Correio braziliense, n. 20898, 11/08/2020. Cidades, p. 18

 

Concessão deixa dúvidas

Augusto Fernandes

Jéssica Eufrásio

11/08/2020

 

 

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) autorizou, ontem, a abertura do processo de concessão à iniciativa privada do Parque Nacional de Brasília, também conhecido como Água Mineral, e do Parque Nacional de São Joaquim (SC). As duas unidades continuarão sob gestão, fiscalização e proteção do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). As empresas escolhidas, contudo, terão de prestar serviços de apoio à visitação, à conservação, à proteção e à gestão das unidades. Os investimentos deverão ocorrer de forma regulada, nos termos contratuais e por período determinado.

A Secretaria-Geral da Presidência da República informou que o decreto busca aumentar o acesso à população e otimizar o uso de recursos públicos. A mudança ocorre no âmbito do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) e inclui as duas unidades no Programa Nacional de Desestatização (PND) do Governo Federal. Os parques nacionais da Tijuca (RJ), do Iguaçu (PR) e de Fernando de Noronha (PE) são alguns locais cuja administração foi concedida a empresas privadas. Nesses três casos, as concessionárias ficaram responsáveis pela exploração das áreas de uso público.

Outras unidades geridas pelo ICMBio, como o Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses (MA), o Parque Nacional de Jericoacoara (CE) e o Parque Nacional do Iguaçu (PR) entraram no PND em dezembro. No entanto, um projeto de decreto legislativo protocolado pelo deputado federal José Guimarães (PT/CE), no mesmo mês, tenta sustar os efeitos da medida, por considerá-la inconstitucional. A proposta está parada na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara Federal desde a apresentação.

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, afirmou que a concessão dos espaços pode durar 15 anos, mas acrescentou que há possibilidade de os contratos durarem o dobro, caso sejam prorrogados. No DF, além da Água Mineral, a Floresta Nacional de Brasília (Flona) também deve ser concedida à iniciativa privada. “São as unidades que nós entendemos que têm grande potencial de turismo e (estão) subutilizadas, subvisitadas. A gente entende que essa é uma grande oportunidade para os brasileiros”, afirmou Salles durante visita ao Parque Nacional de Brasília, em 30 de julho.

Possibilidades

Presidente da Associação dos Amigos do Parque Nacional de Brasília (Afam), Moacir Putini teme que a mudança gere prejuízos, como restrições e aumento de preços. Para ele, a comparação com outros parques nacionais geridos por concessionárias não faz sentido pela diferença de características entre as unidades. “A Água Mineral é uma área de lazer da população daqui. Ela é mais acessível. Mas vamos tentar dois caminhos — o jurídico e o político, junto à bancada federal do DF — para sugerir uma parceria entre o Governo do Distrito Federal e o Ministério do Meio Ambiente (no lugar da concessão)”, afirmou Moacir.

Especialista em meio ambiente e professor do Centro Universitário Iesb, Luiz Fernando Ferreira considera que o resultado pode ser positivo se tratar apenas de serviços turísticos prestados. “O problema é que o decreto transfere à iniciativa privada não só a concessão dos serviços, mas também a gestão do parque como um todo, incluindo a conservação. Isso é uma obrigação da gestão pública. Há uma previsão no Sistema Nacional de Unidades de Conservação de fazer a concessão dos serviços, o que inclui a conservação, mas seria para uma organização da sociedade civil, não para a iniciativa privada”, comenta. “Se a empresa tiver de decidir entre lucrar mais ou deixar uma área de proteção intangível de acordo com o plano de manejo, ela pode optar pela exploração em detrimento da conservação.”

Professor de gestão ambiental da Universidade de Brasília (UnB), Gustavo Souto Maior destaca que o orçamento da União destinado ao ICMBio para a manutenção de mais de 300 unidades de conservação é ínfimo. Ele acredita que, se o processo ocorrer de maneira bem-feita, pode melhorar as condições de preservação. “Com certeza, há uma questão econômica por trás. São parques com potencial turístico muito grande. Mas eles continuarão sob responsabilidade do Estado. O que será concedida é só a parte destinada a uso público. Como você controla isso? Revendo o plano de manejo e garantindo o cumprimento dele, com a sociedade civil participando desse controle”, orienta o pesquisador.

Novo bairro

O Exército Brasileiro deve apresentar amanhã de manhã o plano de Uso e Ocupação do solo da região conhecida como Pátio Ferroviário de Brasília (PFB). A área, localizada na extremidade oeste do Eixo Monumental, deve ser o último bairro construído no Plano Piloto. De acordo com o Exército Brasileiro, responsável pela área desde 2006, o Plano de Ocupação foi elaborado com o objetivo de criar um bairro inovador, com conceitos modernos de sustentabilidade e de cidades inteligentes, cujo urbanismo e arquitetura serão referências no país. O terreno é delimitado a sul pela Via Estrutural (EPCL), a oeste pelo Regimento de Cavalaria de Guarda (RCG), a norte pela Estrada Parque Armazenamento e Abastecimento (EPAA) e a leste pela Estrada Parque Indústria e Abastecimento (EPIA) e pelo Setor de Armazenamento e Abastecimento Norte (SAAN).