Correio braziliense, n. 20898, 11/08/2020. Economia, p. 7

 

Compensações para desoneração da folha

Marina Barbosa 

11/08/2020

 

 

Para cumprir a promessa de desonerar a folha de pagamentos das empresas, o governo vai precisar aumentar impostos ou fazer uma nova reforma da Previdência. O aviso é da assessora especial do Ministério da Economia, Vanessa Canado, que discutiu, ontem, os impactos da reforma tributária com o setor de serviços.

“Não tem outro caminho para desonerar a folha senão mexer na receita ou na despesa. A gente não tem segredo. A gente vai ter de avançar nessa discussão, debatendo uma nova base (de arrecadação) ou aumento de outros tributos... Ou uma nova reforma da Previdência, daqui a alguns anos, quem sabe”, alertou Vanessa Canado.

A assessora do ministro da Economia falou sobre o assunto após ser questionada por empresários do setor de serviços sobre o andamento da proposta de desoneração da folha. Esta é uma promessa de Guedes para estimular a geração de empregos após a pandemia do novo coronavírus. Além disso, a redução dos custos trabalhistas pode aliviar o aumento de impostos que a reforma tributária vai impor ao setor.

Vanessa Canado assegurou que a proposta está na pauta, pois é “um assunto caro ao ministro (Paulo Guedes) e um tema recorrente em todas as nossas reuniões”. E garantiu que a equipe econômica tem “buscado todas as alternativas possíveis” para bancar a redução dos encargos trabalhistas.

Cenários

Segundo a assessora, a equipe econômica tem trabalhado em vários cenários: “com substituição de tributos em uma nova base de incidência; sem uma nova base de incidência; até onde podemos ir”. Porém, o ministro Paulo Guedes já defendeu diversas vezes a criação de uma base ampla de arrecadação para compensar a desoneração da folha.

Para o ministro, a redução dos encargos trabalhistas deve ser custeada pela criação de um imposto que incida sobre as transações eletrônicas, nos moldes da antiga Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). A proposta, contudo, divide a sociedade e o Congresso. Por isso, ainda não foi apresentada oficialmente pelo governo.

Vanessa Canado não falou diretamente sobre a “nova CPMF”, mas admitiu que a desoneração da folha vai exigir certo sacrifício. Ela argumentou que “hoje, o Brasil não tem condições de reduzir a carga tributária”, especialmente por conta da crise instalada pela pandemia do novo coronavírus. E disse que, por isso, “quando a gente fala de uma alíquota menor para qualquer coisa, imediatamente a gente fala de uma alíquota maior para outra”. “A gente não tem condições de diminuir a carga. Então, alguém vai pagar a conta”, afirmou.

Outra solução, segundo ela, seria rever novamente os benefícios previdenciários para reduzir as despesas do governo. “Não é fácil. No ano passado, a arrecadação de contribuições previdenciárias foi de R$ 440 bilhões. É muito dinheiro. A gente construiu um sistema previdenciário generoso, que continua sendo generoso mesmo após a reforma da Previdência e que, portanto, precisa ser custeado”, frisou.

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Guedes: "Não se assustem com alíquota"

11/08/2020

 

 

Pressionado pelos setores que temem ser prejudicados com a reforma tributária proposta pelo governo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, pediu que o empresariado não se assuste com a alíquota de 12% da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que deve substituir o PIS e a Cofins. Guedes alegou que a CBS vai permitir deduções ao longo da cadeia produtiva e garantiu que o governo ainda pode reduzir essa alíquota se ela “se revelar muito exagerada”.

“Não se espantem com a alíquota, que era de 3%, 4% e agora vai para 12%. Na verdade, esses 12% permitem deduções ao longo da cadeia”, afirmou Guedes, em live com representantes do setor de produção de leite, promovida, ontem, pela Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).

O ministro ainda garantiu que, como o intuito da reforma tributária é simplificar o sistema tributário, esses créditos poderão ser utilizados rapidamente pelos produtores. “O sistema é muito mais simples. Vai facilitar as exportações e permitir a compensação praticamente instantânea desses créditos, que hoje ficam acumulados e vocês demoram a receber. Não se assustem, estamos falando de simplificação”, disse Guedes.

Secretário especial da Receita Federal, José Barroso Tostes Neto lembrou que a proposta de reforma tributária do governo pretende extinguir diversos tratamentos tributários diferenciados, mas mantém o regime de crédito presumido do agronegócio. “Houve apenas um ajuste na alíquota, em função da redução da base de cálculo. Mas estamos dialogando com todos os setores, mostrando estimativas e cálculos e recebendo contribuições”, afirmou.

Guedes admitiu que o governo ainda pode rever a alíquota de 12% da CBS caso os cálculos da equipe econômica sejam contestados. “Fizemos a primeira proposta. Se isso se revelar muito exagerado, a gente baixa. Mas é importante perceber que uma alíquota de 10%, 11% ou 12%, hoje, é equivalente a uma alíquota de 4% ou 3% ou 5% do PIS/Cofins antigo”, argumentou o ministro.

Na semana passada, em audiência pública da comissão mista do Congresso que debate a reforma tributária, Guedes já havia admitido a possibilidade de rever essa alíquota ao ser questionado sobre o impacto da reforma no setor de serviços, que hoje é tributado em 3,65% no regime de PIS/Cofins. Porém, na ocasião, destacou que essa revisão só deve ser feita caso a alíquota eleve a carga tributária global do país.

Ainda assim, os deputados que representam a cadeia leiteira ressaltaram a preocupação com os impactos da reforma tributária, tanto por conta da alíquota da CBS, quanto do fim de benefícios fiscais que hoje beneficiam o setor. “Entendemos que precisamos desburocratizar, sistematizar e facilitar o sistema tributário, porque as pessoas de fora têm medo de investir no Brasil. A gente entende que é importante. Mas não queremos correr o risco de que as mudanças impactem diretamente no nosso produtor”, disse a deputada federal Aline Sleutjes (PSL-PR).

Da mesma forma, o setor de serviços mostrou-se preocupado com a alíquota de 12% da CBS em live realizada mais cedo, ontem, com a assessora especial do Ministério da Economia, Vanessa Canado. Ao contrário da agropecuária, o setor de serviços não deve ser muito beneficiado pelas deduções ao longo da cadeia, já que é intensivo em mão de obra. (MB)

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Debate longo no Congresso 

Alessandra Azevedo

11/08/2020

 

 

A participação do ministro da Economia, Paulo Guedes, na comissão mista que discute a reforma tributária no Congresso, na última quarta-feira, marcou o reinício dos trabalhos do colegiado. Mas ainda há muitos encontros e discussões previstos até que algum projeto seja aprovado. Antes de chegarem a um consenso quanto ao texto final, parlamentares vão ouvir, nas próximas semanas, a opinião de estados e municípios, além de representantes de vários setores da economia, alguns com propostas bem diferentes das do governo federal.

A expectativa mais otimista, do presidente da comissão mista, senador Roberto Rocha (PSDB-MA), é de que será possível aprovar a reforma no colegiado até a segunda quinzena de outubro. “Estou animado, pois vejo muito interesse no tema, apesar de ser árido, muito complexo. Acho viável que, nos próximos 60 dias, nós possamos limpar a pauta, no sentido de fazer as audiências públicas necessárias. E, em seguida, votar”, afirmou. A participação da equipe econômica, para ele, enriqueceu o debate.

O primeiro vice-relator da comissão, senador Major Olímpio (PSL-SP), discorda e acha difícil que o prazo seja mantido. Entre os obstáculos para que o colegiado consiga aprovar, em menos de três meses, um texto consensual, ele aponta a falta de engajamento do governo, que enviou um texto sem especificar os cálculos que levaram à escolha por uma alíquota de 12% para o novo tributo que substituirá o PIS e a Cofins. “Dá para ficar um pouco cético com essa data, porque nem cálculos temos ainda para avançar sobre a proposta. Sou pragmático. Não é pessimismo, é pé no chão", disse o parlamentar.

Além disso, ainda que o governo encaminhe o que falta até 15 de agosto, como promete, e que o colegiado aprove o texto, “será necessário combinar com o vírus” para que o plenário vote ainda este ano, acrescentou Major Olímpio. “O ideal é que seja votada presencialmente, por ser uma mudança robusta, em uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição). Não sabemos como estará a situação do coronavírus nos próximos meses. Se voltarmos ao plenário somente em setembro, estará muito perto das eleições municipais. O Congresso esvazia nesses períodos”, lembrou.

Após passar pelo colegiado, a matéria vai para a Câmara e, em seguida, para o Senado. Na fase atual, há apenas audiências públicas.