Correio braziliense, n. 20899, 12/08/2020. Mundo, p. 12

 

Presidente e premiê foram advertidos sobre o perigo

12/08/2020

 

 

O então primeiro-ministro do Líbano, Hassan Diab, e o presidente do país, Michel Aoun, receberam uma carta, em 20 de julho, em que foram advertidos pela Direção Geral de Segurança do Estado sobre os riscos representados pelas 2.750t de nitrato de amônio armazenadas no porto de Beirute. O procurador-geral, Ghassan Oweidat, também teria apresentado aos líderes um relatório sobre o assunto. A informação foi divulgada pela agência de notícias Reuters, que teve acesso à correspondência, e atestada por autoridades de segurança. Dezesseis dias depois, o armazém número 12 sofreu uma explosão seguida de onda expansiva que devastou o porto e uma parte do centro de Beirute, matando pelo menos 171 pessoas e ferindo mais de 6 mil. Apesar da renúncia de Diab e de seu gabinete, os manifestantes retornaram às ruas da capital e chegaram a queimar barricadas nas imediações do Parlamento. Também lançaram pedras contra policiais.

Sob condição de anonimato, uma fonte que participou da redação da carta contou ter alertado que, em caso de explosão, o material poderia destruir Beirute. Diab teria repassado a mensagem para o Conselho Supremo de Defesa e solicitado um prazo de 48 horas para receber instruções. Nem Diab nem Aoun tomaram providênncias. “Eu não sou o culpado! Eu não sabia onde (nitrato de amônio) etava e como era perigoso. Não tenho autoridade para lidar diretamente com o porto. Existe uma hierarquia e todos aqueles que sabiam (do composto químico) deveriam saber de seus direitos para fazer o que fosse necessário”, declarou o presidente, na semana passada.

“Certamente, o presidente e o então premiê receberam advertências de que o composto químico, bastante volátil, poderia causar graves problemas”, disse ao Correio Makram Rabah, professor do Departamento de História e Arqueologia da Universidade Americana Libanesa. “É preciso questionar por qual motivo o nitrato de amônio estava ali e se dividia o espaço com munições, foguetes ou morteiros do Hezbollah”, acrescentou. “Nesse sentido, a insistência de Diab de que a explosão foi um acidente químico mostra-se imprecisa.

O analista político e jornalista libanês Moufid Mustafa descarta punição ao ex-premiê e ao presidente. “O Líbano vive um regime sectário. Em toda a história, somente um presidente renunciou, Bechara Khoury (1943-1952). Michel Aoun somente poderia entregar o cargo se o chefe da Igreja Maronita  aceitasse ou exigisse sua demissão. Além disso, o presidente é o aliado mais importante do Hezbollah e age para blindar o movimento xiita. Tudo no Líbano gira em torno da corrupção. O Judiciário é corrupto; por isso, considero difícil pensar em uma punição”, disse à reportagem. (RC)