Correio braziliense, n. 20885 , 29/07/2020. Negócios, p.10

 

Pobreza extrema diminui

Vera Batista

29/07/2020

 

 

Pesquisa revela o impacto do auxílio emergencial na redução do contingente de brasileiros que vivem em profunda vulnerabilidade econômica. Especialistas reconhecem o valor social do benefício, mas alertam para o dilema fiscal que se apresenta ao governo

O auxílio emergencial teve efeito imediato na redução da miséria no Brasil. Entre maio e junho de 2020, a população em pobreza extrema (com renda inferior a US$ 1,90 por dia, equivalente a R$ 154 mensais) caiu de 4,2% para 3,3%. O percentual de brasileiros em situação de pobreza (com renda menor de US$ 5,50 por dia, ou R$ 446 mensais) também diminuiu de 23,8% para 21,7%. Os dados são de estudo do pesquisador Daniel Duque, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).

O levantamento aponta que, no período, o principal responsável pelo encolhimento da pobreza foi o auxílio emergencial, que ampliou o atendimento de 45% para 50% da população de baixa renda. Como resultado, os níveis de penúria são os menores já registrados por todas pesquisas domiciliares brasileiras. Nos anos 1980, quase 15% dos brasileiros sofriam com a pobreza extrema. Ou seja, o socorro dado pelo governo aos mais pobres criou uma situação nunca vista nos últimos 40 anos.

Para o pesquisador, o estudo, mais do que um reconhecimento da importância do auxílio emergencial durante a pandemia do coranavírus, aponta uma preocupação real com o que vai acontecer com uma parcela significativa da população brasileira quando acabar o estado de calamidade, em 31 de dezembro. “O auxílio mostrou que as políticas sociais no Brasil são mal desenhadas. A retirada desses R$ 600 mensais tende a levar a extrema pobreza aos níveis de 2007”, ressalta Daniel Duque. Os 3,3% da população, hoje, representam 6,9 milhões de pessoas.

Em 2007, 9,2% da população (17,5 milhões) viviam na extrema pobreza. “Mas a população do país aumentou. Esse percentual, atualmente, significa 19,3 milhões de cidadãos”, contabilizou Duque. Ou seja, no início de 2021, a tendência é a população miserável mais que triplicar se nada for feito. “E quando se olha para os níveis de renda, se constata que o aumento das desigualdades explodiu. Os mais ricos elevaram a renda durante a pandemia, e os mais pobres viram o dinheiro minguar no bolso”, reforçou.

Invisíveis

Para o economista Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas, se houve algo de “positivo na pandemia foi a descoberta dessas pessoas invisíveis e informais, alguns sem certidão de nascimento ou CPFs”. O grande dilema do governo será retirar o auxílio emergencial, de caráter temporário, sem traumas e sem ferir as expectativas de ganho. “Certamente, os níveis de pobreza vão aumentar depois”, admite.

O governo está em uma encruzilhada, na análise do economista. “Precisará incorporar ao ‘Renda Brasil’ parte do auxílio emergencial, para evitar que volte a aumentar a faixa da extrema pobreza. Por outro lado, não poderá aumentar o gasto social em função da grave situação fiscal e de dispositivo constitucional, o teto de gastos”, sinalizou.

“Creio que somente teremos detalhes da nova política social no encaminhamento do Orçamento da União de 2021, o que ocorrerá até 31 de agosto. Há muitas dúvidas, a começar pelo teto de gastos, estimado para o ano que vem em R$ 1,483 trilhão”, lembra.

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Benefício para mais 800 mil

Renata Rios

29/07/2020

 

 

Mais 800 mil pessoas foram consideradas aptas para receber o auxílio emergencial, segundo novo levantamento do Dataprev. O instituto encaminhou à Caixa Econômica Federal a lista dos benefiários. Até o momento, mais de 66 milhões de brasileiros têm direito a receber o benefício. Neste último pacote, foram avalidas 1.842.434 solicitações, referentes ao período entre 23 de abril e 19 de julho. Atualmente, 903.719 pessoas estão com o cadastro inconclusivo nos sistemas do governo, mas ainda podem complementar as informações pelo aplicativo ou portal da Caixa. A Dataprev está em processamento outros 123.007 cadastros.

Segundo informações da Caixa, até o dia 28 deste mês haviam sido creditados R$ 136,3 bilhões a 65,3 milhões de pessoas. O professor de economia da Estácio Brasília, Ricardo Karam, assinala a importância do auxílio emergencial como estímulo à economia. “É uma forma de movimentar recurso e estimular recurso, aumentar demanda. E, obviamente quando aumenta a demanda, você estimula a oferta. Vai primeiro para a mão do consumidor, mas os empresários e as comerciantes se beneficiam”, explica.

O professor comenta, ainda, a natureza específica desse recurso. “A vantagem de colocar os recursos nas mãos dos mais carentes é que 100% dos recursos com certeza vão ser consumidos. Não serão guardados ou usados para especulação; serão usados para consumo. E consumo é igual a produção, produção é igual a emprego. Então, o que se tem é uma medida inteligente para reativar a economia”, avalia Karam. “O auxílio emergencial minimiza o empobrecimento da população em geral. Aquele que recebe o auxílio ajuda o comerciante do seu bairro a passar pela crise também. O benefício evita o colapso econômico, impedindo que o comércio de algumas regiões pare completamente”, concorda o Olyver Tavares, pesquisador social da Estácio Brasília

O Dataprev finalizou o processamento até agora 99,92% das solicitações. O total de pedidos desde que o programa começou foi de 150.489.558. De acordo com as informações divulgadas pelo Dataprev, o auxílio estaria alcançando de forma direta ou indireta mais de 126 milhões de pessoas, número que equivale a quase 60% da população brasileira.