Correio braziliense, n. 20894, 07/08/2020. Política, p. 3

 

Justiça nega criar dossiês

Jorge Vasconcellos

07/08/2020

 

 

O Ministério da Justiça (MJ) afirmou, em documento enviado, ontem, à ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), que a Secretaria de Operações Integradas (Seopi) não produz dossiês “contra nenhum cidadão” e não instaura “procedimentos de cunho inquisitorial”. A secretaria foi acusada de produzir um relatório sigiloso, sobre 579 servidores públicos da área de segurança, identificados como integrantes do movimento antifascismo e opositores do presidente Jair Bolsonaro. A existência do dossiê foi divulgada pelo site UOL.

“A Seopi reitera que sua área de inteligência atua subordinada à mais estrita legalidade, em consonância com os marcos e limites normativos impostos à atividade de inteligência e, portanto, sem qualquer viés investigativo, punitivo e persecutório”, afirmou o ministério no documento.

Na última terça-feira, Cármen Lúcia deu prazo de 48 horas para que o governo esclarecesse o caso ao STF por meio do envio de informações. A ministra é relatora de uma ação da Rede Sustentabilidade que pede a “imediata suspensão da produção e disseminação de conhecimentos e informações de inteligência estatal produzidos sobre integrantes do ‘movimento antifascismo’ e professores universitários”. O ministério defende o arquivamento da ação sob argumento de que o partido não conseguiu demonstrar a existência dos atos que denunciou.

A pasta pede, ainda, “parcimônia e sensibilidade” do STF para que o tema seja objeto de fiscalização do Congresso, como é praxe. “Espera-se, assim, parcimônia e sensibilidade do supremo para que, exercitando a autocontenção, abra espaço para que a Comissão de Controle Externo da Atividade de Inteligência do Congresso promova oportunamente suas atividades de controle externo, em homenagem ao equilíbrio entre os poderes e ao estrito e rigoroso mecanismo de conformação, sob pena de, a pretexto de apurar suposto desvio de finalidade, acabar por invadir a competência do Legislativo.

Efeitos

No documento em que presta esclarecimentos ao STF, o ministério pondera que um eventual compartilhamento de informações com o Poder Judiciário poderia ter efeitos nos trabalhos de inteligência. “A submissão dos documentos produzidos ao Poder Judiciário, ainda que cercada de cautelas, poderia colocar em risco o sistema de salvaguardas das informações e documentos de inteligência e, por consequência, comprometer a credibilidade interna e externa da República Federativa do Brasil no que se refere à estrita obediência dos parâmetros internacionais que regem a Atividade de Inteligência.”

A nota segue: “O compartilhamento, desapartado dos ditames da legislação de regência da Atividade de Inteligência, significaria não somente a desconstrução da credibilidade interna e externa da própria República Federativa do Brasil, perante a comunidade internacional de inteligência, assim, corporificando a assunção direta da responsabilidade pelo Poder Judiciário sobre eventuais prejuízos que possam vir a ser suportados pelo Estado, pelas agências de inteligências, por seus servidores e por suas respectivas fontes, com elevado risco de danos irreparáveis, inclusive à vida dos envolvidos”.