleição do presidente. Vanessa, por sua vez, produziu uma imagem comr eferências a suas páginas pessoais para divulgar ah ashtag# STF Escritório do Crime.
— A rede deletada pelo Facebook utilizava mecanismos, como contas falsas, que enga vamos usuários e passavama sensação de que há uma adesão mais ampla a esses temas Do que aquela que acontece de maneira orgânica — explica Luiza Bandeira.
FÔLEGO CONTÍNUO
Os registros do DFRLab indicam que as engrenagens da máquina bolsonarista estavam ativas pelo menos desde 2018. No período eleitoral, Tércio, por exemplo, fazia ataques a Fernando Haddad, candidato do PT à Presidência, e Marina Silva, postulante pela Rede. Publicações da página “Bolsonaro Newsss” chamaram Haddad de fascista
E criticaram Marina por sua posição sobre a a legalização do aborto. Não havia identificação de quem era o responsável pela conta. Leonardo Rodrigues, que era lotado no gabinete da deputada estadual Alana Passos (PSL-RJ) até abril, também atuou na eleição, utilizando a página “Bolsonéas”. Uma imagem compartilhada por ele exaltava Bolsonaro e ironizava Marina junto ao ex-presidente Lula(PT)eaosex-candidatosà Presidência Guilherme Boulos (PSOL), Manuela D’Ávila (PCdoB), Ciro Gomes (PDT) e Geraldo Alckmin (PSDB). A rede ganhou eco através de ações de Bolsonaro e seus filhos. Enquanto o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) compartilhou a publicação da página “Bolsonéas” contra os adversários do pai em 2018, o presidente utilizou, em agosto passado, uma crítica da página “Bolsonaro Opressor 2.0’”, administrada por Tércio, para justificar sua posição na nomeação do procurador-geral da República.
Em resposta a seguidores que pediam que o coordenador da força-tarefa da LavaJato em Curitiba, Deltan Dallagnol, fosse indicado à PGR, Bolsonaro compartilhou publicação da página sugerindo que ele se posiciona à esquerda do espectro político e teria ligação com o PSOL. Anteontem, em uma transmissão ao vivo, Bolsonaro reclamou da remoção promovida pelo Facebook , dissequeéalv ode“perseguição” eque“s obrou” para quem o apoia. O presidente também reclamou que há páginas de esquerda que o associam ao nazismo eque não foram derrubadas.
— A onda agora é dizer que as páginas da família Bolsonaro e de assessores promovem o ódio. Eu desafio a imprensa que fica dando espaço pra isso me apontar um texto meu de ódio —disse Bolsonaro. Também após as remoções, Eduardo Bolsonaro afirmou que há uma perseguição das redes sociais contra usuários de direita e afirmou que avaliaria ações jurídicas contra o Facebook. Anderson Moraes disse que a plataforma foi covarde e Alana Passos alegou não ter sido notificada de irregularidades pela empresa.